22/08/2023


Cotidiano

O som do maracatu invade as ruas da cidade

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Acadêmicos de arte-educação recuperam folclore brasileiro. É o Lobo Brilhante que está na rua

O guarapuavano a qualquer momento pode ser surpreendido por um cortejo com raízes folclóricas bem brasileiras. O grupo Lobo Brilhante, composto por acadêmicos da Unicentro, recupera o maracatu, uma manifestação que faz parte da mais pura cultura popular pernambucana, que é levada às ruas desfilando ritmo e realeza nos carnavais de Recife.
O ritmo, que nasceu das reuniões de negros escravos no século passado, encontrou a simpatia de acadêmicos de Arte-Educação em Guarapuava. Um primeiro curso ministrado pelo arte-educador Pedro Solak (Curitiba) foi o embrião para o Lobo Brilhante. A idéia inicial, porém, partiu de alunas que participaram de uma oficina de maracatu em Antonina. “Elas trouxeram o professor para cá e mais de 40 pessoas fizeram o curso dando origem ao nosso grupo”, conta o acadêmico Rafael Antunes de Freitas.
O grupo, que começou com 35 membros, hoje tenta se reorganizar. “Muitas pessoas concluíram o curso e foram embora, outros começaram a trabalhar, e acabou dispersando”, informa a arte-educadora Claudia Batista, uma das fundadoras do Lobo Brilhante ao lado de Rafael.
Eles mesmos confeccionam os instrumentos. São as alfaias – um tambor que é considerado ícone do maracatu, constituído de corpo, peles, aro, e cordas para a afinação. A técnica foi aprendida em curso.
A riqueza cultural do maracatu, segundo autores, ainda não é bem explicada. O folclorista Roberto Benjamim frisa, em seu livro Folguedos e Danças, que maracatu, ou nação africana, é um manifestação criada pelos negros do Brasil. Ele ressalta que não existe na África nada parecido.
Sua origem, segundo folclorista, está nas festividades católicas de Reis Negros, influenciada pelos cultos afro-brasileiros cuja ligação é tão forte que o maracatu tem sido tomado como uma expressão religiosa dos grupos de culto gegê-nagô do Recife.
Começaram nas celebrações de coroação dos chamados Reis do Congo e fazem parte das festividades, constantes nos arquivos da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Alguns grupos fazem referência à santa em seus cânticos folclóricos.
O maracatu permitiu aos negros viverem seus momentos de glória e vestirem-se como em uma corte real portuguesa, no Brasil nos tempo do Brasil Colonial. Possuía o consentimento da igreja católica e dos senhores de escravos, que pretendiam evitar as rebeliões concedendo privilégios aos reis.
“A idéia possibilitou uma resistência cultural dos negros em pleno período de escravidão. Há registros de que os reis congos eram escolhidos numa cerimônia que acontecia nos pátios de igrejas católicas, ligadas à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e ao culto de São Benedito. Os maracatus e afoxés nasceram da união dessas cerimônias às tradições africanas. Com o fim dos Reis do Congo, a população negra continuou celebrando a coroação através da dança e da encenação”, explica Orlando Silva, coordenador do Kundun Balê, companhia de música e dança afro.
Segundo Claudia Batista, o maracatu mostra um cortejo real composto pelos personagens da Corte, que dançam seguidos por uma orquestra de percussão, composta pelos “batuqueiros” e seus instrumentos: alfaias, agbês, mineros, atabaques, taróis, caixas e gonguê, além de uma voz solo, comandada pelo Mestre, e o coro de vozes. “O Mestre (ou puxador) comanda o baque com seu apito e canta a loa, que é respondida pelos batuqueiros, baianas e todos os integrantes. Todos desfilam juntos, em blocos, em forma de “arrastão”. As loas são pré-elaboradas e falam da história do maracatu, da sua origem, da tradição, versam sobre o candomblé, o abolicionismo, a procedência escrava.
Em Guarapuava a manifestação ainda é tímida. O cortejo não mostra a corte real. “Nós apenas tocamos o maracatu, ou baque virado, que é o urbano, mais toado, é maracatu-nação”, observa Rafael. Segundo o acadêmico, há também o maracatu rural, que possui instrumentos de sopro e tem um ritmo mais acelerado”.
Da relação de instrumentos que compõem essa manifestação folclórica, o Lobo Brilhante conta apenas com as alfaias e os agbês.
Foto: Claudia Batista e Rafael Antunes de Freitas: reorganizando o grupo.

Cristina Esteche

Jornalista

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