Todos os dias a Priscila Ribeiro de 30 anos saía de casa com uma bolsa de salgados debaixo do braço. Já as mãos tinham que ficar livres para segurar a mão dos filhos de oito e 10 anos. E assim, com a esperança de garantir o sustento da família, ela batia de porta em porta na Colônia Vitória no Distrito de Entre Rios em Guarapuava.
Para alguns uma história de dificuldades, mas para ela, de conquistas. Mãe de seis filhos e com o marido acamado, ela conseguiu se levantar e se tornar empresária. A necessidade de pôr comida na mesa foi o que levou Priscila a empreender.
Meu marido sofreu um acidente de percurso de trabalho e acabou ficando parado. Um ano depois ele teve um AVC [acidente vascular cerebral] com 26 anos. Como sequela ele perdeu a visão por um tempo, mas graças a Deus já recuperou. E desde então, faz hemodiálise. Por isso, tive que me virar. Fiz curso de panificação e fui me levantando para poder manter a casa, os filhos e ajudar meu marido.
PERCALÇOS NO CAMINHO
No começo, além dos desafios familiares, a Priscila também lutava para continuar e produzir com qualidade. “Eu aprendi vendo nas revistas de receita, só que as vezes eu não tinha dinheiro para comprar os ingredientes para fazer as encomendas. Outras vezes que eu fazia e não vendia. Além disso, como todos que mexem com comida, já errei medida, esqueci ingredientes e tive que refazer. Mas foi dando tudo certo”.
Essa rotina durou quase cinco anos, até que ela decidiu se especializar. Priscila se matriculou no curso de panificação do projeto Fortalece Mulher, da Prefeitura de Guarapuava.
No curso era um esforço, eu tinha a bebezinha e deixava ela com meu marido. Mas teve vezes que levei junto e todos me ajudavam com ela. O curso era em Guarapuava, eu pegava a van e levava uma hora para chegar. Dependendo do horário das encomendas, eu tinha que ficar até de madrugada fazendo, para poder fritar no outro dia.
Entretanto, a palavra ‘desistir’ não existe para a empreendedora. Ela encontrava nos filhos, a força para continuar e persistir nos sonhos. “Eles me ajudaram e me deram forças pra chegar até aqui. Os mais velhos saíam comigo, fizesse chuva ou sol, não tínhamos carro. E hoje em dia, eles me ajudam em tudo que eu for produzir”.
Dessa forma, o negócio se expandiu e as vendas alavancaram. Priscila vende lanches, salgados, sobremesas e até buffet para festas.
Depois que fiz o curso, fiz o MEI e regularizei. O pessoal começou a gostar e vir atrás para encomendar. Agora com as redes sociais eu vendo muito! O lucro vem todos os dias, depende de como você o utiliza. Assim, eu fui conquistando, o carro paguei com dinheiro das vendas. A casa comecei com os lucros e agora, estou construindo a minha lanchonete.
FORTALECIMENTO DAS MULHERES
Assim como Priscila, mais mulheres têm se encontrado no empreendedorismo. De acordo com um levantamento feito pelo Sebrae em 2022, o Paraná tem 1.882.793 empresas e cerca de 41% têm mulheres no comando. Já em Guarapuava, esse percentual é quase o mesmo, pois são 24.429 empresas, sendo 40% também lideradas por elas.
Em comparação com 2021, este número já aumentou significativamente. Isso porque, ano passado as empreendedoras representavam 34% das empresas e em quase a metade delas (49%), elas tinham menos de 44 anos. Além de gerenciar o próprio negócio, 47% das empresárias paranaenses também são chefes de domicílio.
Apesar de terem que equilibrar todas as tarefas, o mesmo percentual atua mais de 40h por semana no negócio. No Estado, 18% delas são empregadoras, sendo a terceira maior proporção no Brasil. Sendo assim, o projeto Fortalece Mulher vem ao encontro dessas mulheres para fortalecer o empreendedorismo feminino. De acordo com a Prefeitura, a Secretaria de Desenvolvimento e Inovação de Guarapuava, por meio do programa Emprime e em parceria com o Sebrae, promove o projeto.
