22/08/2023


Segurança

Sentença de Carli Filho: uma história de dor e perdas

Sofrimento envolve três famílias. Cada uma com a sua dor

nando

Carlos Murilo, Gilmar Rafael e Carli Filho 

Muito mais do que uma briga judicial a ação envolvendo o ex-deputado Fernando Carli Filho envolveu um jogo de poder econômico e político entre duas famílias. De um lado, a Yared, que não poupou esforços para que o guarapuavano fosse levado às barras do Tribunal, se utilizando de todos os meios legais, inclusive a visibilidade na mídia nacional. De outro, a Carli que também usou e abusou, mas do princípio constitucional do direito à ampla defesa. Mesmo assim, Carli Filho foi sentenciado a cumprir nove anos e sete meses de prisão em regime fechado. A decisão foi do Conselho de Sentença composto por cinco mulheres e dois homens. De nada adiantou a tese da defesa que tentou mudar a culpabilidade para crime culposo. Caso isso acontecesse, o crime seria de trânsito e já estaria prescrito.

Apesar de ser condenado, o ex-deputado ainda não será preso. Isso só acontecerá quando todos os recursos forem esgotados. Os advogados que o defendem anunciaram que recorrerão em segunda instância. Enquanto isso, Carli Filho cumprirá a pena em liberdade, mas estará condicionado a comparecer mensalmente ao juízo de Guarapuava para justificar as suas atividades. Durante a saída do ex-deputado pela porta lateral do tribunal do Júri ele foi hostilizado por manifestantes.

Carro das vítimas (Foto: Reprodução)

Nove anos se passaram desde a fatídica madrugada que interrompeu, não apenas uma carreira política promissora, mas, principalmente, a vida de dois jovens. Gilmar Rafael Yared, então com  26 anos, e Carlos Murilo de Almeida, 20, saíram para fazer e lanche e depois, seguir, cada um para a sua casa. Carli Filho, que tinha 26 anos, jantava com familiares no Edvino Wine Bar, no bairro do Batel, em Curitiba. Lá ele encontrou um casal de amigos com que admitiu continuar comendo e bebendo, num consumo que custou R$ 700 entre comida e quatro garrafas de vinho. Já era perto da meia noite quando o ex-deputado decidiu ir para casa, mas ele estava altamente embriagado. Apesar das tentativas para impedir que saísse dirigindo, Carli Filho as desconsiderou, saiu percorrendo um trajeto e pegando alta velocidade até encontrar o veículo que conduzia aqueles que perderiam a vida num trágico acidente. As imagens mostradas à época e revisadas no Tribunal do Júri ainda chocam qualquer pessoa dotada de emoção forte. Os dois jovens que morreram tiveram os corpos dilacerados. Carli Filho foi levado para atendimento no Hospital Evangélico em Curitiba e depois transferido de jatinho para o Hospital Albert Einstein,  em São Paulo, ainda em estado de coma.

Mesmo em liberdade, mas condenado pela sociedade, Carli Filho retornou a Guarapuava, sua cidade natal. Durante todos esse anos, ele conviveu com o pré julgamento de pessoas, muito das quais, hostis, quando o encontravam em lugares públicos, apesar da vida quase reclusa que passou a ter.

Carli Filho antes do acidente (Foto: Reprodução)

Uma das declarações de Carli Filho no depoimento durante o júri na terça feira (27), ele disse que lembra do acidente todos os dias. Impossível se olhar no espelho diariamente, olhar para as cicatrizes profundas que marcam o seu rosto, e não lembrar da causa que mudou totalmente a sua aparência.

O ex-deputado, entretanto, aos poucos foi tentando retomar a sua vida. Apesar de tudo o que aconteceu, e se repete diariamente pelo Brasil afora, inclusive em Guarapuava, esse é um direito que lhe cabe. Assumiu a Rádio 92 FM, de propriedade da sua família; casou e nos últimos meses se dedicou à conversão da então Cacique AM em Rádio Massa FM.

Este foi um dos julgamentos mais aguardados da história paranaense e com reflexo nacional. Carli Filho foi o primeiro político a ir à júri popular, principalmente, num fato envolvendo acidente de trânsito.

Desde o dia da tragédia, a mãe de Gilmar Rafael Yared,  Christiane, se tornou uma ativista contra a violência no trânsito. Ela criou o Instituto Paz no Trânsito que presta assistência a familiares perderam parentes em acidentes automobilísticos que tiveram como causa a embriaguez e a alta velocidade. Também foi eleita deputada federal, sendo a mais votada entre os candidatos paranaenses.

Christiane Yared (Foto: Reprodução)

Apesar do júri ter acabado e a sentença estar definida esse caso ainda não acabou. Se de um lado a defesa tentará reverter a sentença; de outro, a acusação anunciou que se reunirá para avaliar se entrará com recurso pedindo a ampliação da sentença.

Continuando como coadjuvante nessa história trágica, apesar de ter perdido o seu filho no mesmo acidente, Vera de Almeida se resigna. Para ela, a justiça foi feita, mesmo que não traga o seu filho de volta.

Vera de Almeida (Foto: Reprodução)

No outro lado da história o sofrimento também marca a Família Carli. Nessa triste história as três família protagonizam um enredo de dor e perdas.

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.

Pular para o conteúdo