22/08/2023
Política

Avanço da mulher na política ainda é lento

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Há 80 anos a mulher brasileira conquistou o direito de votar, embora com restrições. Só podiam votar as que fossem casadas, solteiras e viúvas com renda própria. As casadas precisam ter a autorização do marido.
De lá para cá, apesar da obrigatoriedade do voto feminino, se houve mais espaço na política, a participação ainda é pequena; o avanço é lento.

 

Uma pesquisa científica elaborada pela vereadora Eva Schran (PHS), de Guarapuava, mostra que em Guarapuava a situação histórica e cultural pode ser um exemplo da invisibilidade feminina.
“Embora a mulher tenha uma participação fundamental em todos os processos da história, desde a distribuição das sesmarias o trabalho da mulher não constava, embora fosse ela (a mulher) quem cozinhava, fazia roupas na expedição de Diogo Pinto de Azevedo Portugal. Não encontrei nenhum registro que mencionasse essa participação,” diz.

 

O direito ao voto foi conquistado em 24 de fevereiro de 1932, somente em 1951 Guarapuava teve a primeira participação feminina numa eleição. Alba Keinerth foi lançada pelo partido de Antonio Lustosa de Oliveira. “O Lustosa tinha uma rivalidade muito grande com Lacerda Werneck. Para dizer que saiu na frente, lançou a dona Alba como candidata,” diz Eva Schran. Ela não soube informar qual foi a votação da candidata.

 

 

PERFIL FEMININO NA CÂMARA DE GUARAPUAVA

A primeira vereadora eleita foi Carmen Izidoro em 1976. “A Carmen me disse que saiu candidata por influência do seu irmão (Heitor) e a pedido de pessoas. Ela tinha uma vida comunitária e cultural muito ativa e acabou saindo candidata e sendo eleita”, diz Eva Schran. Carmen cumpriu mandato até 1980. Por dois anos houve uma lacuna n bancada feminina da Câmara. Em 1992 a radialista Marli Rosa assume uma vaga na qual permanece até 1996. Nas eleições desse ano a enfermeira Maria José Mandu é credenciada a substituir a radialista que não foi reeleita. A enfermeira está no seu terceiro mandato consecutivo. Entre 1996 e 2000 Almira Angelucci faz a sua estréia na Câmara. No período entre 2001 a 2004 a bancada feminina aumenta com a entrada da socióloga Maria Magdalena Nerone que se soma a Maria José. Ainda em 2004 mais uma mulher passa a compor o Legislativo Municipal. Em 2006 a suplente Neuzi Gonçalves do Nascimento assume em substituição a Gilson Amaral que se licencia para ser candidato a deputado. De todas essas, apenas Maria José permanece no cargo e divide a bancada feminina com a contabilista Eva Schran eleita em 2008. Em novembro de 2011 com o afastamento do peemedebista Admir Strechar, Almira retorna ao Legislativo aumentando a participação para três vereadoras.

“Embora a cultura de Guarapuava seja mais conservadora pela sua própria formação histórica a mulher sempre se fez presente e procura uma janelinha para participar, principalmente, na política que é uma das áreas mais difíceis,” diz Eva.

 

A vereadora toma como base a própria história da Câmara Municipal de Guarapuava. “A nossa Câmara possui 158 anos e o histórico de vereadoras é pequeno. Entendo que a imposição masculina ainda é muito forte e acaba inibindo participação feminina,” observa. “Mas ou otimista. Acho que a eleição da nossa presidenta Dilma e a nomeação demais mulheres em ministérios vai quebrando paradigmas. Veja: a mulher tem direito a votar há 80 anos e já temos uma presidenta da República. Acho que as conquistas estão caminhando a passos largos,” afirma.

 

Dados revelados pela Agência Brasil, porém, mostram que, mesmo que o país tenha eleito uma presidenta, o Brasil é o último colocado na ranking da América Latina. Considerando que a atual bancada feminina na Câmara Federal representa apenas 8,77% do total da Casa – 45 deputadas – e no Senado há 12 senadoras dentre os 81 lugares, o Brasil ocupa o 142º lugar nesse ranking, ficando atrás de países como Afeganistão, Iraque, Timor Leste, Moçambique e Angola

O AVANÇO É LENTO
Analistas políticos e sociais, entretanto, reconhecem que as mulheres ganharam mais espaço na política, mas avaliam que essa participação ainda é pequena. 

 

A cientista política Andrea Azevedo Pinho disse que o avanço foi mais lento do que poderia ter ocorrido. “Se você pensar que há quase 100 anos as mulheres brasileiras podem votar e hoje as mulheres são menos de 12% dentro da Câmara dos Deputados, conseguiram atingir o recorde de quase um terço de ministras no governo Dilma [Rousseff]. Nota-se que esse avanço foi muito lento”, disse à Agência Brasil a especialista.

De acordo com a cientista política, a mulher ainda tem participação muitas vezes limitada à chamada política leve, de acordo com a cientista política Andrea Azevedo Pinho, da Universidade de Brasília.
“Geralmente as mulheres são eleitas para trabalhos com temáticas relativas a questões de mulheres, como saúde da mulher, educação, com plataformas mais voltadas para o que se chama política leve, do que não está no cerne do noticiário político, como a economia, a infraestrutura”, ressaltou Andrea, que estuda a atuação das mulheres na política.

 

Segundo ela, características repassadas às mulheres pela sociedade, como fragilidade e docilidade, podem reforçar um estereótipo nem sempre positivo. “Quando as mulheres fogem desse padrão, elas são consideradas como a nossa presidenta [Dilma Rousseff] foi por muito tempo quando ministra: como mulheres muito duras, como mulheres que não têm a capacidade de negociar, mas é justamente o contrário. É justamente pela sua resistência, pela sua capacidade de buscar seus objetivos, que as mulheres estão nessas posições.”

 

A professora da Universidade de Brasília (UnB) Liliane Machado, especialista em feminismo, disse que o pequeno percentual de mulheres no Congresso Nacional reflete o preconceito que ainda existe do eleitor na hora de votar. Ela acrescentou ainda que as próprias mulheres têm preconceito em relação ao gênero feminino. “Se a mulher, desde que nasce, ouve dizer que é inferior ao homem, ela projeta essa representação”, ressaltou a especialista.

 

Para Liliane Machado, a reserva de 30% do total de vagas para disputas eleitorais destinadas às mulheres é pequena. Segundo ela, os partidos políticos indicam a existência desse percentual para cumprir a lei. Porém, a especialista disse que, ao mesmo tempo em que isso ocorre, as legendas partidárias não injetam dinheiro suficiente nas campanhas das mulheres. “[Aí] então fica difícil [essas candidatas] se elegerem, pois cada vez mais as campanhas ficam caras e midiáticas”, disse.

 

A especialista da UnB defendeu uma reforma política urgente. Para ela, é fundamental mudar as regras no financiamento das campanhas das candidatas e buscar uma solução que resolva de forma definitiva a questão da minoria de mulheres – tanto como candidatas, como depois de eleitas.

 

Para a vereadora de Guarapuava Eva Schran, os homens não dão mais espaço às mulheres porque sabem que “somos muito capazes,” assegurou.

 

 

Foto: A vereadora Eva Schran: "Sou muito otimista"

Cristina Esteche

Jornalista

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