22/08/2023
Cotidiano

Sem produzir, carvoeiros passam necessidades

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Guarapuava – Recentemente, a operação Angustifolia, composta por agentes federais e estaduais de várias instituições para o combate ao desmatamento e ao trabalho ilegal, concentrou esforços em Guarapuava e região.
Um dos alvos era desestruturar a rede que abastece siderúrgicas com carvão feito de madeira nativa no Centro-Sul do Paraná. Foi no início de junho, e o trabalho durou duas semanas, resultando 66 autos de infração motivados por várias irregu-laridades, somando R$ 1,7 milhão em multas e em três prisões.
Uma pessoa que trabalha na atividade carvoeira há sete anos e que atualmente terceirizava a produção para produtores no município de Turvo teve o seu trabalho paralisado e agora enfrenta dificuldades financeiras. Essa situação, segundo ele, que pediu para não ser identificado por receio de possíveis represálias, atinge também os produtores. “Estamos numa situação difícil. Há famílias passando necessidades”, queixa-se.
O que levou o cidadão a tornar pública a sua angústia foi o sentimento de revolta que o envolve. Ele disse que todos possuem a documentação exigida e a apresentaram aos agentes. “Tivemos duas visitas nos fornos terceirizados e os documentos foram mostrados. Estava tudo legal, tanto é que a equipe de fiscalização foi embora. Depois retornaram e derrubaram os fornos sem qualquer explicação. Eles (Instituto Ambiental do Paraná, Força Verde) foram arbitrários”, afirma.
De lá para cá, os produtores que fabricavam carvão para ser entregue em siderúrgicas mineiras, empresas que trabalham com filtros de água, e, por último para indústrias de Guarapuava e região que produzem carvão ativado e também para saneamento, pararam com a atividade e estão passando dificuldades.
Indignado com a atitude do órgão ambiental, uma vez que a documentação exigida para a exploração da atividade carvoeira, de acordo com o recla-mante, está dentro da lei, ele faz uma denúncia. “A maioria das empresas que atuam no ramo são ilegais, não têm documentação e, apesar de tudo isso, continuam trabalhando normalmente”, garante.
“Para constituir uma empresa (somos pessoa física, mas com documentação) é preciso fazer o cadastro técnico federal no IBAMA, exigido para qualquer tipo de exploração de material vegetal ou animal. Muitos não têm nada”, declara.
Para conseguir vender a madeira que não seja exótica ou o carvão vegetal mesmo exótico tem que ter DOF (documento de origem florestal). Mas o que acontece é que se faz uma nota (consegue-se de uma madeireira ou nota do produtor), se preenche com os dados do produtor do carvão e coloca-se como se fosse referente a 200 metros de resíduos de material exótico, por exemplo. Leva esse documento no IAP, preenche-se um formulário que é o requerimento do DOF para que seja licenciado no cadastro (para quem tem), mas somente o papel é levado, pois o IAP não vai fiscalizar se o material é exótico ou não. Então, se entra no cadastro e transforma o material em carvão vegetal. Essa é a jogada que está sendo feita, mas a maioria não tem cadastro, nada. Tem gente trazendo carvão de Cascavel, embalando e levando de volta durante a madrugada, sem nada. Vem aqui degrada o material e volta”.
Segundo o diretor do IAP em Guarapuava, Ildefonso Costa (foto), nenhuma denúncia passa pelo escritório regional porque são encaminhadas à Ouvidoria do IAP em Curitiba. Ele disse que toda denúncia feita tem que estar fundamentada. “O IAP fiscaliza, mas a competência florestal é repassada para a Força Verde”, orienta.
ILEGAL
Para o comandante da Polícia Ambiental, capitão Heraldo Correia Lima, a operação puniu somente quem estava com atividade ilegal. “Nada impede, porém, que os empreendimentos que foram suspensos sejam reativados. Mas para isso, depende que a pessoa legalize a sua situação”, observa.
A atividade carvoeira, segundo Ildefonso, pode ser explorada por qualquer interessado. “Qualquer pessoa pode ter um forno de carvão desde que comprove a origem da matéria-prima, que “não pode ser extraída de reserva permanente e nem queimar árvores nativas”.
Ele explica que espécies como bracatinga, eucalipto, pinus, entre outras espécies, desde que devidamente autorizadas, e com até 25 metros cúbicos de nativas diversas podem ser cortadas, desde que estejam em áreas de lavouras e de pastagens. Excluem-se dessa lista a araucária e a imbuia, espécies consideradas em extinção. Ele cita também espécies de monjoleiro, canela, guamirim, que podem ser derrubadas, “inclusive para fazer carvão”.
Ildefonso diz ainda que por isso é possível “driblar” a fiscalização. “O IAP já pegou 60 pinheiros cortados para os quais estava sendo usada a mesma guia para corte de espécies autorizadas. Vai muito da consciência ambiental de cada um”, observa. “O produtor foi multado e teve que fazer o replantio”, informou.
Conforme o capitão Heraldo, são considerados crimes ambientais todas as atividades que estiverem fora das normas exigidas pela legislação. No caso das carvoarias, há um cadastro no Serflor, um serviço que monitora tudo o que se refere à flora, seus produtos e sub-produtos. Incluem-se aí, por exemplo, as siderúrgicas (carvão), panificadoras, pizzarias (lenha), entre outras atividades.
Segundo o policial, para qualquer atividade de corte se faz necessário o DOF que vai autorizar ou não, inclusive para fornos de carvão.
“Aquele que comete um crime ambiental atualmente pode se sujeitar a três processos: multa (administrativo); processo penal (parte da infração é tomada como crime) e reparação do dano causado”, alerta.
Para o policial, o fato do pinus e do eucalipto serem isentos de reposição florestal e não precisarem de controle efetivo dos órgãos ambientais, facilitou a atividade carvoeira. “Começaram a produzir carvão dessas espécies e a atividade se disseminou tanto que no último sobrevoo que fizemos detectamos 80 fornos na região, autorizados e não autorizados, também”.

Cristina Esteche

Jornalista

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