22/08/2023

A bolsa e a vida!

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A Bolsa e a Vida

Em tempos mais românticos, e patetas, nos quais ser marginal era ser herói, mitificaram-se ladrões e assaltantes. Acreditava-se que os destituídos, desabrigados, descamisados, tinham o direito sagrado de “expropriar legitimamente a burguesia de parte de seus maus ganhos”. Ocorre que a classe media já era, e continua sendo, expropriada por uma das mais escorchantes cargas tributárias do planeta, recebendo muito pouco em troca; ser menos vítima não transforma ninguém em algoz. Os verdadeiros beneficiários de nossa iniquidade social nunca estiveram ao alcance dos “justiceiros”, quando moram no país, o fazem em fortalezas inatingíveis, deslocam-se em helicópteros e carros blindados, e tem exércitos particulares a protegê-los.

Permaneceu, no entanto, a ilusão de que a criminalidade é apenas uma questão social, pedir mais segurança é algo próximo do fascismo, cercear os criminosos é apenas uma forma de vingança.

Evidentemente a criminalidade é também uma questão social, e policiamento e punição são apenas paliativos, mas não podemos nos render ao vício, muito comum em algumas áreas do serviço público, de não fazer absolutamente nada enquanto não se tem a solução ideal, aquela definitiva e totalmente justa; pois isso constitui forma cruzar os braços, e enquanto aguarda a resolução de tudo, não fazer simplesmente nada.

Quando se fala em redução de maioridade penal entra-se em terreno pantanoso, há quem ironize dizendo que a proposta é de interrogar bebês nos berçários, ou quem afirme que se aprovada a maioridade penal aos dezesseis anos e houver um crime cometido por alguém de quinze, começará nova campanha de redução. Uma forma de evitar o debate é desqualificar a proposta com a qual não se concorda, afirmando por todos os meios que é totalmente absurda, e “provar” tal afirmação com exemplos inflados, exagerados e fora de contexto. Ninguém, com um pouco de sensatez, encarcera crianças com adultos ou pune draconianamente pequenos delitos; nenhum magistrado o permite.

A boa intenção de resguardar os menores os faz, em muitos casos, mais vítimas ainda. O atual estatuto dá a muitos bandidos maiores de idade a semi-impunidade assegurada aos menores, basta que na quadrilha que comete um crime haja um menor que o assuma. É preciso ser muito ingênuo, no mínimo, para acreditar que é sempre um menor que puxa o gatilho, ateia fogo, chefia o bando. Quando os bandidos são presos, o menor é chantageado, comprado, convencido a se responsabilizar pelos piores atos, sabendo que ficará no máximo três anos em local em que será respeitado pelos outros presos como “perigoso”. Ao sair, será recebido pelos antigos comparsas como alguém de confiança.

Um assalto costumava ser um negócio, enormemente assimétrico, visto que uma das partes estava armada e a outra geralmente não, mas processava-se de modo a que a vítima cedia dinheiro, joias, carro, e mantinha sua integridade física em troca.

Hoje não basta: mesmo nos casos em que não houve absolutamente reação nenhuma, aconteceram mortes estúpidas. É preciso apoderar-se do que é essencial ao outro, vampirizar os privilégios, obter alma, respeito próprio e vida; o que é trágico, diz muito de nossa perversa organização social, mas não serve de consolo ou justificativa.

Wanda Camargo – educadora e assessora da Presidência das Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil.

Cristina Esteche

Jornalista

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