Um dos pontos fortes do julgamento de Luis Felipe Manvailer neste sábado (8) trata-se da afirmação do professor Luiz Airton Saavedra de Paiva. De acordo com o médico-legista, a esganadura não causou a morte de Tatiane Spitzner. Conforme o professor, a advogada morreu com o impacto da queda. Ou seja, caiu viva.
A participação do professor começou por volta das 17h desse sábado (8). Médico legista ele é contratado pela defesa de Luis Felipe Manvailer, réu preso e acusado de matar a esposa Tatiane Spitzner, em 22 de julho de 2018.
De acordo com o médico legista, ele atuou 38 anos no Instituto Médico Legal em São Paulo. Entretanto, depois que se aposentou, trabalhou como assistente técnico em vários estados brasileiros. Conforme o cálculo do professor ele já fez mais de 10 mil autópsias.
Entretanto, a participação de Saavedra se ateve a analisar a atuação do Instituto Médico Legal (IML). Desse modo, imagens de vídeos, fotos e trechos de depoimentos expostos pela defesa mereceram a avaliação do médico legista.
Em muitas dessas imagens, ele diz que há sinais vitais. Ou seja, hematomas e outras lesões ocorreram quando Tatiane ainda estava viva. Afirmações como essas incluem lesões que até então vinham sendo consideradas como se estivessem ocorrido após Tatiane ter morrido. Assim sendo, pela análise do especialista, Tatiane caiu quando estava viva e morreu com o impacto da queda no chão.
ESGANADURA
Assim, outro detalhe contradito pelo médico e professor, se refere à esganadura, como aponta um segundo laudo de necropsia. De acordo com Saavedra, o osso hioide, que estaria quebrado como afirma o assistente de necropsia Obadias Souza, não é específico de esganadura. Conforme o médico legista, a fratura pode ocorrer em outras situações, a exemplo de queda. Diz também se trata de um osso frágil. Por isso, essa ‘operação’ deve ser feita exclusivamente por médico legista.
Conforme Saavedra, outro ponto falho na segunda necropsia feita no corpo de Tatiane, é que a dissecagem do pescoço foi a primeira ação e feita por Obadias. De acordo com o especialista, esse deve ser o último procedimento. Entre tantas outras informações, ele analisa o preenchimento do formulário da necropsia. De acordo com o profissional, trata-se de um documento do Ministério de Saúde deve revelar de forma “muita precisa” a causa e a forma como ocorreu a morte da pessoa.
DESVIOS
Portanto, segundo o especialista, o laudo de exame de necropsia incorre em alguns desvios no formalismo. Conforme Saavedra, o primeiro passo no protocolo do exame é sempre fazer uma descrição da perícia externa. Se faz necessário descrever tudo o que é significativo (cicatriz, tatuagem, etc). Esse processo, segundo o especialista dever começar pelo no sentido crânio caudal. Entretanto, a defesa mostra imagem da vítima com um rosa vermelha tatuada acima do pulso. Porém, nada consta no relatório sobre essa tatuagem.
Assim sendo, em seguida se descreve o exame interno, ou seja, todo material coletado. E por último a discussão, ou seja, um raciocínio lógico, com embasamento científico. “Não cabe achismo”. E por último, a conclusão mostrando o agente que produziu, o trajeto da bala no caso de assassinato, e outros aspectos que subsidiam o laudo. Todavia, segundo o especialista, no relato do IML não diz nada desses elementos. Os exames complementares, segundo Saavedra, vêm ao final da discussão. “De modo que esse laudo apresenta imperfeições de construção”.
IMPERFEIÇÕES
De acordo com o especialista, outras “imperfeições” se apresentam desde a primeira chegada do corpo de Tatiane no IML. Passa também pela liberação do corpo para funeral e o posterior resgate da funerária para nova necropsia. Conforme o médico legista, a tanatopraxia é um procedimento invasivo no cadáver. Para o profissional, a credibilidade da perícia fica comprometida . E tem mais, nesse caso especial a tanatopraxia, nesse caso em especial, não foi descrita. Segundo Saavedra, não diz a que tipo de procedimento o corpo foi submetido. “Um fato inusitado é que médicos, que não tinham formação em medicina legal e forense, fizeram esse procedimento”.
