Após a grande repercussão da reportagem sobre a denúncia de que uma transexual explorava prostitutas que também são trans e vêm de fora de Guarapuava, o Portal RSN volta ao assunto. Assim, a dona de um pensionato usado por transexuais e travestis, entrou em contato com a redação, embora em nenhum momento a reportagem em questão citou o nome da proprietária.
De acordo com Lana, nome social utilizado, ela possui um pensionato no bairro Batel em Guarapuava. E, aluga quartos para transexuais de outras cidades. Conforme Lana, ela já recebeu pessoas de todas as partes do país. “Uma vêm e fica no pensionato, ela vai embora e recomenda para outra. Assim, já conheci pessoas de todo o Brasil. Uma vai indicando para outra e eu as recebo”. Atualmente, quatro trans estão hospedadas no pensionato.
As meninas que chegam de fora da cidade pagam para ficar no pensionato, eu cobro um valor menor que hotéis e recebo conforme elas vão conseguindo me pagar. Têm dias que o trabalho na rua dá dinheiro. Têm outros que elas não ganham nada. Eu cobro porque faço comida para elas, as meninas usam minha chapinha, luz, água, é um monte de coisa. Então preciso cobrar o valor do pensionato para poder sobreviver.
Desde a adolescência Lana decidiu assumir a identidade como transexual. Ela comenta que passou por situações de preconceito e decidiu sair para trabalhar, morando em várias cidades. Com isso, conheceu muitas travestis e trans. O único pensionato que recebe trans em Guarapuava está sob responsabilidade dela.
Segundo a proprietária, as meninas que chegam são bem tratadas. “Elas preferem ficar na minha casa e não em outros lugares, porque na minha casa não tem preconceito, elas são bem recebidas”. Ao ser entrevistada pelo RSN, Lana estava acompanhada de uma trans que fica hospedada no pensionato. Essa, já está em Guarapuava pela quinta vez.
“Eu nunca fui explorada pela Lana, nem voltaria para cá se fosse explorada. Prostituição dá dinheiro e todo mundo sabe disso. Quem comete delitos pela cidade faz porque quer. A Lana é como uma mãe para mim”.
Minha casa sempre foi cheia de trans e elas mesmas me pediram para começar a cobrar. Eu vivia em um relacionamento abusivo, apanhava do meu ex-marido e não podia ter o que queria. Essa foi uma forma de ter o meu próprio dinheiro. Assim, virei dona de pensionato.
SOBRE A DENÚNCIA
De acordo com a denúncia recebida pelo Portal RSN feita por uma travesti, em Guarapuava a exploração domina o ramo. Porém, essa condição leva à prática de crimes como roubo, extorsão, entre outros delitos. “Não aceito isso que está acontecendo na minha cidade. As travestis que vêm de fora ‘queimam’ a cara de quem é do bem, que não fazem nada de errado”. Ela se refere às ocorrências policiais envolvendo travestis.
Conforme Lana, muitas vezes algumas trans e travestis que migraram para Guarapuava acabaram cometendo delitos pela cidade. No entanto, ela afirma que a polícia vai e localiza as autoras. Assim, ela comenta que sempre que ocorre tal fato, ela solicita imediatamente a desocupação do imóvel. Lana criou o pensionato, mas não se responsabiliza pelos fatos que ocorrem nas ruas e avenidas, já que não é a responsável pelas autoras dos delitos.
“É mentira falar que eu estou explorando as trans. Falar que elas roubam porque tem um débito comigo. Muitas delas já foram embora da cidade me devendo. Elas passam noites no pensionato, o que fazem fora dele não sou eu que mando ou tenho envolvimento”.
A pessoa que fez a denúncia e falou que a Lana extorque ela precisa entender o seguinte: se você ficar três, quatro dias na casa sem pagar porque não recebeu dinheiro na rua, quando você receber vai ter que pagar à vista. Isso não é extorquir, é pagar o lugar onde você está ficando.
Sobre as meninas que roubaram na rua, a trans diz que prefere não falar nada negativo delas. “Na minha casa elas eram gente boa, eram simpáticas e boas pessoas. Eu não vou falar delas porque roubaram na rua, porque dentro do pensionato elas eram muito boas comigo. O problema das meninas que cometeram delito é da polícia e não meu”. Segundo a polícia, há o conhecimento da existência do pensionato. Porém, não há nenhuma denúncia registrada.
A autora da denúncia, cujo nome está sendo preservado, disse que o ‘fio da meada’ está na exploração de uma trans que domina os ‘pontos’ na avenida Manoel Ribas. Lana diz que apesar da denúncia não citar nomes, ela sabe que se refere a ela, já que é a única com pensionato na cidade. De acordo com a pessoa que denunciou, ela não trabalha na avenida Manoel Ribas porque a Lana não permite.
“Nós de Guarapuava não trabalhamos na Manoel Ribas porque não pagamos pra ela. Quem é daqui e trabalha lá, precisa pagar. Não é justo que nós que somos daqui tenhamos que pagar por erro das travestis de fora que aprontam na cidade. Eu não sou marginal. Trabalho, pago impostos. Sou correta e sou uma cidadã de bem”.
Entretanto, Lana afirma que as transexuais de fora trabalham na Manoel Ribas sim. Mas que isso teria sido discutido e feito um acordo com as trans da cidade. O motivo são as brigas que ocorrem entre elas. De acordo com a proprietária do pensionato, já brigaram por uma ter mais clientes que a outra, estar mais arrumada, entre outros motivos.
Por mim todas trabalhavam juntas, seria bem mais legal. Mas sempre há um atrito entre elas. Acaba rolando algumas situações desagradáveis e desentendimentos porque uma saiu mais vezes para trabalhar que a outra. Como acabava dando muita briga entre as meninas da cidade, eu fui lá e conversei. Foi tudo uma conversa, diferente da denúncia que fizeram. Eu conversei com as meninas e falei para que elas ficassem em uma parte da cidade e as meninas que ficam na minha casa, em outra.
BRASIL É O PAÍS QUE MAIS MATA
Além do problema de invisibilidade, de exploração dentro da própria classe, as travestis e transexuais enfrentam a transfobia que leva ao extremo. Isso está evidente em dados divulgados pela Agência Brasil, em janeiro deste ano. Assim, os índices revelam uma triste realidade. O Brasil continua no posto de país que mais mata travestis e transexuais no mundo.
Dados levantados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) revelam ainda um agravante: o número de vítimas da violência transfóbica no ano passado foi o maior no país nos últimos 10 anos. Ou seja, em 2019, pelo menos 124 pessoas transgênero, entre homens e mulheres foram assassinadas no Brasil, em contextos de transfobia.
De acordo com o relatório da Antra, em apenas 11 dos casos, os suspeitos de terem cometido os crimes foram identificados. Os dados mostram ainda que, a cada dia em 2019, 11 pessoas transgênero sofreram agressões.
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