22/08/2023

A caminhada é longa, mintendi?

Marcio Fernandes *

O teto do caminhão balança e, de salto alto e toda arrumada, a vereadora sobe ao palanque improvisado, em um final de tarde, no cruzamento da rua XV com a Benjamin Constant, em Guarapuava: ´Boa taaaaaarrrrrrrrde´, começa, com um sotaque carregado. Mas o que parecia ser o início de uma fala de ideias dura pouco mais que um minuto, sem nada de proveitoso. Ela apenas pede voto para um candidato a deputado estadual, parente seu. Lá embaixo, na calçada, cabos eleitorais balançam bandeiras, sem muito entusiasmo, é fato, mas balançam. Estamos na quinta-feira, 12 de agosto, por volta de 18h, no centro da cidade. Naquele cruzamento, cones foram colocados, atrapalhando o trânsito, especialmente daqueles que não querem ouvir nem ver o espetáculo tétrico ali montado. Do outro lado da calçada, vejo um Uno preto parado sobre a faixa de segurança para pedestres, esperando a sua vez de ser adesivado.

No teto do caminhão, é a vez do candidato tomar o microfone. O desastre é maior, ainda que dure igualmente pouco além de 60 segundos. Sem nenhuma proposta técnica a desfiar (talvez pela inexistência delas em seu escopo intelectual), limita-se a dizer que a caminhada é longa e que tem fé em Deus. Por fim, chega a vez do prefeito: ´O nosso time está entrando em campo´, ´caminhada longa´ e ´fé em Deus´ são clichês que ele emprega. Em certa altura, diz que é preciso defender os ´interesses de Guarapuava´, o que me fez lembrar Leonel Brizola, discursando sobre os ´interésses´ do Brasil. Em seguida, penso que a comparação é injusta – Brizola, mesmo ranzinza, era um político brilhante.

A fala do prefeito, vejam só, também dura um minuto, sem que ele revele qualquer proposta de campanha do candidato que o antecedeu. Mal ele dá tchau e os cabos eleitorais aplaudem timidamente, viram as costas e desaparecem, um sintoma de que nem eles acreditam no candidato. Poucos acabam por ouvir a informação vinda do palco de que, neste sábado (14) pela manhã, o circo será montado de novo, o que significa atravancar o trânsito mais uma vez – com a benção do órgão municipal que deveria justamente zelar pelo contrário.É, acho que ando azarado. Primeiro, estive em um showmício do pastor Edson, sobre o qual, aliás, a Justiça Eleitoral parece não ter se pronunciado. Desta vez, eu que apenas estacionei o carro em frente à praça para comprar uma lata de suco, acabei ouvindo sem querer a ladainha carlista, sem nada de concreto em favor da cidade. Como dizia Raul Seixas, quem não tem colírio usa óculos escuros. Mintendi? Ou quer que eu desenhe?

* Morador de Guarapuava. E-mail: marciorf@globo.com

 

 

Cristina Esteche

Jornalista

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