22/08/2023

Grande Sertão: Veredas.

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'Diadorim é a minha neblina', nos diz Riobaldo.

Grande Sertão: Veredas não é um livro fácil. Exige um pouco mais de concentração, e passear pelas páginas acaba nos transformando em tradutores, porque há uma infinidade de palavras novas [os tais neologismos], palavras propositalmente suprimidas, regionalismos – e tudo isso numa narrativa não-linear!

Escrito pelo mineiro João Guimarães Rosa e lançado em 1956, é uma das grandes obras da literatura brasileira e tudo em sua construção é inusitado, sendo o fio condutor as confidências que faz o [ex] jagunço Riobaldo a um interlocutor sem nome nem voz. Se nos deixarmos envolver pela história, em pouco tempo conseguiremos visualizar a paisagem cor de terra salpicada de verde, num estranho paradoxo entre árido e abundante, o calor escaldante refrescado pelos riachos e as sombras das árvores frondosas, a camaradagem do bando, quebrada pelos inevitáveis tiros e gritos das peleias.

E então, de um jeito rápido e definitivo, a gente compreende que o livro não é sobre os sertões, as veredas ou os jagunços: o livro é sobre um amor impossível, separado pela morte. Poderia ser a história de Romeu e Julieta, mas é a de Riobaldo e Diadorim! E aqui entra o grande tempero da história: afinal, quem é Diadorim? Pois é também um jagunço aguerrido e valente, tal e qual Riobaldo. Imagine o auê que uma afinidade dessas poderia causar…

As reflexões e testemunhos de Riobaldo sobre a vida, a guerra, a morte, o medo e o seu amor por Diadorim – represado, intacto na memória; são de uma beleza e sabedoria ímpares, como as que a gente imagina encontrar nas pessoas que passam por grandes provações e sobrevivem para contar.

‘Só se pode viver perto do outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura…

…Viver é muito perigoso; e não é não. Nem sei explicar essas coisas, um sentir é do sentente, mas outro é o do sentidor.’

 

Ps1: A imagem que ilustra o post é de Bruna Lombardi como Diadorim, numa cena da minissérie Grande Sertão: Veredas, que passou na Rede Globo nos anos 80.

*ultra spoiler alert*: a cena a seguir conta toda a trama em menos de 2 minutos. 

https://www.youtube.com/watch?v=UwOPW_Lww3I

Ps2: É um dos meus livros favoritos, portanto dos mais sublinhados e rabiscados. Vou deixar mais um trechinho, ta? 😉

'E de repente eu estava gostando dele, num descomum, gostando mais ainda do que antes, com meu coração nos pés, por pisável; e dele o tempo todo eu tinha gostado. Amor que amei – daí então acreditei. A pois, o que sempre não é assim? '

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cristina Esteche

Jornalista

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