Da Redação, com Agência Brasil
São Paulo – No dia 11 de julho de 1987, a população mundial chegou a 5 bilhões de pessoas. O marco histórico motivou o Conselho Diretor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) a criar, dois anos depois, o Dia Mundial da População (World Population Day). A data, lembrada hoje (11), chama a atenção internacional para a gravidade das questões populacionais.
O tema deste ano, "Planejamento Familiar: Empoderando Pessoas, Nações em Desenvolvimento" (Family Planning: Empowering People, Developing Nations), destaca a importância do acesso a métodos seguros de contracepção, pois cerca de 225 milhões de mulheres em países em desenvolvimento fazem uso incorreto ou não contínuo de métodos para evitar a gravidez, segundo dados da Federação Internacional de Planejamento Familiar/Região do Hemisfério Ocidental (IPPF/RHO).
Além de ser fundamental para o estabelecimento de igualdade de gênero e empoderamento feminino, o controle da fertilidade reduz a mortalidade materna e infantil e é um fator econômico de grande impacto na redução da pobreza, como defende a socióloga Jaqueline Pitanguy. “Quando as mulheres planejam a sua reprodução, tendo acesso a meios seguros de contracepção, há a possibilidade de escolhas de acordo com projetos de vida e orçamento”, avalia.
A socióloga destaca que o Brasil passa por um momento de “bônus demográfico”, com uma taxa de natalidade baixa, de 1.8, e, ao mesmo tempo, uma parcela grande da população está na idade produtiva. “Esses fatores estão diretamente ligados a um projeto de desenvolvimento do país. É uma estratégia de desenvolvimento”, explica Pitanguy.
A especialista lidera a organização não governamental Cepia – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação – que, em parceria com a IPPF/RHO, divulgou, este ano, uma pesquisa inédita sobre o tema. O estudo mostra que o Brasil tem o pior desempenho em educação sexual, quando comparado a outros quatro países latino-americanos: México, Argentina, Colômbia e Chile.
Intitulada Barômetro Latino-Americano sobre o Acesso das Mulheres a Métodos Contraceptivos Modernos, a pesquisa avalia fatores como o desenvolvimento de políticas e estratégias; a sensibilização geral sobre saúde e os direitos reprodutivos; bem como a educação integral de saúde e direitos sexuais e reprodutivos. Entre os itens observados, estão também a educação e o treinamento dos profissionais dos serviços de saúde; a prestação de aconselhamento individual e serviços de qualidade; a existência de planos de reembolso; a prevenção à discriminação e o empoderamento das mulheres por meio do acesso aos contraceptivos. A pesquisa foi feita no fim de 2015 e ouviu 20 especialistas de cada país, dos setores público e privado.
Na avaliação de Pitanguy, a situação do Brasil é influenciada por questões culturais e religiosas. “A religião está se transformando em uma força política capaz de influenciar e barrar leis, de afetar programas de saúde e imbuir profissionais de princípios que os afastam do que eles deveriam cumprir em um Estado laico.”
No entanto, a pesquisadora aponta como positivas a qualidade das normas e orientações brasileiras, bem como a oferta gratuita de métodos pelo Serviço Público de Saúde. Atualmente, segundo o Ministério da Saúde, são disponibilizados para a população preservativo masculino e feminino, pílula combinada, anticoncepcional injetável mensal e trimestral, dispositivo intrauterino com cobre (DIU T Cu), diafragma, anticoncepção de emergência e minipílula.
ESCOLHENDO O MÉTODO
A escolha do método contraceptivo deve ser feita conjuntamente com o médico, considerando as particularidades de cada mulher e respeitando as indicações, alerta a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) . Para quem não pode usar os métodos hormonais, há ainda os de barreira (preservativo, diafragma, DIU de Cobre), os métodos naturais (coito interrompido, tabelinha, métodos de observação da fertilidade) e os definitivos ou cirúrgicos (vasectomia ou laqueadura).
Aos 19 anos, a estudante Bárbara Dourado sentiu-se repentinamente estressada e notou o surgimento manchas roxas na pele. À noite, uma sensação de queimação tomou conta dos membros inferiores. O problema se agravava com o tempo. As dores tornaram-se quase insuportáveis e pouco cediam com o uso de analgésicos. Depois da consulta médica, o diagnóstico: efeitos colaterais da pílula do dia seguinte. Dois anos depois, ela ainda sente dores. Por causa disso, deverá passar por uma cirurgia para reparar os danos que sofreu em uma das artérias da perna esquerda pelo excesso de hormônios na corrente sanguínea.
A médica Carla Martins, membro da Febrasgo e diretora da clínica FertilCare pondera que todos os métodos contraceptivos, hormonais e não hormonais, têm efeitos colaterais. “Não há método ideal, 100% inócuo ou eficaz, totalmente acessível e fácil, o que a gente pode fazer é minimizar os riscos.”
Uma página nas redes sociais chamada Vítimas de Anticoncepcionais. Unidas a Favor da Vida já reúne quase 140 mil seguidores que trocam depoimentos, informações e solidariedade em muitos casos semelhantes ao de Bárbara. Estudos e pesquisas feitos sobre os efeitos do uso dos hormônios sintéticos no mundo embasam a opinião do grupo.
Eles apontam que as pílulas afetam a qualidade de vida, as funções cerebrais, podem causardepressão, falta de desejo sexual, câncer de ovário, tromboembolismo, acidente vascular cerebral, trombose e infarto do miocárdio. Outro fato recente reacendeu os debates acerca do uso dos anticoncepcionais, ao ser descartada a viabilidade da “pílula masculina” devido aos severos efeitos colaterais.
A médica, porém, se diz contra a disseminação de ideias que desaconselham os métodos hormonais. “Parece que os mitos são mais fortes que a verdade científica. Pílula dá trombose, mas, se você engravidar, tem 30 vezes mais chances de desenvolver trombose do que com a pílula”, explica.
A especialista afirma que a pílula não deve ser a primeira opção para as mulheres que querem evitar a gravidez. De acordo com ela, a recomendação mundial é que os métodos de longa duração reversíveis (DIU de Cobre ou implante subdérmico) sejam os principais indicados para qualquer paciente, principalmente para as adolescentes, que apresentam falhas no uso das pílulas diárias e do preservativo.
Além do DIU de Cobre, outra alternativa para quem quer evitar os usos de hormônios são os métodos de barreira (preservativo masculino e feminino e o diafragma). Para quem busca uma solução definitiva, há os cirúrgicos: vasectomia ou laqueadura.
Mas evitar a gravidez sem o uso de nenhum desses artifícios também é possível. O coito interrompido e a tabelinha são exemplos. Há também os métodos de observação da fertilidade (muco cervical, temperatura basal, Billings, Arborização ou teste de ovulação de microscópio com saliva, sintotérmico, Ogino-Knaus) que se baseiam no reconhecimento do período fértil, em que são evitadas as relações sexuais. No entanto, tais métodos não trazem proteção contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e esbarram em dificuldades como irregularidades no ciclo menstrual, no pós-parto e no período de amamentação.