22/08/2023

O Movimento dos Sem Voto

Recebi do jornalista Carlos Fernando Huf e compratilho:

 

O Movimento dos Sem Voto

                                                                           Carlos Fernando Huf

             Guardadas as devidas proporções de tempo e de mídia, o movimento atual lembra em muito a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, com que as dondocas do Rio de Janeiro reforçaram a preparação para o golpe em marcha que se concretizou em 1964 – e em que uma minoria organizada venceu uma esmagadora maioria que apoiava as reformas de que o Brasil precisava.

A diferença hoje está em que, em lugar das dondocas temos a juventude “cheirosa” da classe média alta, que nunca pisou num ônibus para ir ao trabalho ou à faculdade. São os mesmos que acusam o governo petista de “estatizante”, e agora vêm com um “Movimento Passe Livre”, ou seja, exigindo a estatização total até do transporte. São os mesmos que nunca fizeram manifestação diante de câmaras municiais e assembléias estaduais para protestar contra a corrupção que ali come solta, envolvendo as relações promíscuas com os concessionários do transporte público.

            Encontrado o mote para as manifestações, e o vandalismo que as acompanhou, alguns  aproveitaram para diversificar as reivindicações. Senão vejamos.

Os que nas ruas  reclamam  mais saúde são os mesmos que aplaudiram o fim da CPMF – um imposto que só prejudicava mesmo os grandes bandidos, de sonegadores e políticos corruptos a traficantes.

            Os que reclamam mais educação são os mesmos que aplaudiram os deputados que negaram a aplicação de 100% dos royalties do pré-sal na educação, proposta pela presidenta Dilma.  (Com o projeto voltando à pauta, nos próximos dias, terão eles coragem de negar novamente o que esse povo tão “organizado” reclama nas ruas?)

            E os que reclamam da “inflação do tomate” – mais uma piada dos “economistas” da mídia capitaneada pela Globo/Veja?  Não vimos nenhum deles reclamar dos empresários gananciosos que, em vez de repassar ao povo, embolsaram a desoneração que o governo federal fez para baratear produtos básicos de consumo.

            Quando o governo federal baixou a energia elétrica, nenhum deles foi visto protestando contra os governos do Paraná, São Paulo e Minas Gerais, que se recusaram a participar do esforço nacional, e com isso diminuíram a média da redução para todo o país.

            E aqueles que portam cartazes contra a corrupção? Não vejo ninguém bradando contra os figurões da mais alta cúpula do MP e do Judiciário, que se sentam em cima de “mensalões” do PSDB, de investigações da Polícia Federal envolvendo banqueiros e Cachoeiras, entre outros.

            A peremptória recusa à participação de partidos políticos é mais um sinalizador das reais intenções do movimento. Porque os partidos, por piores que os tenhamos,  são fundamentais para a democracia. Sem partidos, o resultado é a ditadura.

            Esses são os participantes do Movimento dos Sem Voto (na feliz expressão de um “blogueiro sujo”) que, reforçados pelos oportunistas de sempre, além dos inocentes úteis e até daqueles que sempre comparecem nessas ocasiões apenas de olho numa chance de seus quinze segundos na TV,   apostam no caos para tentar uma volta ao poder que o povo lhes retirou há dez anos.

            No exterior, os jornais dos financistas ingleses e americanos teimam em defender o neoliberalismo que está afundando a Europa – e se metem a dar palpite aqui, exigindo a queda de Mantega.  Já na Espanha, uma das maiores vítimas do sistema, com o desemprego em massa levando o desespero principalmente aos jovens, um jornal teve a melhor percepção da nossa realidade, quando perguntou, em  manchete:  “Por que no Brasil, e por quê agora?”

            A resposta é óbvia.  A sistemática pregação negativista e anti-brasileira comandada pelos cinco capofamílias da mídia não consegue mudar o fato de que o Brasil continua no caminho certo. A sua última esperança era o propagandeado fracasso na construção dos estádios, e no consequente fracasso das copas das Confederações de 2013 e do Mundo de 2014.

            Iniciada a Copa das Confederações na boa, bateu o desespero. E só restou  mandar a rapaziada do face-book  tumultuar as ruas e apostar no caos, para ver no que dá. Perdido por perdido, truco!

            Há alguns que, do lado de cá, dos milhões que só se manifestam nas urnas,  bradam por uma atitude mais radical de Dilma, para que ela bata de frente com essa mídia e seus asseclas. Reclamam que ela deveria ter sido mais dura, mais específica, em sua última fala na TV. Discordo, pelo menos em parte.

            Quando Lula assumiu o governo em 2003, e não chutou o pau da barraca logo de cara, também fiquei puto. Mas poucos meses depois tive que lhe tirar o chapéu. Cevado no ABC paulista, na luta sindicalista em plena ditadura, o “apedeuta” aprendera o que nenhum sociólogo vai aprender. E, comendo pelas beiradas a sopa quente e indigesta que herdara, fez o que fez pelo Brasil. Brasil gente, Brasil povo, Brasil da senzala, entenda-se.

            Dilma com certeza é uma boa aluna. E ela sabe que seus eleitores não estão nas ruas. Estão aos poucos saindo da senzala, mas indo para a casa, para a escola, para o trabalho.  Para a dignidade que falta àqueles que, sem voto, apostam em velhos e viciados costumes para tentar retomar o poder.

                Tive certeza disso quando, no último sábado, 22,  me acheguei a uma roda de  policiais militares de serviço no Terminal da Fonte, após mais uma das “manifestações” que assolam o país no momento, e ouvi seus comentários. Um deles falava de estranhas figuras que vira na “manifestação”. Outro lembrava da faculdade de Direito que está cursando, onde vai de carro próprio, coisas  “impossíveis em tempos passados”, para alguém como ele.

                                                           o-o-o-o-o

Bem Brasil

Mas não é só o policial guarapuavano que sabe das coisas. FHC acaba de anunciar a retirada de seu dinheiro da especulação financeira  para formar, em sociedade com alguns antigos e íntimos colaboradores da privataria, uma empresa de construção civil. Até ele já descobriu que no Brasil de hoje a produção rende mais que o “capital vadio” que fazia a festa no seu tempo. Mas ainda existem alguns por aí que continuam xingando de “apedeuta” o criador desse novo país.

 

Cristina Esteche

Jornalista

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