22/08/2023

Um dia triste

O dia amanheceu cinza, mais uma vez. A ausência do sol tem sido constante na maior parte das últimas semanas, provocando uma certa melancolia. Eu, particularmente, há muito já me entreguei ao Deus Osíris, uma das divindades que permeia a minha fé, a cada dia. Hoje, particularmente, olho pela janela no sexto andar do Edifício Araucária e sinto tristeza. Ali na Câmara Municipal de Guarapuava que, esporadicamente, se transforma numa capela mortuária para velórios de pessoas que, de alguma forma, merecem essa homenagem, inerte jaz o corpo de Vicente Marques. Conheci o Vicentão, como era chamado entre os  “ mais chegados”  quando comecei a série de reportagens sobre a luta dos herdeiros de ex-escravos de Dona Balbina Siqueira. Foram mais de 20 anos de convivência, ora distante, ora mais perto, mas o suficiente para conhecer o ser humano Vicentão. Amigo, solidário, batalhador. Meio complicado, às vezes, confesso, mas um baita companheiro. A Família Silvestri que o diga. Afinal, foram mais de duas décadas de companheirismo, de trabalho, de amizade, de consideração.

Conversei com o Vicentão há uns 10 dias. Ele me contou sobre as  terras, finalmente, conquistadas; sobre a organização comunitária que começava. Estava empolgado, cheio de planos. Mas o destino interrompeu a linha tênue que separa a vida e a morte e o Vicentão se foi para outro quilombo onde, certamente, o Carlinhos – outro quilombola que já se foi – o receberá de braços abertos. Afinal, aqui nesta passagem eles formaram a dupla perfeita para o trabalho, para a luta, para os churrascos, para os causos e para uma boa cachaça.

Que essa interrupção sofrida pelo Vicentão sirva, mais uma vez, de exemplo para os nossos atos, nossas ações, para termos a consciência de que daqui, onde estamos, nada se leva, mas o que fomos permanecerá , sempre, na memória daqueles que amamos.

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

Este post não possui termos na taxonomia personalizada.

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.

Pular para o conteúdo