22/08/2023
Saúde

Pagamento de comissão para médicos acontece em Guarapuava

imagem-15466

Guarapuava – A pergunta feita pelo programa Fantástico de que “você iria a um médico sabendo que ele recebe da farmácia mais 30% do que prescreve ao paciente?” refletiu em Guarapuava e mostra que a prática também existe na cidade.

A TRIBUNA teve acesso a várias receitas médicas indicando em qual farmácia o medicamento receitado deve ser manipulado, assim como denunciou o programa da Rede Globo no domingo (18). A prática é condenada por farmacêuticos e bioquímicos de Guarapuava.

“Se trata de uma concorrência desleal e de uma forma de corrupção onde não interessa o currículo do profissional em questão, mas os benefícios que se ganha”, observa a farmacêutica Zaclis Navarro Xavier, conselheira municipal de Saúde e professora de Pós-Graduação.

Para ela, o paciente tem o direito de escolher em qual farmácia vai manipular o seu medicamento. “A legislação prevê que o paciente tem o direito de escolher, por exemplo, em qual ótica que fazer o seu óculos, em qual clínica de fisioterapia vai fazer o seu tratamento, em qual laboratório de análises clínicas vai fazer o exame solicitado, ou em qual farmácia quer mandar manipular uma receita”, observa.

O acordo farmácia x médico, segundo Zaclis Navarro Xavier, está lesando estabelecimentos que não se utilizam desse procedimento para atrair clientes.

“Uma vez em que o paciente recebe a indicação do médico onde deve manipular o medicamento, pela relação de confiança que existe entre ambos, o paciente vai fazer o que lhe foi recomendado. Com isso, nos sentimos lesados porque não pagamos nenhuma comissão a médicos e o paciente vai escolher a pior farmácia. O médico quando escolhe uma farmácia está denegrindo a imagem das demais”, diz.

Farmacêutico e empresário do setor, Luiz Manoel Oliveira Martins (foto) concorda com Zaclis Xavier. “Nós condenamos essa prática porque entendemos que isso também é prejudicial ao consumidor”, diz. De acordo com o empresário, se trata de uma “prática criminosa” que virou regra em Curitiba e que atinge Guarapuava, embora em menor escala, mas já se alastra pela região. “Fizemos uma pesquisa para abrir uma filial na região e desistimos porque essa prática tomou conta do mercado”, diz.

O Código de Ética prevê punição para os farmacêuticos que oferecem comissões a médicos. “Nosso código de ética previne que acumpliciar-se com outras profissões poderá dar em até um ano de suspensão dos direitos profissionais ou até a cassação de direitos”, afirma Jaldo Santos, do Conselho Federal de Farmácia.

A TRIBUNA também procurou falar com o representante da Associação Médica em Guarapuava, Marcos Hernandes Tenório Gomes, mas o médico encontrava-se com pacientes e não pode atender a ligação.

Para o advogado Valter Carretas, especialista em Direito Sanitário e Farmacêutico, de Curitiba, o pagamento de comissões a médicos é um assunto que sempre foi muito comentado, mas sem qualquer fiscalização por parte dos órgãos competentes e se trata de uma questão ética por parte dos profissionais envolvidos e não uma matéria criminal como está sendo colocada pela imprensa. Ele se refere à matéria também divulgada pelo jornal Gazeta do Povo na edição de segunda-feira quando foi colocado que a prática se equipara ao tráfico de drogas.

Para o advogado o relacionamento entre médico x paciente x farmacêutico é saudável e necessário. “É necessária até para tirar dúvidas que surgirem. Há uma série de situações que levam obrigatoriamente a essa relação, mas a partir do momento em que surgem as comissões em questão se trata de uma questão ética”, ratifica.

Outras farmácias de manipulação foram contatadas pela TRIBUNA, mas os proprietários ou responsáveis não se encontravam no local naquele momento e não retornaram a ligação.

Farmacêuticos defendem fiscalização rigorosa

O combate ao pagamento de comissões a médicos em troca de indicação para manipulação de medicamentos deve ter uma fiscalização mais efetiva na opinião de empresários do setor que não são adeptos dessa prática.

“Os órgãos competentes devem dar uma atenção especial às farmácias em vez de se preocuparem com coisas de menor importância”, defende Luiz Manoel Oliveira Martins. Ele cita como exemplo uma resolução da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que não permite correspondentes bancários nas farmácias. De que forma isso vai prejudicar o cliente? Acho que há falta de investigação no foco certo”, afirma.

O chefe do Departamento da Vigilância Sanitária em Guarapuava, o médico Fernando Pedrotti foi procurado insistentemente pela TRIBUNA na quinta-feira (22), dia de fechamento desta edição, para comentar o assunto, mas estava em reunião e não retornou a ligação.

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.