Uma cartolina, tesoura, papel crepom de várias cores, algodão, cola, um par de botões vermelhos. Esses eram os ingredientes principais para os preparativos da Páscoa. Minha mãe Olympia sempre foi muito criativa e tenha uma veia artesanal que até ela mesmo desconhecia. Dizia que a criatividade tinha sido despertada pela professora Adélia Kluber, ainda na infância.
Após servir o jantar e lavar a louça ela nos chamava em volta da mesa grande da cozinha, ali na Casa Marrom, um bangalô enorme onde hoje está o extinto Hospital São João. Ali estávamos eu, o Tuto, o Fernando, a Mariângela. O caçula Paulo ainda nem sonhava em nascer. Minha mãe desenhava os coelhos na cartolina. Nós recortávamos, cobria com algodão, colava os olhos. Os papéis picados, coloridos, serviam como ninho à espera dos ovos de chocolate.
Entretanto, cabia à minha avó Aurora a parte religiosa da data. Lembro-me bem que meu pai, João Maria, ou o Paraguai, como era conhecido, só ia à missa uma vez por ano. Nunca faltou à missa de Páscoa. Embora tenha sido estudado por muito tempo em seminários e colégios católicos, ele nunca aceitou o fato das celebrações deixarem de ser no latim. Ele era muito conservador.
NA CASA DOS AVÓS MATERNOS
Todavia, em alguns anos, a Páscoa era na casa dos meus avós maternos. Vovô Victor e vovó Leonídia moravam no Mato Branco. Acho que era interior de Chopinzinho. Havia um armazém enorme do meu avô. Mangueiras com gado, cavalos e outros animais atraíam a mim e meus irmãos. Mas eram as cabras o meu sufoco.
Vovó Leonídia era índia mestiça, bugre como diziam, muito brava. Entretanto, eram as minhas tias, as irmãs da minha mãe diziam que se não fôssemos obedientes, em vez de ovos, os ninhos estariam cheios de ‘bolinhos’ de cabra. E a vara de marmelo colhida na Sexta-Feira Santa para ‘tirar a aleluia’ de quem havia sido desobediente? Só de pensar naquela varinha fina estalando nas pernas já dava vontade de sair correndo.
Enfim, chegava o tão esperado domingo de Páscoa. E lá saíamos nós, ainda de pijama, correndo em busca dos ovos de chocolate. É claro que nunca nos deparamos com ‘bolinhas’ de cabras e nem com o tilintar das varinhas de marmelo.
O PASSAR DOS ANOS
O tempo passou e bem que tentei repassar isso aos meus filhos. Até alguns anos, consegui, junto com o Orlando, preparar os ninhos com o Diego, a Luana e por um ano com o Juan. Depois, os ninhos prontos, sofisticados perto daqueles da minha infância, tomaram conta das prateleiras. O renascer pregado pelo cristianismo também divide espaço com outras crenças, algumas delas, pagãs. Mas, enfim….
Hoje, agora com o meus netos, as patinhas pintadas no chão, os ninhos, a magia da imaginação já não existem mais. Já não há mais cartolinas, nem papéis picados e coloridos. Toda essa fantasia ficou apenas na lembrança. Que pena!
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