22/08/2023
Brasil Cotidiano Guarapuava

Madeira extraída em Guarapuava contribuiu na construção de Brasília

Um 'time' de 14 guarapuavanos, durante três anos, na década de 50, transportou madeira em caminhões FNM até o Planalto Central

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Rumo à Brasília (Foto: Acervo de Sid Bernardini)

A capital dos brasileiros, Brasília, comemorou 61 anos nessa quarta (21), marco da transferência da capital do Rio de Janeiro para o Centro do país. Entretanto, a construção da cidade começou a ganhar forma em 1957. Nesse ano, nortistas e nordestino, na maioria, chegaram naquela que seria a futura capital do Brasil. De acordo com o censo daquele ano, 256 trabalhadores compunham os primeiros migrantes. Eram os primeiros ‘candangos’, como ficaram conhecidos os pioneiros. Eles chegavam atraídos pela possibilidade de um novo começo e novas oportunidades. Assim, saíam da terra natal com uma mala e pouquíssimo dinheiro.

Caminhão leva operários para construir a futura capital, em 1958. (Foto: Mário Fontenelle/Arquivo Público do DF)

Às vezes nem isso, só com a roupa do corpo lotavam a carroceria dos caminhões para viajar 45 dias em estradas precárias, de terra batida. O destino final era o local demarcado para a construção de Brasília, onde só havia mato e poeira.

TINHA GUARAPUAVANO

Entretanto, em meio a essa massa humana, um ano depois, guarapuavanos também estavam lá. Era abril de 1956, quando um comboio de 10 caminhões FNM, ou Alfa Romeu, saiu de Guarapuava com destino ao Planalto Central. Lá no longínquo estado de Goiás, o presidente Jucelino Kubitschek, ‘plantava’ a nova capital do País’. E o que pouca gente sabe é que guarapuavanos levavam madeira extraída das serrarias do Grupo Slaviero em Guarapuava.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

Entre eles estava Sid Bernardini, então com 17 anos. Apesar da pouca idade, ele já assumia a ‘boleia’ de um dos pesados caminhões. Agora, com 81 anos, ele sempre conta aos netos as aventuras que viveu durante três anos, nas dezenas de viagens que fez. Assim, entre tantas, tem uma que ele nunca esquece. “Uma vez encontramos perto de Goiás, uma boiada enorme. Acho que mais de mil animais. E aí tivemos que tocar bem devagarinho os caminhões, pois não tinha como ‘podar’ a tropa. Perdemos umas três horas de viagem”.

Sid Bernardini com esposa Leocádia e a neta Ana Beatriz (Foto: Acervo da família)

MEMÓRIA VIVA

De acordo com ‘memórias’ contadas por Sid Bernardini ao jornalista Guaracy de Almeida Ribas, um “time” com 14 integrantes partia do Terceiro Planalto paranaense. Era abril de 1956 e o início de dias e dias de viagem. Porém, ninguém deixava de ver os pinheiros de Guarapuava sem tirar uma foto em cima do caminhão.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

Conforme Guaracy, na hora do almoço, o grupo se reunia para degustar a bóia. “Muito charque, carne na lata de banha, mortadela com pão caseiro e outras delícias da terrinha. Quando chovia o encerado cobria a carga. A mercadoria tinha que chegar em boas condições depois de 10 dias de viagem. Cada caminhão levava em torno de 60 dúzias de tábua”.

Dessa maneira, cortando o ‘estradão’, enfrentando sol e chuva, a cabine do velho FNM se transformava na ‘casa’ dos motoristas durante as longas viagem de ida e volta. “O espelho do retrovisor lateral do caminhão servia para fazer a barba”.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

Depois a viagem seguia. “Borracharia na beira da estrada. Muita pedra e muitos buracos judiavam dos pneus. Uma estrutura dessas era importante para os caminhoneiros”. Entretanto, logo à frente, um novo desafio. A Ponte Pênsil, de madeira, na divisa do Paraná com São Paulo. “Na primeira viagem, todos ficaram durante cinco horas discutindo se a ponte resistiria ao peso da carga. O primeiro que passou foi um baiano que estava no comboio. Abriu caminho”.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

CORTANDO A ESTRADA

E a aventura continuava. Os caminhoneiros tomavam banho de rio. Afinal, a poeira das estradas era companheira durante todo o trajeto. Asfalto não existia. Mas enfim, a chegada. “Dia histórico, a chegada da primeira carga ao cerrado goiano. Ali a carga foi descarregada para instalar o depósito de madeira. Os caminhões faziam manobras para amassar a vegetação (cerradinho) e aplainar o terreno”. Assim, com caminhões vazios, a missão estava cumprida. Todavia, uma foto antes de retornarem a Guarapuava.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

DUREZA

A construção de Brasília sintetizou o projeto de JK e a busca pela modernização do país. O historiador Thomas Skidmore sugere que a construção também foi utilizada como distração para os problemas do governo e tirou os olhos da nação do que existia no país, como a questão da inflação, a falta de vagas nas universidades e as reivindicações por reforma agrária.

Retirantes chegam para trabalhar na construção da nova capital, em janeiro de 1959. (Foto: Arquivo Público do DF)

O trabalho de quem construiu a ‘capital política’ do País era duro. Os acidentes de trabalho ocorriam com frequência. Muitos trabalhadores morreram, entre eles dois operários soterrados durante a construção da Universidade de Brasília. Todavia, até hoje não se sabe exatamente quanto foi gasto na construção. Porém,  estudos sugerem que o valor chegou aos bilhões de dólares em valores atuais.

(Foto: Acervo de Sid Bernardini)

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Cristina Esteche

Jornalista

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