22/08/2023
Economia

Bolsa-de-Valores & Protestos

Recebi do jornalista Júlio Stanczyck e compartilho:

 

Se pararmos um pouco e colocarmos nosso pensamento abstrato para funcionar, podemos perceber que a imagem que vem à nossa cabeça quando ouvimos falar sobre bolsa-de-valores, não é muito diferente da imagem que possuímos de um protesto, destes que temos assistido nos últimos dias nas ruas do Brasil. Pessoas e mais pessoas aglomeradas, gritando "palavras de ordem", correndo daqui para lá; temos a leve impressão de que apesar de haver algum "objetivo comum" que nos escapa por baixo daquela agitação toda, parece que ninguém está entendendo nada.

                No que se refere a bolsa, essa imagem eternizada pelo cinema no imaginário das pessoas, não corresponde mais a realidade no dia-a-dia do mercado financeiro, salvo poucas exceções fora do Brasil. O pregão viva-voz, como era chamado, foi extinto a pouco menos de uma década, deixando em seu lugar as negociações eletrônicas realizadas por meio da rede mundial de computadores. Desde bancos, grandes fundos de investimentos, até traders (pessoas físicas que compram e vendem com seu próprio dinheiro), negociam separados uns dos outros, interagindo com seu pares apenas por meio de ofertas de compra e venda lançadas nas telas. O velho empurra-empurra romantizado da bolsa, não existe mais. Mas, no que se refere ao ambiente de negociação aparentemente caótico, ele permanece a despeito de tudo; apenas mais abstrato, virtualizado pela medição das máquinas.

                Interesses diferentes e expectativas mais diversas a respeito do futuro; duas características que servem para definirmos tanto a bolsa-de-valores quantos os protestos recentes. Na bolsa todos querem ganhar dinheiro, nos protestos todos querem dar voz a sua insatisfação. No entanto, essas definições são grosseiras e não definem muita coisa na prática. Na bolsa, uma pessoa pode ter expectativa de lucrar com a venda de determinado ativo em um prazo curto (na bolsa é possível vender antes de comprar, uma das magias do dinheiro virtual) e outra pode pensar ao mesmo tempo em ganhar dinheiro comprando aquele mesmo ativo, as expectativas diferentes e os objetivos contrários é o que fazem os preços oscilarem; assim como nos protestos, o enorme leque de reivindicações fez o movimento crescer até aqui e assim como a bolsa, ninguém sabe com certeza onde tudo isso vai parar.

                Em ambos os lugares temos que admitir que tudo pode acontecer a qualquer momento, mas isso não significa que a bolsa ou os protestos não possuam sentido algum. Não é possível ter certeza sobre a movimentação dos preços na bolsa, assim como não é possível saber o que representará no futuro um movimento sem lideranças, ou objetivos unanimemente aceitos, ao menos até o momento. Mas, assim como os traders são capazes de aproveitar as ondas criadas pelo fluxo de expectativas antagônicas e alcançar o objetivo de lucrar com o mercado, certamente há quem olhe para as manifestações e pense em tirar proveito das demandas contrárias. Se há alguém (ou algum grupo) que tenha os meios efetivos de fazer isso eles tentarão fazer.

O mercado brasileiro

                Desde o ínicio de 2013, temos visto uma desvalorização gigantesca no Índice Bovespa. Este ano, era esperado como aquele, em que a bolsa brasileira se recuperaria da fraqueza dos anos anteriores. No entanto, desde janeiro o mercado apontou para a baixa e nas últimas semanas tem estado no mesmo patamar que estivera em 2009. Poucas semanas antes dos protestos começarem no Brasil, uma das principais “agências de rating”,Standard & Poor’s (agências que  atribuem notas aos países e empresas considerando o grau de atratividade para se investir nestes locais), colocou em perspectiva negativa a nota do Brasil.

                Os motivos que levaram a “agência de rating” a temer pelo futuro econômico do Brasil e fazer com que o investidor estrageiro retirasse bilhões de dólares do mercado nacional, foram os mesmo que levaram as pessoas às ruas do país. Os péssimos gastos públicos, a altíssima carga tributária, os fracos investimentos na saúde e educação. Porém, um fato gera outro fato e as próprias manifestações são mais um fator que tem levado os investidores a retirarem os investimentos no Brasil.

Última nota

                Um exemplo interessante do efeito das manifestações no mercado financeiro, aconteceram nesta sexta-feira (21). As ações da Copel caíram 18,81%. Isso aconteceu após o pedido do governador Beto Richa para que a empresa, cujo maior acionista é o Estado do Paraná, não reajustar a tarifa de luz em 14,61%, prevista para entrar em vigor no dia 24 de junho. Com isso, a empresa perde de 700 a 800 milhões de reais em valor de mercado. O pedido não veio à toa, e o mercado sabe disso. Com a massa de manifestantes reclamando nas ruas, não é bom dar mais motivos para os protestos.

Júlio Stanczyk é formado em jornalismo e trabalha como trader

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.