Ele diz também que lhe “causa estranheza” o fato de Obadias ter sido intimado a depor sobre a necropsia. “Não entendi porque um laudo que tem as assinaturas de dois médicos e foi ele [Obadias] a prestar esclarecimentos à justiça. “Não sei porque temos esta aberração”.
ALGUMAS DAS ANÁLISES
A partir de imagens mostradas pela defesa, tanto em fotos quanto em vídeos, o médico legista Luiz Airton Saavedra de Paiva diz:
Foto 1 – Lesão da perna após a queda de Tatiane. Acusação diz que não tem sinal vital. “Demonstram inquestionavelmente reação vital. Mostro claramente no meu relato os tecidos que têm e os que não têm sinais vitais”. Conforme o professor sinais vitais são lesões produzidas numa pessoa viva.
Foto 2 – Mostra lesões que, segundo o especialista, são sinais de que a pessoa estava viva no momento que sofreu as lesões mostradas.
Foto 3 – Hematomas – incisão no couro cabeludo de Tatiane. Ele compara com imagem de pessoa morta numa foto do acervo particular. A diferença entre uma e outra é que a foto do acervo não possui hematomas. Isso porque, segundo professor, o sangue não estava mais circulando. Já a foto de Tatiane apresenta hematomas. Isso significa que, segundo o médico, foram produzidas quando o coração ainda estava batendo. “Inquestionável que tem reação vital”.
Foto 4 – Nova comparação com imagens do laudo de necropsia e outra do acervo de Saavedra. Conforme a explicação do especialista, as meninges (membrana no crânio) que sofreram a fratura quando já tinha morrido, estão limpas, “branquinhas”. Enquanto as de Tatiane têm sangue. “Mostra reação vital”.
Foto 5 – Perna esquerda de Tatiane já caída: lesões têm reação vital como mostra a perna avermelhada e registro do desenho do piso na pele. “Isso é um sinal de lesão com assinatura que só acontece quando a pessoa está viva. Se houvesse a queda de um corpo morto não haveria sinal, pois está sem circulação do sangue”.
Foto 6 – Mostra o braço esquerdo com lesões. O especialista confirma, mais uma vez, que essa parte do corpo tem infiltração de sangue que só ocorre se o coração estiver funcionando e com a circulação de sangue nos vasos. O médico observa que o lado esquerdo do corpo de Tatiane apresenta lesões. Já o lado direito sem lesões. Conforme o especialista, o choque mais importante da queda se deu pela lateral esquerda.
Foto 7 – Mostra a frente do prédio onde Tatiane caiu. Imagem de vídeo, em seguida, mostra que ela cai e o corpo rebate para cima.
Foto 8 – Mostra lesões na mão esquerda de Tatiane, as quais, segundo o médico, mostram reações vitais.
OSSO HIOIDE
Foto 9 – Uma imagem fotográfica mostra o osso hioide retirado de Tatiane. Em outra imagem, uma reprodução do acervo do médico. Apontando para a foto de Tatiane, o especialista diz que a fratura na localização marcada por Obadias não é típica de ter sido produzida por esganadura.
De acordo com o médico legista, uma série de acidentes de carro, de avião, movimento brusco de extensão do pescoço, quedas de altura, “principalmente”, podem fraturar o osso hioide.
Ainda analisando as imagens, o médico legista, afirma que quando se faz “pesquisa em osso hioide, que é muito fraco, “quase cartilagem”, é preciso muita cautela, porque pode quebrar. Para o especialista, o que ocorreu no IML de Guarapuava, conforme imagem mostrada, é “surreal”.
