22/08/2023

Marina que vem

Escrever sobre o tema do momento traz sempre um risco a quem escreve e a quem lê e sempre fica a pergunta: será que hoje não é tarde demais para escrever sobre Marina Silva? Mesmo assim, acredito que depende do olhar e do que ainda não se escreveu. Vamos lá. Para este Professor, Marina Silva está “entre aspas”.

As aspas gozam desde a algum tempo de uma preferência especial entre os sinais de pontuação. Por uma palavra entre aspas, sugere-se que essa preferência deve ter razões que são tudo, menos superficiais. Hoje “Marina Silva” está desengessada, desbloqueada e desaparelhada. Os que ainda acreditam em valores na política estão se regozijando, apesar da tragédia que culminou com o desaparecimento do presidenciável Eduardo Campos. Este pequeno ensaio não pretender fazer referência a Eduardo Campos, mas sim sobre o saldo pós-desaparecimento. Como qualquer brasileiro, lamentei muito sua morte.

 

No entanto, sempre foi consenso que Eduardo Campos ( como fenomenal articulista ) colocou seu nome em 2014 esperando por 2018. Com Marina seria diferente e ao que parece, será. Partindo de seus 19.636.359 votos em 2010 e contabilizando muitos dividendos positivos vem transformar o improvável em uma possível probabilidade. Naquela eleição, os dois grandes partidos políticos (PSDB e PT) também estavam como estão. A diferença é que o PT de hoje está longe daquele PT de 2010 e o PSDB de 2014 está melhor que o de 2010.

O bloqueio à Marina presidenciável, questionadíssimo à época, foi ‘naturalmente’ desbloqueado e tal qual uma represa que abre as comportas, será difícil controlar sua força e intensidade. Pode não ganhar, sequer passar para um eventual segundo turno, mas não há dúvida que qualificará o debate eleitoral como ninguém, pois enquanto Aécio gasta gasolina em criticar esta gestão e Dilma em defender a sua e criticar a outra, Marina versará sobre valores na política e poderá enfrentar o espinhoso assunto da economia.

Para Dilma e Aécio Neves, o fenômeno do possível retorno “Marina” foi pior que o golpe da Alemanha sobre o Brasil.

Se Marina souber fazer a leitura certa do tempo presente e agir cirurgicamente em questões que dizem respeito a como será o amanhã, aterrorizará o binarismo PSDB e PT.

Tem a seu favor o voto mais jovem; redes sociais esclarecidas; o recall das manifestações de junho de 2013; a exposição do escândalo da Petrobrás; a frustração do cidadão com o sistema político vigente que, inclusive, barrou a Rede Sustentabilidade; o fracasso do discurso de Dilma de uma constituinte própria para a reforma política e uma sociedade que costuma construir suas escolhas mais na base da emoção que propriamente da razão. Não podemos desconsiderar o fenômeno da passionalidade. Somos passionais e sofremos até com a morte de um cantor sertanejo.

Dilma não terá a seu favor o discurso de boa gerente, sobretudo pela crise econômica propagada por todos que anunciam um Brasil com muitos riscos e, por outro lado, Aécio corre o risco de não mais ser o “outro alternativo preferível”.

Marina não será protocolar e provavelmente não será politicamente correta. Será sincera. Dirá o que se deve dizer, tocará em questões que os outros não terão coragem de mencionar em uma espécie de “roleta russa”. Será perigosa? Perigosíssima. É possível que faça ressurgir a máxima de que as ideias precisam ser perigosas. Foi um pouco "politicamente correta" quando estava em uma posição de atriz coadjuvante, “morando de aluguel na legenda de um condomínio de poder de Eduardo Campos – o PSB”, pois o sistema político havia negado e barrado a Rede sustentabilidade por questiúnculas. Imagine prezado (a) leitor (a) se o nome de Joaquim Barbosa fosse guindado ao posto de Vice-Presidente? Mesmo sabendo que isto é tecnicamente impossível por questões procedimentais, certamente acabaria com a hegemonia PT/PSDB que ‘ainda’ domina o Brasil.

Há algo que a desabone? Certamente há e é sobre isto que os comitês de Aécio e Dilma estão procurando agora para contê-la, plantando a tese de que a mesma não teria uma suposta governabilidade para dirigir o Brasil ou coisas do gênero. De todo modo, não tenho dúvida que Marina tem uma boa aura e muita fé. Talvez por isso contou com a conspiração dos Deuses em seu favor e pode até alavancar o discurso do messianismo, muito bem-vindo nas terras de Cabral. No último pleito e em algumas pesquisas demonstrou força eleitoral, mas agora precisa provar ter poder político para entrar no páreo. 

Cristina Esteche

Jornalista

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