22/08/2023
Cotidiano

Andarilhos sobrevivem sem assistência em Guarapuava

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Eles perambulam pelas ruas da cidade sem ter para onde ir. Sem atendimento na área social, dormem em qualquer canto vazio que encontram, são solidários e afogam as mágoas na cachaça. Aliás, o álcool é o maior cúmplice dos moradores de rua.
Desviar o olhar para essas pessoas e dedicar um pouco do tempo para conversar com eles é uma tarefa que poucos fazem. Afinal, a invisibilidade social os envolve numa teia que eles próprios não fazem questão e não tem forças para romper. Conversar com eles é desvendar que por detrás dessa teia tecida pela sociedade se esconde um drama familiar.
Claudenor Cordeiro tem 49 anos. A sujeira do corpo e dos trapos que tentam esconder o seu corpo revelam que a higiene não faz parte do seu cotidiano. O forte odor que exala é difícil de suportar. Cabelo e barba compridos, na pela as marcas impostas pelo sofrimento traçam uma aparência típica de quem possui muito mais idade. Deitado sobre um saco que ele guarda não sei o que, talvez as lembranças que tenta esquecer, Albari, ou “Pastorzinho” como é chamado pelos amigos de infortúnio, quase não fala e quando o faz, pouco se entende, pois a língua está embaralhada pela cachaça. Diz que morava no Jardim Aeroporto e depois no Loteamento Adão Kaminski, era casado e tem três filhos. O apelido de “pastorzinho” não é à toa. Revela que era pastor da Igreja Assembleia de Deus, que tinha uma vida normal, e que trabalhava como pedreiro na Construtora Flabel. “Fiz muitas obras por aí”, afirma. O caminho da rua foi lhe mostrado pelo desgosto que teve com a mulher que era a sua companheira. “Ela não vale nada e eu desgostei da vida”, confessa.
“A mulher dele pôs ele pra fora de casa porque arrumou outro”, emenda o companheiro de rua AlbariLima, 48 anos (na foto com Claudenor), cuja situação de penúria não é diferente. Aparentando bem mais idade do que diz ter, Albari é “amigo inseparável do Pastorinho”, com quem convive há mais de quatro anos pelas ruas de Guarapuava.
“Onde tem uma sombra a gente deita, bebe, conversa e dorme”, diz. Albari tem um filho e saiu pela rua quando os pais morreram. “Me desgostei da vida, pois cuidava deles. Com parente não dá pra contar. Logo depois que eles (pais) morreram saí de casa sem rumo e me afoguei na bebida e deu no que deu”, diz com o olhar perdido no tempo.
Assim como Albari e Claudenor outros andarilhos perambulam pelas ruas de Guarapuava diariamente.
“Nossa! Tem muita gente como nós por aí, mas ninguém nos vê, ninguém se importa se estamos vivos ou mortos. Quase pisam por cima da gente”, diz Vilmar José da Rosa Montana que se junta ao outros dois.
“Em outras cidades a gente ganha sopa, tem albergue, temos assistência. Aqui em Guarapuava que é a nossa cidade não tem nada”, reclama.
“Eu gosto da liberdade da rua, de viver por aí sem ninguém, mas o inverno está chegando e aqui faz muito frio. A gente não tem para onde ir nos dias de chuva e frio”, diz Albari. “Existem muitos outros como a gente. São mulheres e até muitas crianças, mas para a sociedade a gente não existe, só para os olhos de Deus”, diz o “Pastorzinho”.

Cristina Esteche

Jornalista

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