22/08/2023
Cotidiano

Val Ribas dá uma lição de coragem e superação

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Cristina Esteche

A menina humilde, filha de mãe diarista e pai servente de pedreiro, cresceu, no sentido literal da palavra. Acreditou em si mesma, enfrentou desafios, se “vestiu de coragem” e seguiu em frente. Derrubou fronteiras, selecionou o que quis, se relacionou, investiu, realizou sonhos, viajou pelo mundo. Hoje, Val Ribas, se depara com uma passagem nas mãos, sem data marcada para embarcar e sem destino certo. Segue rumo à liberdade plena, levada por uma visita que só os privilegiados se preparam para recepcionar.

Valacir Ribas, ou Val Ribas, aos 45 anos de idade, descobriu que é portadora de uma doença rara: a priônica, uma proteína que se torna agressiva e ataca o cérebro. Incurável e sem tratamento a evolução da doença é rápida. À medida em que os dias passam, a doença vai afetando as estruturas cerebrais ou outros tecidos neurais.

Se para a maioria das pessoas esse tipo de situação pode gerar pânico, a lição ensinada por Val começa justamente aí. “Quando soube que estava doente passei a viver o momento presente e intensamente como sempre fiz. Aproveitei a vida em todos os seus momentos e continuo assim”, afirmou. Sempre acompanhadas por amigos, incluindo a terapeuta Sandra Zanette, Val recebe as pessoas como sempre fez. Alegre, disposta a conversar, apesar das limitações físicas impostas pela doença, maquiada e sorridente. E é assim que ela se prepara para a visita que vai chegar.

“Quando soubemos da doença da Val criamos uma metáfora onde a morte é uma visita. E a Val se prepara para recebe-la da melhor forma possível, assim como nos preparamos para recepcionar quem vai em nossa casa”, disse Sandra Zanette.

“A morte é uma coisa natural e da qual ninguém escapa. Por isso, sempre vivi intensamente, não quis relacionamentos duradouros e nem a vida que a minha mãe teve. Pra mim a independência, a liberdade sempre foram importantes”.

Origem humilde

Nascida numa família humilde, sendo a última de cinco filhos – dois homens e três  mulheres – Val veio de Inácio Martins para Guarapuava aos dois anos de idade. “Minha família tinha umas terrinhas, mas meu pai bebeu tudo”, conta. Da infância sofrida e vivida na periferia da cidade, Val Ribas disse que a única lembrança que tem é a do seu pai correndo atrás da mãe. “Minha mãe tinha que se esconder na casa dos compadres”. Outra cena que a marcou foi quando em dias de chuva ia para a escola com um guarda-chuva velho e quebrado, enquanto as demais meninas tinham sombrinhas coloridas. “Carreguei o sonho de ter sombrinha colorida e a comprei na Ilha de Malta”.

Aos 15 anos de idade, um livro que ganhou da madrinha seria o “trampolim” para uma nova condição de vida. “Ganhei o Poder do Subsconsciente [Joseph Murphy] e esse livro se tornou a minha bíblia.  Durante 10 anos repeti uma das frases como um mantra. Eu dizia: eu vou vencer, eu não vou ter a vida que os meus pais e meus irmãos tem”.

Um dia Val Ribas saiu em busca de emprego e conseguiu temporariamente numa livraria. Com o primeiro salario saiu para comprar a primeira calça jeans e saiu da loja Dallas [ “do Eder Dalanhol] empregada. Foram oito meses até ir trabalhar no escritório de contabilidade de Serlei Denardi, local onde ocupou todos os cargos. Cursou técnico de contabilidade e curso superior. Passou no concurso da Companhia de Serviços de Urbanização de Guarapuava (Surg), onde trabalhou durante 12 anos. Em 2006 prestou concurso na Câmara Municipal de Vereadores onde é contadora há nove anos.

“O meu trabalho me deu condições de ganhar muito bem. Portanto, comprei todas as sombrinhas que eu quis, todos os sapatos que gostei, viajei pelo mundo,  amei intensamente. Tem gente que ganha menos do que eu e tem mansão, carros de luxo. Eu preferi ter um apartamento confortável, um carro popular, viver a vida e ser feliz. A felicidade deve ser a meta das pessoas. Eu fui e sou muito feliz, bem resolvida em tudo. É claro que tive pessoas que me decepcionaram, mas foi uma decepção momentânea,  que passou, porque essas pessoas não merecem a minha atenção”.

O valor da amizade

Celebrando a vida a cada segundo, Val Ribas encontra o suporte nos amigos que a rodeiam. São pessoas de todas as idades, homens e mulheres, que compõem o seu dia a dia. “Tenho amigos verdadeiros e em cada um encontro um pouco da minha vida. Não vivo sem pessoas ao meu redor”. Val Ribas disse que abriu mão de uma união de cinco anos porque o seu esposo gostava de viver isolado.

E são os amigos que se dividem para cuidar dos interesses da Val. “Um cuida do financeiro, outro do tratamento, do dia da cabeleireira ir na casa para fazer escova, pedicure, manicure, entre outras atividades. “Tenho uma amiga que vem todo dia orar comigo. Eu sou evangélica e acredito num Deus que pode tudo. Ele pode me curar. Ainda estou brigando com Ele, estamos batendo de frente e eu não estou me entregando”, disse expondo a força da sua fé.

“Os amigos verdadeiros são tudo de bom na nossa vida. Sempre levei a vida ajudando muitas pessoas. Tem gente que nem sabe o que eu fiz. Alguns me retribuiram com o bem, outros com o mal. Mas existem coisas que não tem preço e a amizade verdadeira, a fé, são duas delas”. Val Ribas continua a sua caminhada celebrando a vida. “E se eu estiver viva vou passar o réveillon em Paris, mas se não der, às 22 horas da noite do meu velório eu quero um brinde para celebrar o que eu vivi”. Para a Val o céu pode não ser o limite.

 

 

Cristina Esteche

Jornalista

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