22/08/2023
Brasil

Luta contra discriminação marca o 17 de maio, em Guarapuava

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Jonas Laskouski com HuffPost Brasil

Guarapuava – Na semana passada, em um comentário infeliz feito durante o 'Jogo dos Pontinhos' no programa Sílvio Santos, a filha do patrão, Patrícia Abravanel disse "ser contra falar que homossexualismo é normal". Sim, em pleno 2016, uma das herdeiras do SBT expressa em rede nacional uma série de preconceitos travestidos de opinião. Sim, em pleno 2016, não só ela, mas muita gente ainda encara como 'anormalidade', o fato de haver gays, lésbicas, bissexuais e transsexuais convivendo com os 'normais' heterossexuais. 

A fala da apresentadora é só uma deixa para chamarmos a atenção para este 17 de maio, quando é celebrado o Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia. Sim, ainda é preciso lutar. Lutar, esclarecer, promover a aceitação.

Em Guarapuava, é grande o número de homossexuais. Mas é grande também o preconceito, ainda que velado. Segundo Fabio Augusto da Silva, da Secretaria de Gênero, Relações Étnico-Raciais e Direitos LGBT da APP-Sindicato – única do gênero no município que trata questões relacionadas ao assunto – não existem números oficiais relativos a homofobia, "já que quando há agressões, o motivo nunca é citado. Geralmente, as vítimas desse tipo de agressão não denunciam a razão, por medo de sofrerem mais discriminação".

E é justamente a discriminação que está sendo discutida nesse 17 de maio em ações realizadas em dois colégios de Guarapuava. Na manhã de hoje, uma roda de conversas aconteceu no Colégio Visconde de Guarapuava, que a exemplo do seu coletivo feminista, está instituindo um coletivo LGBT, reunindo professores, funcionários e estudantes. Só para você entender, um coletivo é um grupo de pessoas que, por afinidade de ideias e ideais, se juntam para defender suas bandeiras e lutar por seus direitos, na concepção mais básica da definição. Só o fato de existir um grupo de pessoas discutindo e dando voz a essa minoria, já é uma grande vitória. Porque é justamente na escola, no meio estudantil, onde acontecem a maioria das agressões, sejam elas verbais ou físicas. Um dos coletivos LGBT mais atuantes em Guarapuava é o Bajubá, que no idioma africano iorubá significa 'resistência'.

Já no Colégio Francisco Carneiro Martins, também na tarde de hoje (17), estudantes participam de uma oficina com o tema "Superando o Preconceito e a Discriminação". O próprio tema já diz tudo e a iniciativa por parte do colégio mostra a necessidade de se trabalhar o assunto com os alunos (vamos trazer mais detalhes dessa ação).

A data 17 de maio lembra que, um dia, ser gay, lésbica, transsexual ou travesti já foi considerado doença. Em 1973, depois de séculos de opressão, a Organização Mundial da Saúde reconheceu que a homossexualidade não era um distúrbio mental. Mas para chegar até essa conquista, foi preciso muita manifestação e algumas páginas de obituários que nunca foram publicados nos jornais da época. 

Mesmo não sendo mais doença, a comunidade LGBT ainda é tratada como tal pela sociedade conservadora e preconceituosa. Somos a nação que mais mata pessoas trans no mundo, segundo a ONG Transgender Europe – foram 546 casos entre 2011 e 2015.

Neste mesmo Brasil manchado pelo sangue das trans, não temos uma contabilização oficial de mortes envolvendo LGBT. O Grupo Gay da Bahia levantou 1.560 casos de assassinatos nos últimos quatro anos, como revela o especial LGBTfobia, divulgado pelo HuffPost Brasil, em março.

DIREITOS AMEAÇADOS?

No dia 12 de maio, o presidente em exercício Michel Temer assinava os seus primeiros decretos no Diário Oficial da União. No artigo 1 da Medida Provisória número 726 está lá, bem na oitava medida: extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Nos últimos 19 anos, é a primeira vez que a pasta criada para dar visibilidade e garantir o direito de minorias é riscada da história do governo brasileiro.

"Estamos indo na contramão do mundo", diz Carlos Magno, presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABLGBT). Magno, que também representava a comunidade LGBT no Conselho de Direitos Humanos, reclama que no governo Dilma Rousseff as agendas de Direitos Humanos já estavam paralisadas – assim como demarcações de terras indígenas e criminalização da homofobia, por exemplo.

"Nós estamos retrocedendo em mais de 30 anos. Já não temos uma lei que ciminalize a homofobia, não temos serviços, muito menos política pública. É óbvio que essa população que já é vulnerável vai ficar exposta a mais violência, mais ódio e à negligência do governo".

Magno tem razão. E tem tanta razão que o próprio comentário de Patrícia Abravanel – que você leu no início dessa matéria – reflete isso. É preciso deixar claro para a sociedade que "anormal" é ter preconceito, que "anormal" é discriminar quem curte o mesmo sexo. Por que se incomodar tanto com a orientação do outro? A resposta é simples: porque afeta nossa própria certeza sobre nossas escolhas.

 

Cristina Esteche

Jornalista

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