22/08/2023

De vice à protagonista da eleição: a relevância de Marina Silva

Recebi do professor de política da USP, Glauco Peres da Silva e compartilho:

De vice à protagonista da eleição: a relevância de Marina Silva

Ainda muitos surpresos e tristes pelo trágico acidente envolvendo o candidato a presidência, Eduardo Campos, o PSB e seus aliados precisam correr para decidir qual posicionamento nesta disputa eleitoral. Todas as atenções se voltam para estes atores que assumem protagonismo indiscutível. As estratégias dos demais candidatos dependerão de suas ações nos próximos dias. Evidentemente, é muito temerário afirmar o que acontecerá, mas é possível pensarmos as decisões que se colocam e os aspectos envolvidos em cada uma delas. As previsões são impossíveis, mas é possível apontar qual o cenário de tomada de decisão para os principais atores envolvidos. Vamos a ele.

A primeira decisão cabe a Marina Silva. Ela precisa decidir se aceita ser cabeça na chapa do PSB. Essa decisão não é imediata, nem simples. É preciso lembrar que ela se filiou ao PSB em um acordo com Eduardo Campos, e não com seu partido, no sentido amplo, em razão da inviabilidade de seu próprio partido, o Rede, em participar desta campanha. Foi uma decisão pragmática de uma pessoa em que a questão ideológica parece ser bastante preponderante em suas decisões de carreira. É uma oportunidade ímpar que o destino colocou diante dela e somente ela sabe o quanto pode custar bancar-se sair candidata por um partido que não é aquele com que se identifica ideologicamente. Muitas outras decisões pragmáticas precisarão ser tomadas, imagino que ela saída disso e é preciso saber se ela está disposta a toma-las.

Concomitantemente, o PSB precisa decidir quem será o seu candidato ou mesmo se desistirá de disputar esta eleição. O exposto no parágrafo acima é relevante na compreensão da importância da decisão que cabe ao PSB. Marina não é um nome do partido e sofre resistência, como ficou sugerido quando da sua filiação no final do ano passado. Líderes do partido, como os governadores do Amapá, Camilo Capiberibe, e do Espírito Santo, Renato Casagrande, manifestaram-se contrários à entrada de Marina e seu grupo no PSB, o que foi bancado por Campos. Por outro lado, pesa a favor do nome de Marina Silva a ausência de um nome de peso seja dentro do partido, que já não conta mais com Ciro Gomes ou seu irmão Cid Gomes, nem entre os partidos aliados do PSB (PPS, PHS, PRP e PPL). Escolher um outro nome é correr o risco de ter uma participação irrelevante nesta campanha, principalmente quando se considera o recall da eleição de 2010 de Marina Silva, quando recebeu cerca de 18 milhões de votos. É um nome conhecido que tem muitas chances de concorrer de fato. O problema é o PSB rachar e parte de sua máquina partidária não trabalhar na campanha de Marina como seria possível. Esse é um risco que o partido precisa deixar bem ajustado para não correr. As lideranças do partido, agora sem a figura de Eduardo Campos, precisarão coordenar as suas bases formando um grupo que atue em conjunto. Neste sentido, uma outra dificuldade que tanto PSB quanto Marina terão de enfrentar nesse momento é que a escolha dela como candidata pode implicar em impactos desconhecidos sobre as alianças que o PSB fez nos estados para as eleições de governador. O caso emblemático é o de São Paulo, onde o PSB apoia o PSDB, mesmo com Marina sendo publicamente contrária. Se ela seria capaz de subir no palanque de Alckmin ou costurar algum outro acordo é fator fundamental neste contexto, o que pode levar a divisão interna do PSB ou à inviabilização de seu nome.

Além disto, é de se imaginar que tanto PT quanto PSDB trabalharão para que o PSB deixe de lado a ideia de lançar um candidato e apoie um deles. Para PT e PSDB, a concorrência com Marina Silva é não só uma novidade indesejada pela incerteza que provoca, como propicia uma candidatura que parte um patamar de intenções de voto que Eduardo Campos não atingiu até a última pesquisa. O gráfico apresentado pela Folha de São Paulo a seguir é ilustrativo deste ponto:

 

Assumindo o gráfico acima como a melhor informação que temos até o momento, o segundo turno é praticamente certo, mas sem sabermos quem participaria. O que parece claro se o cenário for o indicado pelo gráfico é que Aécio Neves estaria agora disputando com Marina um lugar no segundo turno e teria, assim, de desviar o foco de sua campanha. Para Dilma, é de se imaginar que o segundo turno contra Marina seria muito pior do que contra Aécio. O voto da esquerda e todo o voto de protesto contra o PT encontraria na nova candidata uma possibilidade de aglutinação que o PSDB parece não conseguir. Ou seja, tanto Dilma quanto Aécio estariam agora em uma situação bastante pior do que aquela existente com uma candidatura de Eduardo Campos que ainda não havia decolado.

Indo adiante e assumindo o quadro mais positivo, em que tanto PSB, quanto Marina, entram em acordo quanto a seu nome como candidata pelo partido, as especulações começam sobre quem ganha e perde nas intenções de voto. E este é o ponto mais difícil de se analisar, evidentemente. O nome de Marina Silva tende a roubar votos dos outros dois candidatos, mas pode perder parte dos votos que estavam com Campos. É esta incerteza que impede qualquer prognóstico sobre intenções de voto. Ela roubaria votos de Dilma em razão de seu passado como militante dentro do PT e sua dissidência por questões de princípios, segundo ela própria, além das elevadíssimas taxas de rejeição da candidata petista. Ela também roubaria os votos que hoje vão para Aécio de eleitores que estão insatisfeitos com o governo. Parte desses eleitores tem se manifestado por mudanças e o nome de Marina Silva poderia agradar. Há ainda os eleitores evangélicos que podem apoia-la. A mudança de candidato de Campos para Marina é esperada que provoque alguma perda de eleitores. No geral, o esperado é que na primeira intenção de voto Marina apresente um percentual superior àquele que Campos tinha obtido até o momento, inclusive pelo aspecto da comoção que envolve o episódio.

Até o dia 23, o PSB precisará se posicionar oficialmente. Os holofotes estão todos virados para eles. As discussões políticas a partir de agora dependem dos desdobramentos dessas conversas entre PSB e Marina Silva. Se a Democracia é morna, um episódio como esse é o que incendeia qualquer disputa eleitoral e a torna imprevisível.

 

*Glauco Peres da Silva: Economista, pesquisador e palestrante, formado pela USP, tem doutorado em Administração Pública e Governo pela FGV-SP, com estágio doutoral no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Foi coordenador de graduação dos cursos de Economia e Relações Internacionais da FECAP por sete anos. Atualmente, é professor de Ciência Política da Universidade de São Paulo

Cristina Esteche

Jornalista

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