22/08/2023

O espelho da aldeia

Nosso país está estranho. As coisas estão de ponta cabeça.  Brasília vive uma overdose política  com a publicidade de políticos envolvidos no ‘lava-jato’ e  a  quebra de braço entre Dilma Roussef e  o Congresso  Nacional  é apenas mais  um capítulo de nossa  extensa crise atual e confirma a máxima do filósofo Marcos Nobre: “o PT não lidera mais o Governo”.   Tenta, mas não consegue. Confesso que a dobradinha peemedebista, Renan Calheiros e Eduardo Cunha, dupla infernal de Presidente da Câmara e do Senado, colocam o Brasil em uma configuração assustadora, deixando a negociação sem escrúpulo na pole position.  O Brasil dá voltas, mas sempre acaba caindo nas mãos do velho PMDB, agora em uma versão definida de “a política sempre foi um negócio, mas agora, um show business”.

Em meio a tudo isso, aproxima-se uma mobilização nacional que, em nome de um patriotismo saudável ,  mas no mínimo polêmico e  questionável por conta daqueles que inflamam, quer parar o Brasil pedindo pela saída da Presidente. Na verdade o Brasil já parou, os caminhoneiros confirmaram esta tese.  

A tentativa  mal-sucedida do Governador tucano Beto Richa em impor um pacotaço sem diálogo para esconder seu fiasco de gestão; a crise hídrica e os negócios escusos da turma tucana paulista; e a baixa popularidade de Aécio Neves em Minas (evidenciado pela baixíssima votação presidencial em razão de problemas de gestão), escancaram a tese de que não é só o PT, PMDB e PP (envolvidíssimos no escândalo da Petrobrás) que tem problemas, mas todo o sistema político partidário nacional e suas práticas políticas que não convencem mais ninguém. Partidos e bandidagem, em um mesmo ângulo, colocam todos em um grande tribunal e expõem uma verdade explícita caracterizada pelo filósofo Vladimir Safatle como “bandidos querendo julgar bandidos para ver se, ao final, tudo volta ao normal e os criminosos travestidos de juízes possam continuar a fazer seus negócios em paz”. Entre velhos e novos bandidos, a política em sua essência, está em extinção e a população sem saber o que fazer.  Um novo quadro se aproxima em que o grande rival de um partido que governa  não será outro partido que se opõe, mas organizações bem articuladas, sem qualquer instrumentalização ou aprisionamento. É o que está acontecendo  neste momento ? Tenho dúvida.

Em meio a esse tiroteio em Brasília onde muitos estão envolvidos, milhões de brasileiros comuns e trabalhadores decentes são convocado-convidados a participar da grande mobilização de 15 de março para colocar um basta em tudo isto. No que vai dar isto? Sinceramente não sei.  Tudo isto acontecendo e o Brasil em queda econômica incontrolável, afetando imediatamente milhões de Brasileiros. Os caminhoneiros gritam sozinhos, a energia e a gasolina e seus aumentos trazem a lembrança negativa de um período que já tinha sido exorcizado. O que mais pode acontecer?  O Brasil aguenta mais este estrondo?

Acusados e acusadores parecem não ter diferença alguma.  Quando milhões foram às ruas em 1992 para exigir a saída de Collor, ele estava  só e perdido. Agora, vive-se outro momento, onde o atual Governo, mesmo não conseguindo governar, mesmo patinando,  tem  apoio de movimentos sociais e de alguns milhões de eleitores que observam o cenário e tentam justificar escolhas. Muitos admitem a roubalheira, mas mesmo assim preferem o atual governo do que outro, pois temem retrocessos sociais conquistados. Por outro lado, um número maior de pessoas,  heterogêneos, que tem aversão a quase tudo que é social e público, querem ir para a rua atacar senão tudo, ao menos este Governo Federal. Se é hipocrisia ou não, o futuro deixará isto claro. Escrevi dias atrás que enquanto alguns fazem apologia ao naufrágio, outros preferem fazer apologia ao resgate. Em minha opinião precisamos resgatar o Brasil e não colocá-lo em uma situação sem volta ( mas tenho dúvida em como se possa fazer isto ) , mesmo que às vezes  seja necessário. Não posso esquecer que, apesar da eficiência da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, tudo ou quase tudo que veio à tona destes últimos escândalos, veio por conta de delatores premiados que, enquanto suspeitos, dizem querer ajudar o Brasil e a si próprios.  Fico aqui pensando se o ex-Presidente da Câmara de Guarapuava, preso na Operação Fantasma fosse enquadrado nesta política de delação premiada. O que aconteceria ?

O fato é que tem muita coisa errada em Brasília, em Curitiba e em Guarapuava, no público e no privado. Ao gritarmos contra a corrupção temos que ter claro que estaremos gritando contra todos e também contra nossos atos e gestos que nem sempre colaboram para o fim da corrupção completa.

 

Cristina Esteche

Jornalista

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