Às 19h30 de quinta feira um grupo de amigos se reúne num tradicional pub de Guarapuava e pede aquela que consideram a melhor cerveja do País. Ao ser servida, a uma temperatura de -4°C, o copo transpira na ação física do frio da bebida com o calor ambiente e do vidro do copo.
Após os primeiros goles e o tradicional “ahhhhhhhhhh”, os amigos rasgam elogios para a bebida. E logo fazem análises da sua composição através do rótulo da garrafa e descobrem que é fabricada em Petrópolis, cidade do Rio de Janeiro muito conhecida pela indústria cervejeira.
Porém, um detalhe passa batido nas informações do rótulo: o malte, um dos principais ingredientes para a fabricação da cerveja, utilizado naquela marca, é produzido pela Cooperativa Agrária, em Entre Rios, Guarapuava.
CEVADA
Mas o caminho para se chegar ao malte de qualidade foi longo e necessitou de muito investimento, paciência e perseverança dos produtores. As primeiras plantações de cevada foram incentivadas pela Cooperativa Agrária no distrito de Entre Rios em 1973. Naquele ano, os produtores que apostaram na novidade atingiram a produtividade média de 1,5 tonelada por hectare.
O produtor Ernest Milla, que reside na Colônia Vitória, aponta o surgimento da indústria cervejeira como o grande salto para a cultura da cevada em Guarapuava. “Até chegar a indústria cervejeira nós plantávamos, antes de 1973, cevada para usar como ração para o gado. Com a chegada da indústria, que trouxe a cultivar A1, nós passamos a profissionalizar o cultivo e a produtividade saltou para cerca de 2,5 toneladas por ano”, explicou.
A família de Milla plantou este ano (2013) 1.400 hectares com cevada. “A garantia de mercado, que foi uma conquista dos cooperados da Agrária que lutaram para ter a Agromalte, é o principal fator que nos leva a investir nesta cultura de inverno. Nos últimos 10 anos, entre cevada, trigo e aveia, a cevada teve mais benefícios entre as três culturas de inverno. Ainda temos muito a evoluir na questão de genética, mas estamos no caminho certo e a cultura tem apresentado ótimos resultados aos produtores”, disse Milla.
COLHEITA EM TRÊS SEMANAS
De acordo com Noemir Antoniozzi, responsável pelas pesquisas de cevada da Agrária e com uma experiência acumulada de 30 anos no setor, a projeção da Cooperativa é chegar a 2023 com uma produtividade média de 5,5 toneladas por hectare. “Essa produção ainda está longe da média da Alemanha, por exemplo, que gira entre nove e dez toneladas por hectare. Porém, lá (na Alemanha) há apenas uma cultura anual e todos os investimentos são destinados para ela (a cevada), sendo que naquele país a cevada passa cerca de quatro meses sob a neve e depois brota. No Brasil nós temos duas culturas anuais, a cevada e a soja. No valor acumulado, a produção brasileira é mais rentável que a alemã”, explicou.
O pesquisador avaliou ainda que, desde a década de 70, quando iniciaram as pesquisas com melhoramento de cevada no Brasil, o rendimento médio das lavouras passou de 1.700 kg/ha para 4 mil kg/ha. O teor de proteínas, indicativo de qualidade para a indústria, reduziu de 14 para 10% e o extrato de malte passou de 80 para 84% (avaliação com base nas sete cultivares mais plantadas no estado do Paraná no período 1973-2013).
PRODUÇÃO
Confira a evolução da produtividade da cevada na região de Guarapuava entre 1973 e 2013 e a estimativa de produção por hectare para 2023.
ANO |
MÉDIA DE PRODUÇÃO POR HA |
1973 |
1,5 |
2013 |
4,5 |
2023 |
5,5 |
Atualmente, cerca de 300 famílias de cooperados da Agrária cultivam cerca de 37.000 hectares em média com cevada.
GENÉTICA
Noemir comandou por 17 anos os campos de cevada da cervejaria Antarctica e diz que o sucesso da cultura na região de Guarapuava se deve aos investimentos gradativos em genética e manejo.
Sem conseguir disfarçar o brilho nos olhos quando fala do assunto, Noemir diz que a Agrária implantou junto aos produtores uma filosofia de produção inovadora. “A cevada requer atenção permanente dos produtores. O manejo é fundamental, pois não adianta investir em tecnologia de ponta e não cuidar a lavoura. Quanto mais investimentos e cuidados os produtores tiverem, melhor será a produtividade e, principalmente, a qualidade da cultura. Nós implantamos a filosofia de excelência do campo ao copo. Ou seja, os produtores passam a se sentir responsáveis pela produção de uma cerveja de alta qualidade, pois quanto melhor a cevada, melhor será o malte e, conseqüentemente, melhor será a cerveja. Eles assimilaram isso e todos se sentem parte do triângulo produtivo: cevada, malte e cerveja”, explicou.
Para atingir a excelência produtiva, a Agrária mantém parcerias com a Embrapa Pesquisas e atualmente possui mais de 10.000 parcelas de cevada em experimento no campo. “Para chegar ao estágio atual, foram realizados diversos cruzamentos genéticos, principalmente com cultivares da Alemanha. A cada ano estamos buscando aprimorar essas cultivares, adaptando-as ao clima e solo e buscando aumentar a produtividade e a qualidade do produto”, disse o pesquisador.
A Agrária também mantém parceria com a AB InBev, uma companhia de bebidas Belga-Brasileira formada em 2004 através da fusão da empresa brasileira Ambev e a belga Interbrew, com quem também troca experiências para constante melhoria genética.
Questionado sobre a qualidade de cervejas, Noemir disse que o malte da Agrária é diferenciado e muito procurado pelas cervejarias. “Minha cerveja preferida é uma produzida e distribuída no Rio Grande do Sul, mas que utiliza o malte produzido aqui”, confessou.
CRESCIMENTO
O presidente da Cooperativa Agrária, Jorge Karl, demonstra otimismo com o mercado de malte. “Nós estamos ampliando a nossa maltaria e isso também vai requerer um aumento na produção da cevada. Hoje, toda a cevada produzida na região da Guarapuava é consumida na maltaria da Agrária. Se houvesse mais produção, com certeza também seria absorvida. Com os planos de expansão da indústria também estamos incentivando o aumento na área cultivada. A garantia de colocação da produção no mercado nos assegura essa possibilidade de incentivo também no aumento da produção”, afirma Karl.
A Cooperativa Agrária tem como regra de mercado não divulgar as estatísticas de importação de cevada e nem do percentual de utilização da cevada cultivada na região em relação à importada.
Para explicar a qualidade do malte, Jorge Karl também utiliza a cerveja como exemplo. “Todo brasileiro gosta de cerveja. Durante anos o vinho sempre foi a bebida geradora de eventos gastronômicos. Hoje, pelo gosto popular, a cerveja está ganhando o seu espaço entre os degustadores da bebida. E quando o malte é da Agrária, a diferença entre as cervejas é grande. A Agrária se destaca muito na qualidade. Se o malte é Agrária, toda cerveja é boa”, concluiu o presidente.
WINTERSHOW
Para contribuir com a constante evolução genética da cultura da cevada, entre a última quarta feira (16) e hoje (18), a Cooperativa Agrária realizou a 10ª edição do Wintershow.
Durante o evento, os produtores tiveram acesso ao que há de mais moderno em termos de produção, tanto nas questões de genética quanto de insumos e equipamentos agrícolas.