Nem só da reforma de estádios e ampliação de aeroportos é feita a preparação do Brasil para os eventos esportivos internacionais como a Copa das Confederações em 2013, a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Outro desafio que ocupa a atenção dos governos federal, estaduais e municipais das cidades-sede é o da mobilidade urbana, ou seja, o planejamento para que as pessoas, turistas e a população local possam se deslocar com tranquilidade pelas vias da cidade, usando o transporte público ou particular. Segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), serão 3,6 milhões de visitantes somente no ano da Copa. Para especialistas, o país não tem adotado políticas satisfatórias com relação ao trânsito para receber esse contingente de pessoas.
A preparação das 12 cidades-sede para os eventos no que diz respeito à mobilidade inclui ações como a execução de obras de infraestrutura viária; a implantação no Rio de Janeiro e Recife do sistema bus rapid transit (BRT), que consiste em corredores exclusivos para ônibus; a instalação do trem elétrico monotrilho em São Paulo e Manaus e do veículo leve sobre trilhos (VLT) em Brasília e Fortaleza; a integração de terminais de passageiros, entre outras medidas. No total, está previsto investimento de R$ 10,9 bilhões em recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Além do investimento em transporte coletivo e engenharia de tráfego, haverá a definição de uma logística para a circulação dos turistas e moradores das sedes durante os eventos, que ficará a cargo do Ministério da Justiça. O órgão criou comissões de Segurança Pública estaduais para tratar do assunto. Elas se reunirão, a partir deste mês, para discutir um plano de mobilidade urbana, a ser concluído até o fim de setembro.
Na avaliação de analistas, entretanto, tais iniciativas podem ser insuficientes para garantir um trânsito tranquilo durante os eventos. Além de um possível atraso na entrega das obras – no fim do ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) fez um alerta ao governo federal, pois somente 5% do valor destinado à mobilidade havia sido executado – eles apontam a inadequação do modelo de tráfego brasileiro à movimentação de pedestres, ciclistas e usuários de transporte coletivo.
Para Artur Morais, pesquisador em transporte na Universidade de Brasília (UnB), historicamente as políticas de trânsito no país privilegiam motoristas em detrimento de pedestres. “O modelo de mobilidade implantado em toda cidade brasileira é baseado no carro, do qual se vê um excesso nas ruas. Investe-se pouco em transporte público. Eu vejo as pessoas querendo fazer viadutos, alargar vias. Na verdade, o que poderia de fato ajudar seriam ciclovias, calçadas e um transporte coletivo melhor”, sugeriu.
O especialista em segurança de trânsito David Duarte, presidente do Instituto Brasileiro de Segurança no Trânsito (IST), faz análise semelhante. Ele destaca a insuficiência do transporte público das grandes cidades para a população local, e prevê um funcionamento ainda mais deficiente com a chegada dos visitantes. Para Duarte, as obras previstas para melhorar o transporte público não serão suficientes para dar conta da demanda aumentada. “Vai congestionar ainda mais. Vale lembrar que alguns desses visitantes, principalmente os que vêm da Europa, estão habituados a um transporte público de melhor qualidade e a um sistema que valoriza o pedestre e o ciclista”, alertou.
Um dispositivo que facilitou a vida de quem que precisa andar a pé no Brasil foi a obediência à faixa de pedestres, modelo segundo o qual o motorista freia para dar passagem a caminhantes e ciclistas desmontados. Instituído em caráter pioneiro em Brasília há 15 anos, hoje o sistema é copiado por algumas cidades brasileiras e considerado um marco no respeito ao pedestre. Para Celso Luiz Martins, autor do livro Código de Trânsito Brasileiro Comentado, trata-se de um avanço. “Nós ainda não somos ótimos, mas o Brasil melhorou muito no tratamento ao pedestre”, comenta.
Martins destaca, entretanto, que a faixa não é uma solução eficaz para as vias mais movimentadas de grandes metrópoles, nem resolve o problema do pedestre no país. “A travessia funciona onde não há grande fluxo de veículos. Em locais como as avenidas Paulista (São Paulo) ou Rio Branco (Rio de Janeiro) não vai ser bem-sucedida. Nesses casos, a forma de fazer os veículos pararem é instalar focos de pedestres [semáforo específico para quem anda a pé]”, disse. Ele defende campanhas educativas e maior preparo dos agentes fiscalizadores como principal maneira de mudar a realidade do trânsito no Brasil. “No nosso país, a mobilidade é prejudicada principalmente pelo comportamento”, ressaltou.
A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com as administrações de quatro das 12 cidades-sede da Copa de 2014 para saber mais detalhes sobre as ações de mobilidade urbana em suas localidades. A Secretaria Municipal de Transporte do Rio de Janeiro (SMTR) não deu retorno até o fechamento desta matéria, e o Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF), em Brasília, disse que apenas o governo federal poderia se pronunciar a respeito.
Amir Schvartz, titular da Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo em Recife, disse que os preparativos na capital pernambucana incluem a construção da Via Mangue, que deve melhorar o tráfego da zona sul da cidade; e dois corredores exclusivos de ônibus. A previsão é que as modificações fiquem prontas entre setembro e dezembro de 2013.
A Secretaria Especial de Articulação para a Copa em São Paulo informou que cinco obras viárias estão previstas para os arredores do estádio de Itaquera, onde ocorrerão os jogos. Além disso, está em curso um estudo de tecnologia para diminuir o período entre a chegada dos trens do metrô, possibilitando o transporte de um número maior de passageiros
Agência Brasil