Conforme Saavedra, “infelizmente” no laudo da necropsia diz que o exame foi feito no osso hioide. Entretanto, não aparece a lâmina desse exame. “Só relatam as alterações que encontraram na revisão da necropsia. Não há referência do hioide. Não aparece nem citação do osso hioide. Mas essa essa fratura não é típica de esganadura”.
CORPO CAINDO
Conforme a avaliação da imagem em vídeo que mostra Tatiane caindo, segundo Saavedra, o corpo apresente tônus muscular.
PARTIPAÇÃO DA ACUSAÇÃO
A primeira intervenção da acusação ocorreu com o promotor Pedro Papaiz. A partir de mostragem de fotos e de imagens de documentos.
Foto 1– Mostra foto de Tatiane com estigmas ungueais e pergunta ao professor do que se trata. “Trata-se de uma pressão de mãos ou esganadura. Entretanto, segundo o professor, esganadura é qualquer pressão no pescoço e nem sempre levam à morte”.
Foto 2 – Foto que expõe o pescoço aberto de Tatiane e o promotor pergunta o que as lesões representam. O professor disse que são sinais de reação vital, ou seja, praticadas quando ela estava viva. Ele diz também que são compatíveis com a foto mostrada anteriormente.
Foto 3 – O promotor mostra lesões no pescoço e em seguida expõem outra foto, desta vez da nuca de Tatiane. MP pergunta quais lesões o legista identifica na foto. “São escoriações lineares na região escapular”. O promotor faz outra pergunta: Se há estigma na nuca. O professor diz que “com certeza não”.
Foto 4 – Foto de pulmão e o promotor comenta: “embaixo da pleura vemos equimose. “São muitas extensas relacionadas com o trauma torácico da queda. MP segue: pode ser sinal de asfixia? “Hematoma não”.
Foto 5 – Mostra um dos pulmões de Tatiane e o promotor comenta que há petéquias [manchas avermelhadas] no pulmão. Em seguida questiona se são sintomas de asfixia? “Elas sempre acompanham asfixia, mas num caso de trauma também tem petéquias”.
Foto 6 – “O senhor mencionou que estudou patologia por que não é sua especialidade?”. O professor responde que quando quis fazer medicina fui estudar patologia. Defesa interveio e informa que o professor é doutor em patologia forense pela USP.
O que significa congestação do epicárdio? “É uma dilatação. Pode ser associada à asfixia? No epicárdio não é tão frequente. Embora não seja específico, é um sinal”.
Foto 7 -O senhor observou nos autos alguma decisão judicial anulando os laudos do IML? “Não”. (pergunta feita por Brezezinski, advogado de acusação)
Foto 8 – Gustavo Scandelari pergunta: “O senhor disse que se a vítima tiver maior capacidade respiratória demora mais pra morrer. Pergunta o inverso, ou seja, se tiver menor capacidade respiratória tem menos tempo para morrer?”. A testemunha responde: “Sim”.
Foto 9 – Parte do texto de avaliação do parecer de Miguel Zacarias Sobrinho, médico legista (entregue aos jurados). Em seguida Scandelari questiona. “O senhor lembra quem foi a autora do laudo anatomopatológico e ele sabe a autoria do laudo anatomopatológico. Ele diz que não. Scandelari diz que se trata de Mara Rejane.
Além disso, Saavedra diz que não conhece. Todavia, confirma que a médica possui a qualificação necessária para isso. Diz também que leu o exame, e que concorda com quase tudo, só não concorda com o fato de ela não ter incluído a lâmina do osso hioide. “Não a conheço. Mas concordo em parte com o parecer. Entretanto, não concordo quando ela apresenta o laudo patológico do hioide sem apresentar a lâmina do exame.
Foto 10 – Scandelari questiona mais uma vez: Sabe se os defensores do acusado foram até o IML em busca da contraprova? “Não. Não tive tempo”. E o advogado continua: O senhor sabe se a defesa requereu a oitiva dos médicos legistas? “Não sei”. E o senhor chegou a ter contato com o acusado? “Só o vi passar na corredor no primeiro júri”.
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