Não adianta dizer que não. Falou em preso, em prisão ou em penitenciária, a primeira imagem que vem à cabeça é uma cela com grade. Dependendo da referência, ela pode ser escura, quente, ter mau cheiro, e ainda estar superlotada. Na verdade, um depósito de gente. É o que ouvimos dos próprios presos que já passaram por outras carceragens antes de chegar a PEG UP.
Desde 28 de março de 2019 na PEG UP, um preso nos contou que passou pela cadeia de União da Vitória onde permaneceu um ano e quatro meses, antes de ser transferido.
“Lá na cadeia era muita gente. Ambiente superlotado. Chegamos a ficar em 38 presos numa cela, construída para 16 pessoas. E só tinha 16 camas. É muito diferente daqui”, como conta um preso no vídeo abaixo.
OUTRA EXPERIÊNCIA
Da mesma forma que este preso, um outro traz histórias ainda piores sobre as condições enfrentadas no dia a dia nas carceragens. Ele já passou pelo antigo semiaberto, pela cadeia pública de Guarapuava, pela PIG e agora está na PEG UP.
“Na cadeia pública não tem benefício. Sem remissão. A cadeia é superlotada É sujo demais e desorganizado. E o atendimento médico é raríssimo”, conta o preso.
Além disso, ele afirma que todos ficam amontoados. “Tem gente dormindo nas galerias, no chão. É um barril de pólvora. A qualquer momento pode estourar. Eles [presos] não tomam [rendem os agentes] porque não querem. Porque é tudo aberto. Vi vários morrer la dentro”.
Mas não é dessa realidade que vamos falar, apesar de ser quase impossível não relembrar que este é o cotidiano de centenas de presos na cadeia pública de Guarapuava.
Na PEG UP, é diferente. E digo isso porque entrei e conheci um dos 10 alojamentos da unidade. Os alojamentos têm 22 camas cada um, com TV, chuveiro elétrico, acesso à leitura, jogos, rádio e lousa.
ALOJAMENTOS
Durante o dia em que permaneci na PEG UP, pude conhecer o alojamento 9. Aliás os alojamentos ficam fechados durante o período em que os internos estão trabalhando ou estudando.
Dois dos 10 alojamentos porém, estão em reforma e vão ter uma mesa de apoio e bancos para alimentação e estudo dentro do alojamento.
Ao entrar, a gente para e olha para todos os lados. As camas do tipo beliche formam dois paredões nas duas laterais da sala. Na parte central também existem camas. No alto janelas, com grades. Mas nada que possa aparentar uma cela, ou ainda, que possa remeter ao ditado “ver o sol nascer quadrado”.
Aliás, para quem já viajou e se hospedou em hostel compartilhado, sabe do que eu estou falando. Guardadas as devidas proporções estéticas, o alojamento me lembrou um quarto compartilhado de hostel.
Já conheci com 10 camas. Esse tinha 22. Também tinha pias para higiene pessoal, banheiros com sanitários e três boxes com chuveiros. Um deles, elétrico.
TELHAS
Não fiquei mais que cinco minutos no alojamento, mas pude sentir um mundo de percepções. Pra começar, apesar do calor na parte externa, lá dentro a temperatura estava amena.
De acordo com a direção da PEG, a troca das telhas de amianto por telhas de zinco com camada de isopor é que proporcionaram esse conforto térmico. A substituição da telha está sendo feita em outros prédios da penitenciária.
Além disso, o que me chamou a atenção foi a grande quantidade de livros em uma espécie de escaninho, e também sobre as camas. Mesmo sendo do conteúdo de matemática, a capa deste livro fazia um convite a reflexão. “Caminhar e transformar”.
As camas estavam arrumadas, o que demonstra disciplina e organização por parte dos presos. As paredes estavam limpas, sem riscos ou desenhos.
A bíblia sobre um travesseiro parece repousar. Intencionalmente ou não, deixada aberta naquele local, o livro da vida parecia vigiar e curar a consciência que ali repousa. Afinal, como diz o ditado popular, “como é bom deitar e dormir de consciência tranquila”.
