22/08/2023
Política

Fábrica de tênis da Prefeitura está fechada

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Salários atrasados, 13° para receber, descaso por parte dos sócios, portas fechadas, portões cadeados e o mato tomando conta do terreno. Esta é a situação da Fábrica de Tênis da Prefeitura localizada no Bairro Industrial Guaratu em Guarapuava.

De acordo com informações de funcionários, a produção está parada há cerca de 7 meses, após a confecções de pares de tênis que foram entregues a alunos das escolas municipais. Parte da produção foi vendida para municípios paranaenses. De lá para cá, está tudo parado. "Não recebemos nenhuma satisfação por parte dos dois sócios. Um joga para a outro", diz um funcionário que foi comvocado para uma reunião que aconteceria ontem, terça-feira (11) e que acabou não acontecendo. Ele chegou na Fábrica e encontrou os portões cadeados. A reunião foi transferida para esta quarta-feira (12) no mesmo horário, segundo informou um empresário que é sócio da fábrica e que pediu para não ser identificado. Ele garantiu que na próxima semana quando tudo "estiver resolvido" vai explicar o que aconteceu. De acordo com o sócio, a sua parte societária está sendo vendida para um empresário do ramo caçadista de Curitiba. "Ele viria para essa reunião, mas adiou para hoje quando vai explicar tudo para os funcionários e ainda ampliar e contratar mais. Ele tem entrada no mercado nacional, o que não acontece comigo", afirmou à RSN. Disse também que o possível novo sócio vai possibilitar a abertura de novas facções e alavancar o pólo calçadista alardeado pelo prefeito Fernando Ribas Carli na campanha eleitoral de 2008.

O que chama a atenção é que no local existe uma placa divulgando que o local é uma unidade do projeto "Escola do Trabalho" desenvolvido pela Prefeitura. Mas como existe um empresário do ramo da construção civil que é sócio da fábrica? Vale lembrar também que todo o maquinário existente no local foi comprado com dinheiro público. Então como está sendo explorado empresarialmente? Questionado sobre o assunto o empresário disse que não "gostaria de falar sobre isso".

A situação da "fábrica de tênis" é complicada. "Tem famílias passando dificuldades. Você já imaginou passar o Natal sem um centavo no bolso? Sem saber oque vai acontecer, pois não falam nada. Só ficam jogando um para o outro?", diz outro funcionário.

"Quando vi que a coisa estava ficando feia, há uns quatro meses atrás, fui trabahar numa oficina mecânica. Mas tem gente na pior. Na semana passada um rapaz que trabalhava na fábrica com a gente morreu por falta de remédio. O nome dele era Eliton, mas a gente chamava ele de Gordinho. Ele tomava remédio e não teve dinheiro pra comprar. Acabou morrendo", denuncia.

"Só lembraram da gente poucos dias antes das eleições quando chamaram a gente pra uma reunião e um churrasco. O filho do prefeito (Bernardo) veio aqui, deu uma palestra, prometeu que as coisas iam melhorar, pediu votos e foi embora. Nem o churrasco prometido nós ganhamos", conta.

Após muita pressão, os funcionários receberem o equivalente a um salário mínimo (valor que recebem mensalmente para prioduzir os tênis). "Acho que foi em outubro e depois não recebemos mais nada", diz o funcionário que hoje trabalha como mecânico. "Eu já poderia estar fichado, mas a minha situaão está amarrada aqui. Não liberam a minha carteira (de trabalho) e sabemos que nem o fundo de garantia está depositado", diz.

ENTENDA O CASO

A Fábrica de Tênis da Prefeitura" sempre enfrentou dificuldades desde a sua implantação. Funcionou por alguns meses com a participação de apenas uma empresa, a Somar Calçados, cujo sócio, Antonio Vieira da Silva, foi trazido do município de Nova Serrana (MG). A intenção era capacitar mão-de-obra para fomentar a possível criação de facções para a fabricação de tênis. Missões técnicas foram realizadas com empresários até Nova Serrana. Além de contratar a empresa mineira, a Prefeitura alugou um barracão no Distrito Industrial Guaratu, que deveria funcionar como “embrião” gerando novas indústrias no setor.
Além de não criar a segmentação, a Somar fechou as portas em 2009, no primeiro ano do segundo mandato de Fernando Carli. Em vez do início de um “polo calçadista”, o que se viu foi exatamente o contrário, tornando os pesados investimentos da Prefeitura completamente nulos.
A pequena indústria, longe de ser um “polo”, tinha como único cliente a própria Prefeitura. A Rede Sul ligou para o telefone da fábrica (3624 6472), mas a mensagem à época era de que o número não existia.

Para trazer o “know-how” do município mineiro de Nova Serrana, conhecida como a capital nacional do tênis Toninho ganhou vantagens e a principal delas, além do sócio de Guarapuava, foi o investimento de cerca de R$ 800 mil, dinheiro que saiu dos cofres municipais para a compra do maquinário. A informação foi dada em 2009 à RSN pelo próprio Toninho. Esse parque de máquinas foi cedido pela Prefeitura ao empresário em regime de comodato por 10 anos. Em contrapartida, caberia à empresa apenas a responsabilidade de capacitar a mão-de-obra que, em muitos casos, é absorvida pela própria fábrica. A produção diária é vendida e o recurso é dos empresários. “A fábrica é uma empresa e a venda é nossa”, confirma Toninho. Numa das últimas entrevistas feitas pela RSN sobre esse tema em novembro de 2007, o secretário Mauro Claudio Temosckho anunciava que a “Fábrica da Prefeitura” forneceria a matéria-prima elaborada para as facções que seriam montadas por interessados. “ Ela (fábrica) não vai fazer todos os componentes do tênis, mas partes que são de suma importância para a fabricação do produto como a sola, porque temos a máquina injetora. Então pequenas fábricas não precisam ter a injetora, que é máquina muito cara, mas podem fazer o resto e comprar a sola. Essa é uma maneira que encontramos para viabilizar as pequenas empresas”, afirmou.

Em abril de 2009, quatro meses depois de Fernando Carli ser reeleito, porém, a fabriqueta deu férias coletivas aos 30 funcionários e parou de funcionar.

“Foi o reflexo da crise que nos fez dar férias coletivas para os funcionários, mas a fábrica está funcionando e volta a abrir daqui uns dias”, informou Toninho na ocasião. Com 30 funcionários a produção diária era de 500 pares. Segundo Toninho, a crise que afetou o setor calçadista nacional e que derrubou a produção brasileira em 50%, retraiu os empresários locais interessados em investir no setor. Para se ter uma idéia da crise o empresário cita o exemplo de Nova Serrana cuja produção diária que era de 450 mil pares por dia caiu para 200 mil à época. Nada disso, porém, mereceu divulgação oficial. No site oficial da Prefeitura, a última notícia sobre o assunto data de 28 de março de 2008 e comentava sobre um curso em parceria com o Sebrae para qualificação de mão-de-obra.
Em maio de 2010, ano eleitoral, a Prefeitura abre nova licitação e quem vence é uma outra empresa que, segundo empresário de Guarapuava que investiu no setor, terceirizou as atividades para a Somar. A empresa fabricou os tênis que foram distribuídos a estudantes da rede municipal de ensino e novamente parou de parou de funcionar.

Cristina Esteche

Jornalista

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