22/08/2023
Brasil

Mentalidade radicalmente chique

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Já reparou o quanto que gente chique, metida a sabida e crente de que é esclarecida pra caramba – gente que vive muito bem protegida num condomínio fechado ou num bairro bem cotado – ama de paixão a bandidagem, principalmente os mais violentos e os desprovidos de qualquer escrúpulo? É de arrepiar o tamanho da paixão [fingida] manifesta por essa turma. É horripilante o quão grande é a dissimulação de superioridade moral exibida por essa gente artificiosa.

Na dúvida, para esse pessoal, o bandido sempre tem razão, sempre, porque, para essa esquerda radicalmente chique, o meliante está, ao seu modo, apenas manifestando-se contra o tal do sistema burguês com suas leis excludentes e blablablá.

Ele, aos seus olhos ilustrados, não é um criminoso; é apenas alguém que está bravamente lutando contra as injustiças que o mundo lhes impôs. Todos, creio eu, já ouviram aqui ou acolá uma cantilena similar a essa. E é claro que esses revoltadinhos caviar falam bem bravinhos contra o tal sistema capitalista em suas “reuniões de bons mocinhos”, mas, em hipótese alguma cogitam a possibilidade de abdicar do seu estilo pequeno burguês de ser.

Para qualquer cabeça de pudim que vê o circo pegar fogo à distância é fácil dizer esse tipo de sandice, ou qualquer trambolho que tenha como pano de fundo esse tipo de mentalidade distorcida que, saibam eles ou não, é fruto dos rabiscos canhestros das obras de senhores como Eric Hobsbawm, Herbert Marcuse, Ernesto Laclau, Frantz Fanon e tutti quanti que, direta e indiretamente, oferecem formas “diferentes” de ver a realidade, que apresentam estratégias novas para conquistar o poder e, de quebra, pra levar a sociedade para a bancarrota através do elogio da bandidagem e do lumpemproletariado.

Parênteses: Sei que bem provavelmente a turma radical chique não tenha lido diretamente nem mesmo uma página das obras desses senhores. Isso, pouco importa. O que de fato interessa é que toda essa gente pensa, percebe e sente a realidade a partir dos elementos estruturantes advindos de obras dessa lavra, elementos esses disseminados em nossa cultura por pessoas (de)formadas – direta ou indiretamente – pelas ditas cujas. E lembre-se: os vivos, gostemos ou não, são governados por filósofos mortos. Quanto mais eles são ignorados, mais poder eles tem. Fecha parênteses.

Enfim, com esse tipo de mentalidade e com uma vidinha vivida distante do olho do furacão é fácil achar que traficantes e demais tranqueiras similares sejam uma espécie de herói incompreendido pelo sistema opressor e demais sequazes reacionários, tão fácil quanto ler as aventuras de Harry Potter e, para algumas almas mais ousadinhas, algo tão excitante quanto ler cinquenta tons de qualquer coisa.

Resumindo o resumo do entrevero: falar que um monstro é uma criatura fofinha é fácil quando estamos longe, bem longe do dito cujo; outra coisa bem diferente é nutrir o mesmo afeto tendo ele como seu vizinho. É aí, meu caro, que a porca torce o rabo. E como torce.

(*) Professor, cronista e bebedor de café.

Cristina Esteche

Jornalista

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