22/08/2023

A negociação que terminou em pizza

Na Velha Rapapé, Dom Cacá baixou uma lei, que só ele sabe, mas todos sentem, pela qual qualquer iniciativa dos pagadores de impostos que implique em ganhos empresariais primeiro tem que passar pelo crivo de sua espada. Se achar que lhe convém, Cacá autoriza a instalação. Não sendo, cria o máximo de óbices possíveis, tendo com instrumentador o tesoureiro Ravengar.
Naquele dia, num dos endereços daquele burgo, dois empresários, homem e mulher, celebravam uma sociedade. Iriam investir num castelinho de sonhos onde poderiam servir saborosas refeições. Era uma parceria nova que se estava inaugurando, difícil de ver na Velha Rapapé, mais habituada a dinastias familiares, um modelo econômico antiquado, mas ainda tradicional naquelas paragens.
Eis que de repente, mais que derepentemente, havia um impeditivo no caminho. O tesoureiro Ravengar resolvera aplicar-lhes a impiedosa e temida “lei do estacionamento”. Mas como? – inquietaram-se os investidores. Por que a lei só valeria para eles, se no mesmo local antes funcionava outro estabelecimento, com a mesma função, e nunca lhes fora exigido estacionamento próprio? Por que o filho de Ravengar tem um estabelecimento sem estacionamento, e ele pode? Por que a pobreza se dissemina entre os proletários e a burguesia da Velha Rapapé quer investir, quer crescer, mas Dom Cacá e Ravengar só pensam em seus próprios negócios?
A Câmara dos Lordes estava em completa ebulição. Era dinheiro pra cá, dinheiro pra lá. Uma festa. Mas um dos nobres não estava contente. Era ele o antigo dono do castelo de sonhos dos investidores. Como o lorde queria vender, não lhe restou outro caminho: só vendia seu passe a Dom Cacá, se fosse concedida a licença para os novos proprietários.
E assim mais um negócio se consumou no Paço da Barrosa, a casa de despachos de Dom Cacá e seu séquito de bajuladores. Uma negociação que, literalmente, terminou em pizza.

Cristina Esteche

Jornalista

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