O leito de repouso de quem um dia esteve aqui fora e momentaneamente está impedido do convívio em sociedade, nem por isso deve ser indigno.
Quantas tristezas, quantas lágrimas, quanto arrependimento, quantas saudades essas paredes já testemunharam. Elas não falam. E nem precisam. É possível sentir os mais variados sentimentos humanos ao entrar no alojamento.
DENTRO DO ALOJAMENTO
Abaixo, você assiste com exclusividade para o Portal RSN, como é um alojamento da penitenciária estadual de Guarapuava.
“Aqui dentro do nosso alojamento todos tem uma cama, ninguém dorme no chão”, afirmou um preso. Conforme um agente penitenciário, “se você não consegue viver aqui dentro do alojamento como se vive em sociedade, você tá fora”.
Próximo aos alojamentos, A PEG UP possui uma pequena horta. O espaço é cuidado por um interno que está prestes a sair da unidade. Certamente, outro preso ficará com a responsabilidade de cuidar dos canteiros, que devem ser ampliados futuramente, conforme a direção do penitenciária.
LAVANDERIA
Você deve estar se perguntando. E a roupa dos presos, quem lava? E a resposta é: eles mesmos. A PEG UP possui uma lavanderia também bem próxima ao alojamento. E nela [lavanderia] dois internos cuidam de duas lavadoras e duas secadoras. E como organizar a roupa de cada um? Afinal são 136 internos. Lembra da fronha numerada que é usada no agendamento de pedidos para o almoxarifado?
Então, aqui ela aparece de novo. As roupas chegam dentro das fronhas que levam o número de identificação de cada preso. Os trabalhos são organizados conforme um cronograma. E existem normas para isso, como podemos observar na foto abaixo.
“Desde a medida de sabão e o tempo de lavagem até a quantidade de peças de roupas em cada máquina. Por exemplo: cada máquina suporta lavar 140 camisetas por lavagem. Ou 140 bermudas”, afirma um interno que trabalha na lavanderia.
CRONOGRAMA DE LAVAGEM
Mas antes de chegarem aqui, as peças de roupas precisam ser organizadas também. Assim, os presos que querer ter a roupa lavada devem colocar as peças fora do alojamento no início da manhã. Isso para que a roupa lavada seja devolvida no mesmo dia.
Dentro dos alojamentos é proibido lavar roupas, exceto roupa íntima como cuecas e meias. Mas até para colocar a roupa do lado de fora do alojamento, tem dia certo. Como a lavanderia funciona de segunda a sábado, é preciso ficar atento.
Nas segundas, por exemplo, são lavadas roupas do alojamento da visita íntima e do alojamento 4. Na sexta, alojamentos 6 e 7.
Por falar em roupas do alojamento de visita íntima, a penitenciária tem quatro quartos para que internos casados possam receber suas esposas no dia de visita. O acesso não é permitido para internos com namoradas, por exemplo.
E precisa ter no mínimo um registro de União Estável. Quem cuida da higiene no local e da conservação da pintura das paredes são os próprios presos.
BODY SCAN
Uma novidade na unidade foi a instalação do equipamento de body scan, ocorrida há cerca de quatro meses. O equipamento auxilia na vistoria e fiscalização das visitas. Até então as vistorias feitas em visitantes, principalmente mulheres, eram vexatórias.
As mulheres precisam tirar a roupa e se submeter a agachamentos para busca de drogas, celulares e outros ilícitos, escondidos nas partes íntimas.
“A partir da instalação do equipamento, ficou mais rápido e seguro o processo de vistoria. Sem contar que ainda dispensa a vistoria que causava constrangimento em quem nada tinha de errado”, afirma o chefe de segurança da PEG UP.
De acordo com o advogado criminalista e professor de direito penal, Loêdi Lisovski, ressocializar também implica no fornecimento de espaços físicos condizentes com a dignidade humana.
Desta forma, o único direito que o apenado perde é o de liberdade. Os demais [direitos] devem ser mantidos, como ele explica no vídeo abaixo.
Na 10ª reportagem da série “Liberdade Vigiada”, você vai conhecer o setor de Assistência social – a primeira família do preso dentro da unidade.
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