22/08/2023
Blog da Cris Brasil Guarapuava Paraná

Muito além dos ‘likes’ no Instagram

Levantamento sobre a influência de políticos no Instagram oferece um retrato fascinante e, ao mesmo tempo, perturbador da política no PR

(Foto: Reprodução/Pixabay)

Um recente levantamento da MonitoraBR sobre a influência de políticos no Instagram no primeiro semestre de 2025 oferece um retrato fascinante e, ao mesmo tempo, perturbador da política paranaense e brasileira.

Analisando os nomes me deparei com presença de seis paranaenses no top 100 nacional. Essa aparição pode, à primeira vista, parecer um sinal de prestígio. No entanto, uma análise crítica dos dados revela menos sobre a governança e a eficácia legislativa. Em contrapartida, mais sobre a ascensão de um tipo específico de capital político. No meu entendimento, a influência como performance. Ou seja: o ‘ranking’ não mede quem tem mais poder institucional. Mas sim quem domina com mais eficácia a gramática da polarização e do personalismo nas redes.

São personagens, não gestores

O primeiro ponto que ‘salta aos olhos’ é o perfil dos paranaenses mais bem ranqueados. Sargento Fahur (15º), Deltan Dallagnol (19º), Renato Freitas (32º), Sergio Moro (46º) e Delegado Matheus Laiola (48º) não são figuras conhecidas pela articulação de projetos complexos de gestão ou por uma atuação parlamentar discreta e focada em negociação. Pelo contrário, todos eles personificam narrativas fortes e, muitas vezes, antagônicas.

Fahur, que lidera a lista dos paranaenses, é o arquétipo do ‘policial linha-dura’; Deltan e Moro capitalizam sobre o legado da Lava Jato, uma marca que ainda mobiliza paixão e ódio. Já Freitas se firma como a voz do ativismo de esquerda, frequentemente em confronto direto com o status quo. Enquanto Laiola se ancora na popular causa da defesa animal.

São, portanto, ‘personagens políticos’ com roteiros claros. O Instagram recompensa essa clareza. Algoritmos não promovem a nuance do debate sobre o orçamento do estado. Eles promovem o vídeo de impacto, o discurso inflamado, a declaração polêmica. O engajamento, a métrica central do estudo, é, em grande parte, um subproduto da intensidade emocional, seja ela positiva ou negativa.

Quando o poder real não gera ‘like’

A ausência mais eloquente na lista é a do governador Ratinho Junior. Como o chefe do Executivo estadual, detentor do maior poder institucional e orçamento do Paraná, poderia não figurar entre os 100 mais “influentes”? A resposta expõe a falácia de equiparar influência digital com poder de governança.

Entendo que a comunicação de um governador, por natureza, tende a ser mais institucional. Ou seja: anúncios de obras, balanços de gestão, agendas oficiais. Esse tipo de conteúdo, essencial para a administração pública, é ‘veneno’ para o engajamento no Instagram. Não gera brigas nos comentários, não cria heróis ou vilões instantâneos.

Ratinho Junior não estar no ‘ranking’, enquanto presidenciáveis como Tarcísio de Freitas (11º) e Romeu Zema (22º) estão, sugere que a ‘influência’ medida é aquela necessária para a arena nacional. E lá a construção de uma marca pessoal e populista é imperativa. O governador do Paraná, talvez focado na gestão, ainda não joga (ou não precisa jogar) o mesmo jogo de personalidades que miram o Planalto. Isso revela uma perigosa bifurcação entre o poder de governar e o poder de influenciar.

O diagnóstico nacional refletido no Paraná

Os dados agregados do estudo confirmam as tendências que os nomes paranaenses já indicam. A esmagadora dominância da direita (56%) e do PL (42%) não é uma coincidência. Esse campo político aprendeu a falar a língua das redes sociais de forma mais eficiente. Utiliza uma comunicação direta, conservadora em costumes e frequentemente baseada na confrontação, o que maximiza o engajamento.

Da mesma forma, a disparidade de gênero (75% de homens) é um sintoma crônico. A arena digital é particularmente brutal com mulheres, como Cristina Graeml (54ª), a única paranaense na lista. A necessidade de enfrentar um nível desproporcional de ataques e assédio cria barreiras e exige uma couraça que muitos homens na política não precisam ter.

A influência que esvazia a política

Vejo o ‘ranking’ do MonitoraBR como um documento valioso. Mas, cuidado, pois deve ser lido criticamente. Isso porque não mostra quem são os políticos mais poderosos ou competentes do Paraná. Mas sim quem são os mais hábeis em transformar imagens em produtos de alto engajamento.

Ou seja: a “influência” retratada é a capacidade de mobilizar nichos, de inflamar bases e de se manter permanentemente em campanha. O risco, para o Paraná e para o Brasil, é que essa lógica ‘canibalize’ a política tradicional.

Quando a performance digital se torna mais valiosa que a articulação política e a entrega de resultados, incentiva-se a formação de celebridades e ativistas de mandato, em detrimento de estadistas e gestores. A lista dos mais “influentes”, portanto, pode ser também a lista de sintomas de uma democracia cada vez mais barulhenta, fragmentada e refém de seus próprios algoritmos.

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Cristina Esteche

Jornalista

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