Já imaginou estar em um estádio com capacidade para quase 50 mil pessoas e parte delas, proferir xingamentos contra você, desejar a sua morte, e te comparar a um macaco? Tudo isso por causa da cor da pele? Só quem já sofreu racismo, sabe da dor e o tamanho do absurdo de estar sendo atacado. Isso é o que o jogador brasileiro Vinícius Jr passou em uma partida no último domingo (21). Eu também. [Vallery Nascimento, repórter no Portal RSN].
Eu que nem ganho uma média R$ 20,83 milhões de euros. Não sou a oitava brasileira mais bem paga no esporte. E também não estou entre os maiores nomes do futebol. Então quantas pessoas comuns sofrem racismo todos os dias, mesmo que os negros estejam presentes em todos os espaços? E sem força para reagir, quantas vozes se calam diante da impunidade? Digo isso porque eu precisei que outra pessoa “gritasse” por mim, para entender o problema da discriminação racial.
RACISMO NOSSO DE ‘CADA DIA’
Aos nove anos, eu estudei em uma escola bem conhecida em Foz do Iguaçu. No fim da aula, estava esperando meus pais me buscarem, então me sentei em uma escada em frente à escola. Na noite anterior, tinha chovido bastante na cidade, e a rua ainda tinha algumas poças. Um dos alunos estava brincando de pular entre elas.
De repente, senti um chute nos meus ombros. Uma mancha marrom de lama escorria na minha camiseta branca da escola. Sem entender, olhei para cima e vi um garoto caindo na risada. “Agora sua blusa está igual a sua cara”. Não tive forças para chorar, não consegui entender porque alguém iria me sujar, só para rir de mim. Logo meu pai chegou na escola e indignado perguntou o que havia acontecido.
Contei para ele e a situação acabou na sala da diretoria. A diretora da escola garantiu que iria ficar me ‘vigiando’ para que isso não acontecesse de novo comigo. O garoto que fez isso, até foi identificado. Porém tudo não passou de uma conversa sobre “como devemos tratar os outros bem e que ele não poderia fazer aquilo”.
O QUE A LEI DIZ
E para que casos como esse não passem impunes, a tipificação dos crimes de racismo e injúria racial em lei são algumas das maiores armas diante de casos como o meu, assim como do Vinícius Jr e de 85% dos brasileiros que se posicionam contra o racismo. O dado é do Instituto Locomotiva que considerou 1.630 entrevistados em 72 cidades do Brasil em 2021. No entanto, poucos sabem como usar a lei para defesa e garantia da igualdade racial.
De acordo com o criminalista Marinaldo Rattes, o racismo considera a ofensa contra uma coletividade. Por exemplo, contra a dignidade e a honra de toda uma raça, sem ter a especificação do ofendido. Por outro lado, a injúria racial é a ofensa direcionada a uma pessoa em específico. Desse modo, o que diferencia os crimes é a conduta do ofensor.
Com o fim de coibir os crimes de racismo, a legislação de 2023 impôs ao autor do crime, pena de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. Além disso, a pena é aumentada de metade se o crime ocorrer por duas ou mais pessoas.
O advogado ainda explica que o crime de racismo pode ser dividido em estrutural, institucional e recreativo. “O racismo estrutural ocorre quando há disparidade raciais presentes na sociedade, sejam elas políticas, econômicas ou jurídicas. Já o institucional está presente nas instituições e o recreativo, é o tratamento que consiste em ofensas supostamente proferidas como piadas ou brincadeiras”.
Diante dessas situações, a vítima pode buscar a autoridade policial, delegacia, Ministério Público ou até um advogado. “A palavra da vítima tem grande relevância probatória. Ela pode ainda provar com testemunhas, imagens e vídeos. Podendo juntar com documentos de tratamentos psicológicos também”.
O caso em evidência do Vinícius Jr teve milhares de pessoas como testemunhas e as vítimas devem ter o maior interesse em promover a justiça. Em nenhum âmbito, os criminosos podem sair impunes.
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