22/08/2023
Saúde

Crianças e gestantes morrem em Guarapuava por falta de socorro

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A Sapolândia, uma das favelas mais antigas da cidade, é um retrato fiel da situação da saúde em Guarapuava, que carrega uma triste marca: é um dos municípios do Paraná com maior índice de mortalidade infantil. De acordo com dados oficiais, Guarapuava se apresenta com o índice de 19,3 mortes de crianças para cada 1.000 nascidas vivas. Fica acima da média da 5ª Regional de Saúde (18), onde estão municípios como Pinhão, Turvo, Cantagalo. E bem além de União da Vitória, cujo índice (de 6,8) situa-se abaixo da margem aconselhável pela Organização Mundial da Saúde.
Na Sapolândia, a poucos quilômetros do Centro, próximo ao Rio Cascavelzinho e a outras favelas conhecidas, como o Jardim das Américas, os moradores ou estão desempregados ou trabalham, em sua maioria, como catadores de papel. Por ali transitam trabalhadores com carrinhos do “Lixo Amigo” ou adolescentes com carroças puxadas a cavalo, também catadores de lixo.
O pequeno vilarejo é um depósito de lixo a céu aberto, com pilhas de papel, papelão, sucatas, miséria e desesperança. O que contrasta é o asfalto construído pela Prefeitura, em meio ao esgoto dentro e fora dos terrenos dos favelados, onde crianças (sem creches e sem escolas) brincam com naturalidade. Em dias de chuva, a água leva o esgoto para dentro das casas. Nos dias de calor, os moradores sofrem com infestação de moscas. No dia a dia, o esgoto do próprio local e de outras áreas passa pela Sapolândia e deságua no Rio Cascalvezinho, levando sujeira e doença para outras regiões da cidade.

SAÚDE NA UTI

Como a Sapolândia, mais de uma dezena de lugares assim contrasta com as flores do Centro, escancarando a cruel realidade de uma cidade onde 2.000 crianças estão sem creches, onde a alta mortalidade infantil revela que ainda não estamos prontos para o futuro. Em suma: a Saúde de Guarapuava está na UTI e clama por socorro.
A mortalidade infantil é o mais importante índice para avaliação da qualidade de um serviço público de saúde e da população como um todo, segundo a Organização Mundial de Saúde . Consiste no número de mortes de crianças até um ano de vida para cada 1000 nascidos vivos.
O fato é que o índice de Guarapuava (19,3) é um dos piores do Paraná. União da Vitória, por exemplo, conta com um índice de 6,8 ¬– muito menor que o de Guarapuava, embora represente região de IDH parecido. Outros municípios com perfil econômico equivalente também estão em situação bem mais vantajosa, caso de Francisco Beltrão (7,7), Cascavel (9,3) e Pato Branco (10,3).

 

Onde está o dinheiro que a Prefeitura deveria investir na Saúde?

A Prefeitura de Guarapuava movimenta milhões de reais na área de saúde, mas é inaceitável que tantos recursos não sejam suficientes para estancar ou diminuir a mortalidade infantil.
Só o Ministério da Saúde repassou ao município de Guarapuava R$ 7 milhões e 650 mil, entre dezembro de 2009 a agosto de 2010. É um valor muito grande, sem contar que o governo do Estado também envia dinheiro e o Município tem a obrigação de aplicar orçamento próprio. A questão é: como e onde são investidos esses recursos.
O problema não está apenas na falta de médicos e remédios nos postos de saúde. A sangria do dinheiro público, que visivelmente é mal investido, pode ser medida pelo quadro de miséria e doença que transborda na periferia da cidade. São crianças expostas ao esgoto, à desnutrição, e gestantes vítimas da mesma situação.
Especialistas consultados pela “Rede Sul” apontam que o grande número de mortes é porque a Prefeitura de Guarapuava não prioriza o social, a saúde preventiva e a qualidade do exame de pré-natal. Um quarto das gestantes são adolescentes em situação de risco social. A maior parte das crianças morre depois da alta hospitalar. O Município carece de profissionais de saúde, sem uma política que valorize os servidores. Há salários achatados, falta de um plano de cargos e salários, valorização dos cargos comissionados em detrimento aos de carreira. O concurso público, que deveria ter sido realizado neste ano, foi cancelado a mando da Justiça com sérias evidências de fraudes (16.000 pessoas foram lesadas).

PROMESSA NÃO CUMPRIDA

O prefeito Fernando Ribas Carli foi reeleito em 2008 prometendo diversos projetos na saúde, incluindo o Pronto Socorro Infantil. Mas nem em áreas indispensáveis, como a de especialidades, sua Administração consegue dar conta. Pacientes sofrem em filas intermináveis para cirurgias eletivas como as de hérnia amigdalas, varizes e cirurgias ginecológicas, oftalmológicas e outras.
O desaparelhamento dos Projetos de Saúde da Família (prevenção) resulta em aumento do fluxo da população nos Postos 24 Horas, que são paliativos, não resolvem os problemas e não são integrados aos hospitais. Como o Município recusou-se adotar a Gestão Plena de Saúde, prejudicando a saúde integral da população, a Saúde Municipal permanece dissociada dos hospitais, que detêm os serviços de média e alta complexidade.
Esse quadro desolador corre em velocidade descontrolada pelos bairros pobres de Guarapuava. O asfalto que ali está, mais parece uma via pavimentada para as doenças, matando crianças e gestantes sem a menor chance de defesa.

Cristina Esteche

Jornalista

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