Isso porque, cerca de 54% dos clientes atendidos pela Agência do Empreendedor são mulheres. A ideia é que elas possam receber auxílio e potencializar a liderança feminina. Conforme a coordenadora do Emprime, Ana Cláudia Klosouski de Andrade, o programa surgiu para dar suporte aos empreendedores no momento de crise provocado pela Pandemia.
“Mas além das orientações para ajudar as empresas a retomar e reestruturar os negócios, o Emprime foi ampliado. Hoje são 18 projetos que buscam de forma integrada promover a desburocratização com políticas públicas. Como também, a capacitação e consultoria aos empreendedores para alavancar os negócios, o incentivo a inovação e uso de tecnologias e o acesso ao crédito, às compras governamentais, entre outros. Desse modo, estamos fortalecendo o empreendedorismo e a economia local, o ecossistema de inovação e o aperfeiçoamento da gestão pública”.
GRANDES PASSOS E NOVOS DESAFIOS
Entre a porcentagem de empreendedoras também está a Jimara Goes Wilke, de 47 anos. Antes ela era dona de casa e não tinha concluído os estudos, mas ganhou um curso de cabeleireira da filha e a partir daí, não parou mais de se especializar e aperfeiçoar o trabalho.
Fiquei muitos anos longe do mercado de trabalho, apenas cuidando das minhas filhas e da casa. Por isso, no começo do curso, eu não sabia nem pegar em uma escova. Mas eu gostava muito e fui me adaptando na área. Logo, eu consegui um emprego.
Depois disso, Jimara abriu o próprio salão em sociedade, mas acabou não dando certo. Ela precisou fechar o salão. “Eu entreguei o imóvel, mas ainda tinha uma agenda de clientes que já estavam marcadas. Então abri um espaço perto de casa, só para atendê-las e depois eu ia fechar e trabalhar com outra coisa. Mas não parava de chegar clientes, eu estou no mesmo espaço há nove anos”.
Contudo, a empreendedora ainda tinha o grande sonho de concluir o ensino médio. Com a flexibilidade do empreendedorismo, ela conseguiu ter tempo para estudar e ainda se formou ao lado da filha.
“As conquistas materiais elas vêm, mas como pessoa, o empreendedorismo me mostrou o quanto eu posso, o quanto eu consigo e tenho força! Eu tenho um suporte, toda vez que eu precisei eu fui ao Sebrae ou fiz cursos gratuito e cursos técnicos. Você consegue ver que você pode, porque você pode ser seu melhor amigou ou seu pior inimigo, tudo depende de você!”
Assim, quando veio a pandemia de covid-19, Jimara decidiu se reinventar. Ela ingressou no curso superior de terapias integrativas e continuou atuando como cabeleireira, mas quis expandir os horizontes. Dessa forma, mesmo com o caos que estava o mundo lá fora, ela afirma que encontrou dentro de si uma nova paixão para ajudar as pessoas.
Nós tivemos várias crises na área do comércio e da estética, a pior foi essa da covid-19. Mas cada crise é um aprendizado, em vez de cruzar os braços, você vai a luta e vai descobrindo caminhos. Quando fechou os eventos, eu me redescobri em uma profissão que estou amando. Gosto de trabalhar com cabelos e maquiagem, mas também gosto de aplicar uma massagem, aplicar uma auriculoterapia. Gosto de ajudar as pessoas!
Agora, ela pode expandir o negócio e já está traçando novos caminhos para seguir. A empreendedora vai receber o diploma em dezembro e pensa em viajar para poder investir no próprio crescimento. Mas em seguida, ela quer voltar para ampliar o espaço.
Empreender é isso, é ir em busca de conhecimento. É não ter medo de errar, não ter medo de cair. Porque se acontecer, você vai se levantar. Hoje sou cabeleireira, esteticista, terapeuta integrativa, mãe, esposa, avó, dona de casa e universitária. E tudo começou com um curso, mas eu acho que não tem idade para começar. Para mim cada coisinha, é uma vitória. É isso que você ganha, o financeiro vai e vem, mas o crescimento, não tem preço!
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