A Cadeia de Guarapuava, fundada em outubro de 1983, teve projeto elaborado para abrigar 166 presos temporários. Entretanto, com o passar dos anos e a falta de investimentos no sistema carcerário, o cadeião hoje abriga em média, 460 presos. Pelo menos 200 deles já têm condenação definida, mas não têm vagas em unidades apropriadas para cumprir a pena. Nesta semana o Portal RSN, pela primeira vez, entrou nas dependências do cadeião e pode constatar a realidade do trabalho diário dos guardas prisionais e a rotina do cadeião.
Sentimento algum é o que parece imperar da porta pra dentro de uma unidade prisional, ou pelo menos, do cadeião de Guarapuava, a maior cadeia em número de presos do Estado do Paraná. Todos que estão ali pagam por diversos crimes e escolhas feitas. Muitos, provavelmente, pagam também pela absoluta falta de opção ou até pela falta de referência que nunca tiveram.
Não se trata de defendê-los. Mas numa sociedade como a nossa, é sempre bom lembrar que somos “produtos” e portanto consequência, do meio em que vivemos. As oportunidades não são iguais para todos. A primeira imagem que se tem, quando passa a porta da carceragem é da antiga ala feminina. As mulheres foram transferidas para Pitanga.
Ao lado da entrada da galeria antiga, há o chamado ‘corró’ onde ficam os detentos recém chegados. Ali permanecem por 10 dias para evitar a entrada de presos com covid-19. O gestor da cadeia, Wellington Rodrigo de Oliveira, destaca que a prioridade, desde que assumiu a unidade é o respeito.
Eles entenderam que eu sou justo, minha obrigação é cobrar o cumprimento dos deveres de cada um, de maneira que, como seres humanos, também possuem direitos. Eu sempre prezei por isso: justiça e respeito.
O clima entre os guardas prisionais, apesar do ambiente pesado e, naturalmente, tenso é de “time”. A tensão não dá espaço para falta de risos e brincadeiras. O gestor reconheceu a dedicação de cada um nas funções estabelecidas.
Se falta um, o trabalho falha, pois cada um tem um papel fundamental, e todos, sem excessão, têm trabalhado pelo melhor, diariamente. É um trabalho árduo, que nos traz resultado a longo prazo, mas satisfatório quando a equipe se dedica, se respeita e se ajuda, e esse é o caso de todos os guardas prisionais aqui na cadeia.
São mais de mil metros quadrados, silenciosos. E por mais que a maioria das pessoas imaginem muita gritaria, brigas, discussões, não é bem assim. Há respeito, existe alguma gentileza. O calor é intenso. Próximo a porta de acesso da ala antiga, o gestor orienta os detentos. “Vou trazer uma mulher aqui”. Um dos presos então avisa: “Todo mundo coloca camisa, tem uma mulher aqui, e pergunta: Ela quem vai fazer a reforma?”. Por cima da passarela na ala “nova”, é possível ver pouco da rotina de alguns deles.
LUTA POR REFORMA
Ao todo são 32 cubículos, incluindo as duas galerias, cada um com quatro camas, em média 15 metros quadrados cada cela. Dessa maneira, seriam necessárias mais 294 camas para abrigar “decentemente”, os 460 detentos, que em média estão recolhidos na unidade. O projeto da estrutura, fundada em 1983, viabilizava 166 camas. Colchões são colocados no corredor da ala velha para que todos os presos possam dormir.
A luta pela reforma da unidade prisional é pauta diária nos corredores. A ala reformada, que foi finalizada em 2019, é mais arejada, além disso, oferece mais segurança também para a população. Conforme as informações, a única demanda ainda pendente deste lado da cadeia é a pintura.
Precisamos reformar a outra galeria. Esta parte nova, tem uma parede extra o que dificulta as fugas. A passarela colocada por cima do corredor extra, dá mais segurança aos guardas prisionais, além de mais rapidez na movimentação e controle dos detentos.
Enquanto é aguardada a possibilidade da nova estrutura, o Departamento Penitenciário tem investido em melhorias. Desse modo, o chefe de cadeias públicas da 3ª Regional do Depen, Rodrigo Alves Fávaro, explicou que atualmente está em obras uma sala de aula.
Neste momento estamos construindo um ambiente escolar, uma sala de aula, onde os detentos, poderão estudar. O local, será dividido em duas partes para atender a demanda dos diferentes níveis de escolaridade dos detentos. Além disso, também estamos providenciando um local mais apropriado para abrigar a parte da administração.
SEGURANÇA
Ainda de acordo com Fávaro, o efetivo de guardas prisionais, por ora, atende a demanda. Entretanto, o número está aquém dos outros estabelecimentos carcerários de Guarapuava. “Aqui não temos agentes penitenciários, apenas guardas prisionais. Seria essencial o apoio da Polícia Militar, pelo menos durante o banho de sol, pela área externa, enquanto não contamos com efetivo de guardas”. O local é monitorado por câmeras de segurança em pontos estratégicos.
Além disso, como medida de segurança, uma reclusa para recebimento de presos foi viabilizada. O local também é disponibilizado para a entrada das marmitas dos detentos. Depois de entrarem na unidade prisional, por esta reclusa, os presos passam pelo detector de metais, e depois por um scanner.
A unidade conta com dois scanners, um para pessoas e um para produtos.
PANDEMIA
O sistema carcerário também foi afetado pela pandemia de covid-19. Embora, o cadeião de Guarapuava não tenha casos confirmados da doença, a rotina foi alterada com a suspensão das visitas. Por isso, as famílias enviam ‘sacolas’ via Sedex. Fávaro explicou que isso mudou no dia-a-dia da unidade.
“Com a pandemia tivemos um aumento significativo no número de arremessos ao solário. A tentativa de ingressar esses objetos no estabelecimento prisional ocorria por meio de visitas, que agora, estão suspensas”.
Dessa maneira, para garantir a procedência dos produtos enviados pelas famílias, é preciso anexar ao pacote uma cédula de identidade. Além disso, as encomendas são abertas, apenas, 48h depois da entrega, por conta da covid-19.
Por fim, é evidente que a unidade prisional demanda atenção. Neste ano, sete detentos já morreram dentro do estabelecimento prisional.
Além disso, novembro teve recorde de tentativas de fuga em 30 dias. Porém, das 13 situações, os guardas prisionais conseguiram frustrar 12 fugas. A única fuga exitosa ainda teve desdobramentos, uma vez que depois de fugirem da unidade prisional, os detentos participaram de um assalto no distrito da Palmeirinha, em Guarapuava.
Um dos presos que conseguiu fugir neste ano, tinha um longo histórico de sucesso em fugas. Isso porque, quando fugiu da Cadeia de Guarapuava, em 6 de novembro, foi informado que seria a 9ª vez que ele teve êxito em fugir de unidades prisionais do PR. Ele acabou sendo morto em um confronto com a Polícia Militar nessa terça (8).
Por fim, ao ser questionado sobre o comportamento dos presos, Wellington, o gestor, foi enfático. “Geralmente quem comete homicídio, é alguém que age de momento. Chega aqui, e vê tudo o que perdeu” – Você considera então que a cadeia é uma reflexão pra essas pessoas?
A cadeia é uma reflexão PARA MIM há 18 anos.
Outras imagens e “realidades” serão divulgadas em outras reportagens.
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