22/08/2023
Agronegócio

Entrevista: engenheiro Paulo Ferraz comenta sistema ferroviário estadual

imagem-15726

Guarapuava – Um possível “apagão logístico” no Estado tem assombrado produtores e gerado debates sobre qual a maneira mais eficaz de evitar problemas no escoamento dos produtos paranaenses. Para analisar o tema, a Rede Sul entrevistou o engenheiro Paulo Sidnei Ferraz (foto) especialista em transportes e aposentado da Rede Ferroviária Federal S/A (RFSSA), onde atuou por 26 anos – atualmente ele é diretor do Sindicato dos Engenheiros do Paraná. Ferraz analisou as perspectivas para a construção de novas ferrovias e melhora das atuais – as estradas de ferro são tratadas como uma das possibilidades para aliviar o “gargalo logístico” no Paraná, tornando mais eficiente o escoamento da produção estadual.

Rede Sul: Muito tem se debatido sobre um possível “apagão logístico” no Paraná. Como a construção de novas ferrovias pode evitar isso?

Paulo Ferraz: Um estudo de Consultoria canadense contratada pelo Codesul em 1999 conclui que apenas 18 % das principais cargas do Paraná transitavam por ferrovias. Que para a região continuar seu desenvolvimento deveria ter em 2019 – 20 anos depois – o volume de cargas trafegando sobre trilho num percentual de 48 %. Nas estamos na contramão do estudo técnico. A participação ferroviária na movimentação do Porto de Paranaguá nos últimos 13 anos caiu. Então engatamos uma ré nos trens em nosso estado. Precisamos não só de novas linhas, mas também recuperar a capacidade do sistema ferroviário degradado pós-desestatização.

RS: Quais são os trechos prioritários?

PF: Para as linhas novas o ramal Guarapuava/Paranaguá encurtando distancia das cargas do oeste e as expansões para o Matogrosso, Santa Catarina e Paraguai que mudarão a logistica nessas regiões baixando o custo dos transportes, retirando caminhões pesados das estradas, reduzindo impacto ambiental e tornando mais competitivos os produtos.

RS: Para evitar esse “apagão logístico”, qual deve ser a prioridade do ponto de vista estrutural?
PF: A curto prazo exigir da Concessionária ALL America latina Logística a recuperação da velocidade dos trens através de intervenções técnicas e a substituição da frota atual e ampliação do parque de locomotivas cujas maquinas tem mais de 3 décadas de trabalho.

RS: Como o senhor avalia a situação atual das ferrovias paranaenses?

PF: Estamos caminhando para o juízo final e ainda temos pela frente a metade do prazo do contrato de Concessão. Mesmo com o maciço aporte financeiro do BNDES não houve investimentos em obras de engenharia ou aquisição de locomotivas novas que pudesse dar um salto na capacidade do sistema ferroviário de cargas. Apenas houve uma otimização de ativos recebidos da RFFSA, seleção dos clientes pela curva ABC e fechamento de 600 km de linhas entre cidades do Paraná.

RS: Quais são os maiores problemas?

PF: Em 1997 quando a ALL iniciou sua gestão da ferrovia na Malha Sul as linhas no Paraná tinham recebidos pesados investimentos da ordem de 240 milhões do Banco Mundial em Oficinas foram modernizadas, ampliados pátios de cruzamento de comboios, automatizados controles, implantado moderno Centro de Controle Operacional, instaladas fibras óticas e sistema terra trem. Tínhamos uma operadora ferroviária com desempenho de primeiro mundo. O crescimento real dos volumes transportados a cada ano era destacado. Só faltava a aquisição de novas locomotivas. Hoje é só olhar para o patrimônio da ferrovia para qualquer leigo tirar suas conclusões

RS: Em que sentido a criação da Ferrosul pode ajudar na solução desses problemas?
PF: Primeiro é uma alternativa a um modelo de privatização que não deu certo. O próprio Governo Federal tem anunciado esse reconhecimento. Uma empresa S.A. com controles públicos para competir com as operadoras privadas. Esse é o desafio! Como acontece em grande parte do mundo. Quanto a ampliação de ramais projetados essas novas linhas preencherão os vazios de regiões que dependem exclusivamente de transporte rodoviário. Facilitará a integração das regiões, reduzirá custos, criará novos mercados e ainda possibilitará o desenvolvimento de transporte de passageiros.

RS: O trecho entre Guarapuava e Paranaguá tem gerado discussão sobre qual a alternativa mais viável – se a proposta do Governo do Estado, Crea, Sindicato dos Engenheiros ou a da ALL. O que o senhor pensa sobre o assunto?
PF: A alternativa da Variante Guarapuava/Ipiranga não atende as necessidades atuais, não reduziria o frete ferroviário, causaria maiores impactos ambientais, teria um custo/km de obra mais caro além de criar novos gargalos. A opção do Corredor Oeste gerado pelo Banco de Idéias do IEP- Instituto de Engenharia do Paraná e adotado pela Ferroeste é a melhor solução técnica/econômica/operacional/ambiental e social. Diminuirá a distancia de transito reduzindo o tempo de viagem das cargas e o custo de transporte com o conseqüente ganho para os produtores.

RS: A situação das ferrovias no Paraná, de maneira geral, difere das do resto do Brasil?
PF: De uma maneira geral sim, excetuando as ferrovias da Vale do Rio Doce, cujo dono tem interesse em investir pois precisam escoar com eficiência os produtos das suas empresas, no caso minério de ferro, principalmente. Aqui na malha sul lamentavelmente caímos nas mãos de banqueiros que só pensam em aumentar lucros num curto prazo. Os usuários ficam a mercê da operadora que atende quem lhe dá a maior margem de lucro esquecendo tratar-se de uma concessão pública.

Foto: divulgação

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.