22/08/2023
Brasil

A minha cidade!

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Sou guarapuavana. Aqui nasci, fui criada, estudei, casei. Tive dois dos meus três filhos e três dos meus quatro netos. Relembrando uma tradição antiga, foi ali, na rua Arlindo Ribeiro, onde encontra-se o desativado Hospital São João que tive – assim como meus irmãos – o umbigo enterrado pela minha avó Aurora, debaixo de uma roseira. Aliás, foi nesse chão abençoado que também “plantei” o corpo do meu filho caçula, o Juan, aos dois anos e meio de idade. Lá se vão não sei quantos anos, pois prefiro não fazer essa conta – para mim parace que foi ontem. Foi no dia 13 de maio de 1988, ano centenário da Abolição, às 13h, que o Juan se libertou  numa fatalidade para se transformar numa estrela. 

Saí de Guarapuava, fui a Curitiba junto com o Orlando, Diego e Luana, levando a saudade sem fim como bagagem. De lá, voltei, voltamos. Afinal, como bons guarapuavanos, bebemos a água da serra. É uma lenda que diz que aquele que beber dessa água, sempre volta.

Como andante, preciso da liberdade de sair por aí afora. Gosto de lembrar das andanças anuais por este mundão de meu Deus, transpondo barreiras, pra lá e pra cá. Preciso disso, porque a minha cidade natal me sufoca. Já escrevi várias vezes que tenho Guarapuava como madrasta. Não me julguem, não me perguntem porquê, mas é assim que me sinto. Confesso que tento entender essa relação, mas não consigo.

Dois mestres espirituais que vieram de fora já disseram que Guarapuava possui uma energia muito forte, concentrada. E talvez seja isso que incomoda. Os espiritualistas sabem muito bem disso.

Me sinto estranha quando ouço pessoas que vieram de outros centros dizer que aqui encontraram o lugar ideal para viver. Será que eu também e ainda não me dei conta disso? Será que sinto falta de atividades culturais manifestadas nas ruas, de vivacidade, entre tantas outras coisas? Um dia, um velho amigo, o Galdino, me disse que Guarapuava é cinza. Discordo. Quando desço a serra do Jordão, a caminho da minha morada, vejo o verde do vale, sinto o cheiro de mato, a paz do meu refúgio embalada pelo canto dos pássaros. Me deleito com o por do sol, o segundo mais lindo que já vi – só perde para África, sobre as savanas.

Ali, no meu canto, eu sou feliz. É como se fosse um recorte da cidade. Ali, esqueço um pouco das mazelas que nos mostram, diariamente, o quanto sou, somos, importantes perante o caos social. Mas dentro do meu limite, faço – ou melhor, fazemos: eu e a equipe da RSN – o que é possível para minimizar a miséria social e humana.

Enfim! Essa relação entre eu e minha cidade é antagônica. Um misto de amor e desamor. Não sei bem o que acontece. Talvez sejam problemas meus, coisas indesejáveis que remeto à cidade. Mas estou aqui. Estamos aqui contribuindo para que Guarapuava cresça e se desenvolva e para que seja um lugar onde a gente possa ser feliz.

Cristina Esteche

Jornalista

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