22/08/2023
Segurança

Contradições levam à condenação de Fábio Menarim Rocha

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Da redação

O Tribunal do Júri da Comarca de Guarapuava condenou a 27 anos de prisão, em regime fechado, o bancário Fábio Menarim Rocha, pelo crime de duplo homicídio contra os jovens Henry Franciosi e Sandro Esteche, ocorrido há cerca de  20 anos. A sentença, promulgada após 5 horas de júri, na manhã e parte da tarde desta quinta-feira (25), foi por unanimidade (7 votos a 0), mas o réu vai recorrer em liberdade. Na acusação, atuaram o advogado Loedi Lisouski e a promotora Leandra Flores. Na defesa, o advogado Élcio José Melhem, que também é padrinho de Fábio Menarim Rocha.  Quem presidiu a sessão do júri foi a juíza Paola Mancini. O Conselho de Sentença, formado por seis homens e uma mulher, contrariou o parecer da promotora, que, em tese, deveria atuar na acusação do réu, mas se declarou a favor da absolvição por “dúvidas no processo”.

O réu foi condenado por homicídio duplamente qualificado. Embora tenha se declarado vítima, porque levou um tiro de raspão na barriga, Fábio Menarim Rocha foi apontado como o autor dos disparos. Sandro e Henry levaram cinco tiros, cada um, todos à queima-roupa e contra a região da cabeça. O crime aconteceu num minimercado nos Pinheirinhos, que pertencia ao pai de Sandro Esteche. No inquérito apurado pela Polícia Civil, Fábio teria atirado em Sandro e esperado a chegada de Henry, sabendo que ele viria, para em seguida matá-lo. O réu era devedor confesso de um cheque em nome de Sandro Esteche, já vencido antes do dia do crime, no valor de R$ 5 mil. Henry e Sandro eram parceiros nesse crédito.

Em seu depoimento, Fábio Menarim Rocha sustentou que estava com Sandro no escritório quando Henry chegou acompanhado do “bandido”. De acordo com Fabio em seu depoimento no júri, este homem teria declaro: “É pra hoje”. E Sandro e Henry retrucaram: “Não, é para amanhã”. Em seguida,  o atirador atingiu  Sandro, frontalmente, também Fábio, de raspão, na barriga e, depois, Henry. O matador, segundo Fábio, fugiu pelo portão da frente, em direção à rua. Fábio declarou que sentiu uma ardência na barriga e desmaiou e, ao acordar, viu que Sandro estava morto e saiu correndo pedir socorro. O vizinho que mora em frente ao mercado foi uma das peças-chaves na condenação do réu. No inquérito, ele afirmou que ouviu os primeiros disparos e foi para frente da casa, defronte ao portão de onde deveria ter saído o bandido apontado por Fábio. Nesse intervalo, alega a testemunha, ouviu mais disparos e não viu mais ninguém saindo, apenas Fábio que, ao vê-lo, disse que Sandro havia sido ferido. Uma segunda vizinha,  que mora também de frente para o portão, ficou junto à janela, espiando, logo que ouviu os primeiros estampidos, e sustentou que ninguém mais saiu pelo portão. Ela fez questão de dizer que viu apenas Fábio.

Outro fato que chamou atenção foi que ambas as vítimas foram mortas brutalmente, com disparos à curta distância, e só Fabio foi poupado. O réu disse que não conseguiu ver o rosto do matador porque o tiro foi “à meia-distância”. Contra Fabio, neste item, pesou o depoimento do policial que atendeu a ocorrência e declarou que a camisa do réu estava chamuscada de pólvora, prova, nesta situação, de que o disparo foi à  queima-roupa. A suspeita, portanto, foi de que o réu atirou contra si mesmo, para criar um álibi, passando-se como vítima, de acordo com a ação processual. A favor do réu, Élcio Melhem disse que seu cliente não premeditou o crime, conforme indicam as evidências do inquérito, porque deixou seu carro de “portas fechadas”.

Ao sugerir a absolvição de Fabio, a promotora Leandra Flores justificou que o laudo pericial não comprova que o tiro contra Fábio foi provocado por ele mesmo. A versão da Polícia Civil é de que o laudo também não inocenta o réu. A camisa, que seria uma peça para ser periciada, desapareceu. Restou, como decisivo, a comprovação testemunhal do policial segundo a qual a camisa estava com uma visível marca de pólvora.

Fábio Rocha chegou a ficar preso preventivamente, como principal suspeito, no início do inquérito. Ao ser declarado culpado pela Polícia Civil, Fábio denunciou que foi torturado dentro da 14ª SDP.

Durante o julgamento, um dos momentos de maior tensão foi o debate entre Élcio Melhem e Loedi Lisouski. O advogado de defesa acusou Melhem de tentar protelar ao máximo o julgamento do réu, por ter ficado com o processo em carga, em seu poder, por cerca de três anos. Melhem chamava Lisouski de “projeto de advogado”. No contra-ataque, a acusação questionava que, se a defesa tinha certeza da inocência do seu cliente, por qual motivo segurou o andamento processual, com as provas em carga. Lisouski também criticou com veemência a declaração de que Fábio não conseguiria reconhecer o suposto matador. “Duas coisas eu não esqueceria na minha vida: o nascimento da meu filha e a pessoa que tentou me matar”, ponderou.

Repercussão

"De mais de 800 júris que já participei esta é a primeira vez que vejo um Conselho de Sentença se posicionar contra a promotoria", afirmou Melhem, avisando que vai recorrer em todas as instâncias.

Uma das irmãs de Henry Franciosi, Patrícia, informou que os familiares não esperavam que a sentença fosse de tantos anos. "Desde o início colocamos tudo nas mãos de Deus e a justiça está feita. Sinto pena dos familiares do réu, mas isto foi apenas uma consequência", afirmou.

Marinês Esteche, irmã de Sandro, também disse que a vontade de Deus foi feita. "Desde a morte do meu irmão e do Henry nossa família colocou tudo nas mãos de Deus, mas sempre pedimos que a Justiça fosse feita. Minha mãe já morreu de tanta dor pela perda do Sandro, assim como os pais do Henry. Mas a vontade Divina prevaleceu e mesmo que ele [Fábio] continue em liberdade pesa sobre ele uma dupla condenação".

Fábio Menarim Rocha recebeu a condenação sem esboçar qualquer reação. Postura que manteve durante o julgamento inteiro, inclusive durante o depoimento diante do Conselho de Sentença, quando relembrou os crimes.

A atuação do advogado Loedi Lisouski, contratado pela família de Henry Franciosi, repercutiu entre o meio jurídico e acadêmico de Guarapuava. Ele mora em Ponta Grossa e é professor do curso de Direito das Faculdades Guarapuava. Havia uma expectativa quanto ao resultado do júri, tendo em vista que o advogado de defesa é Élcio Melhem, criminalista com larga experiência, ter relação de parentesco com o réu e o processo estar se arrastando há anos sem solução.

Cristina Esteche

Jornalista

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