22/08/2023
Blog da Cris Guarapuava

O silêncio da XV!

O silêncio da Rua XV de Novembro, às vésperas de um 7 de Setembro, é um grito surdo, um vazio que ecoa memórias

XV de Novembro revitalizada (Foto do projeto: Secom Municipal)

Se você apurar os ouvidos nesta noite em Guarapuava, talvez escute o que não está mais lá. O silêncio da Rua XV de Novembro, às vésperas de um 7 de Setembro, é um grito surdo, um vazio que ecoa memórias. Amanhã, pela segunda vez em gerações, os tambores não rufarão sobre seu asfalto. A avenida foi calada. Primeira para as obras. Agora porque as obras ‘mataram’ o espaço público.

A morte, para uma rua, não é súbita. Ela acontece aos poucos, em nome de um progresso que nem sempre é avanço. Primeiro, há anos levaram o coreto, e com ele se foram as retretas que musicavam os fins de tarde. Depois, o tempo dissolveu o ‘bobódromo’, aquele ritual da juventude dos anos 70, a passarela de olhares lascivos e paqueras inocentes que começavam ali, sob a luz do sol, e buscavam desfecho no escurinho do extinto Cine Guará. Hoje, um templo evangélico, numa ironia das transformações.

Aos poucos, a rua foi sendo mutilada nas cenas mais queridas. Mas ela resistia. A XV ainda era o palco sagrado da cidade. Era ali que a multidão se encantava com a Praça Encantada e a magia do Natal ou se espremia, da esquina da Saldanha Marinho até a Brigadeiro Rocha, para aplaudir. Fosse no tímido carnaval de rua ou, principalmente, na parada cívica, a avenida se vestia de festa. Era o coração pulsante de Guarapuava.

JÁ FOI

Era. Porque um projeto frustrado, talvez mal planejado, nascido mais para a ‘obra’ do que para a vida, deu o golpe de misericórdia. Conseguiu o que décadas de pequenas mudanças não fizeram: arrancou-lhe a alma cívica, a memória histórica. O comércio empalideceu.

Neste domingo da Independência, a XV amanhecerá órfã. Não se ouvirá o som vibrante das fanfarras escolares, nem o trote ritmado dos cavalos dos tradicionalistas, muito menos a marcha impecável dos militares ou as apresentações festivas de escolas e entidades. As crianças não acenarão das calçadas, os aplausos estarão mudos. As cores verde e amarela deram lugar ao cinza do concreto frio.

Haverá um desfile em outro lugar, dirão. Sim! A rua Brigadeiro Rocha tomou para si esse protagonismo de centro cívico. Mas a alma da ‘parada’ ficou aqui, fantasma sobre este asfalto agora mudo. A XV não se calou. Foi silenciada. E a cidade, um pouco mais nostálgica, sente o peso dessa quietude.

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Cristina Esteche

Jornalista

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