22/08/2023
Cotidiano

Passeio pela Serra do Mar proporciona belos cenários aos turistas

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Morretes – O trilho do trem que circunda a casa onde moro lá no Vale do Jordão e que apita até oito vezes entre o dia e a madrugada não é o mesmo que nos levou até a cidadezinha de Morretes, no litoral paranaense. Uma viagem inesquecível, regada a muitas brincadeiras, risos contagiantes, olhares atentos e, principalmente, clicks das máquinas fotográficas. Era preciso registrar tudo.

Cada árvore florida, cada curva, cada aceno de moradores, cada gesto do trabalhador que faz a manutenção da ferrovia. As fotos não eram para ilustrar álbuns de fotografias, mas para registrar cada cena, cada cadeia de picos e montanhas, cada bromélia, qualquer ou todas as plantas nativas que compõem a beleza do complexo natural chamado Mata Atlântica. Cenas que devem estar estampadas em cada jornal onde trabalham os vários jornalistas que participaram do encontro promovido pelo Conselho Municipal de Turismo de Curitiba e outras parcerias no início da semana, 22 e 23.

O segundo dia do encontro, que começou na Arena da Baixada na segunda-feira, onde acontecerão jogos da Copa do Mundo de 2014, foi de emoção incontida por parte de quem tem o dever de deixar a razão falar, ou melhor, escrever. Mas como não deixar a emoção falar mais alto perante tanta beleza? Enquanto o trem da Serra Verde Express se “arrasta” entre linhas retas, curvas, descidas e subidas, a excitação aumenta. É um tal de “veja aqui”, “olhe ali” sucessivos. Orientados pelas informações antecipadas da guia turística o companheirismo dos profissionais fala mais alto do que a concorrência em busca da melhor foto.

O caminho que leva a Morretes é verde, branco, amarelo, vermelho, azul. São muitas cores e vários matizes. A mata, que esconde ao mesmo tempo expõe plantas que lutam contra a extinção da sua espécie, é sempre entrecortada por cachoeiras e quedas d´água, ora pequenas, ora gigantes. Além da beleza deslumbrante da paisagem da serra, a exploração turística e desportiva do Pico do Marumbi, das corredeiras do Rio Nhundiaquara, das trilhas e caminhos há rios e córregos, o Ipiranga com suas margens plácidas e que leva por suas águas o grito da liberdade.

O cheiro do lírio do brejo ou gengibre falso exala e perfuma o ambiente do início ao fim do caminho permeado de história. A construção da ferrovia começou oficialmente em fevereiro de 1880. Considerada impraticável por inúmeros engenheiros europeus à época, a obra teve início em três frentes simultâneas: entre Paranaguá e Morretes num trajeto de 42 quilômetros, entre Morretes e Roça Nova (com 38 km) e entre Roça Nova e Curitiba (30 km).

O objetivo era estreitar a relação entre as cidades do litoral e a capital do estado, visando o desenvolvimento social do litoral. Outro ponto considerado fundamental era ligar o Porto de Paranaguá aos estados do Sul do Brasil, para que se desse vazão à produção de grãos dos estados e, dessa forma, garantir apoio ao desenvolvimento econômico da região.

Para a obra, foram recrutados mais de 9 mil homens, que ganhavam entre dois e três mil réis por jornada. A maioria deles vivia em Curitiba ou no litoral, e era composta de imigrantes que trabalhavam na lavoura. Mais da metade desses homens faleceu durante a construção da ferrovia pelas condições precárias de segurança e por doenças. Dois nomes, porém, marcam a construção da ferrovia. Antônio Pereira Rebouças Filho (autor do traçado da ferrovia) e seu irmão André Pinto Rebouças, os Irmãos Rebouças, estiveram à frente do ousado projeto de engenharia construído no período do Brasil Colonial. Os Irmãos Rebouças eram negros. Depois de cinco anos, a ferrovia foi inaugurada no dia 2 de fevereiro de 1885.

Em seus 110 quilômetros de extensão, a ferrovia guarda centenas de obras de arte da engenharia: são 14 túneis (1 desativado), 30 pontes e inúmeros viadutos. Destacam-se a Ponte São João, com 55 metros de altura, e o Viaduto Carvalho, ligado ao Túnel do Rochedo, assentado sobre cinco pilares de alvenaria na encosta da rocha. Foi a primeira obra com essas características a ser construída no mundo.

Barreado e cachaça da boa
Coroada por cadeias de montanhas e às margens do Rio Nhundiaquara, lá está Morretes. Umas destas cidadezinhas coloniais que o progresso, ainda bem, esqueceu. Na chegada a recepção é feita por Fernando (Restaurante Lubam). Uma cachacinha artesanal feita com banana é a entrada e as boas-vindas. O apetite dos colegas de viagem, muitos deles “marinheiros de primeira viagem” nesse trajeto, só não é maior do que a curiosidade de saborear o “barreado”, prato típico do Paraná.

O nome do prato vem da expressão ´barrear´ a panela, com um pirão de farinha de mandioca ou de cinza, impedindo que o vapor escape e o cozido não seque depressa. A sua origem divide opiniões e autorias. Moradores de Paranaguá, Morretes e Antonina disputam a “paternidade” do prato, assim como também são várias as histórias que remontam à sua origem. Ficamos com a versão contada por Fernando, de que a preparação se deu com os tropeiros que faziam o caminho de Itupava pela mata atlântica para comercializar erva-mate com o litoral.

Os tropeiros faziam uma única refeição no período da tarde após o dia de marcha. Sua composição é à base de carne gorda para fornecer a energia necessária e também preservar o alimento. Para acompanhar, só farinha de mandioca escaldada pelo caldo grosso do barreado, formando suculento e nutritivo pirão. A banana, por ser uma fruta encontrada em profusão na serra, era o outro acompanhante. Para ajudar na digestão nada melhor do que mais uma dose da famosa cachaça de alambique.

O retorno da viagem teve uma breve passagem pela Igreja do Pilar em Antonina. Cansados da viagem e “embalados” pelo “barreado”, a comitiva retornou silenciosa, sonolenta, mas com a “alma lavada”.

Cristina Esteche – Rede Sul de Notícias
Foto: Orlando Silva

Cristina Esteche

Jornalista

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