22/08/2023
Guarapuava Segurança

Vereadora diz que Câmara é um lugar de “muita violência” contra a mulher

Segundo Terezinha, violência se dá pela agressão moral, pelo grito, pela tentativa de impedir a fala

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Terezinha Daiprai durante pronunciamento (Foto: RSN)

A violência moral e discursiva no cenário político pautou o pronunciamento da vereadora Professora Terezinha Daiprai no Dia Estadual de Combate ao Feminicídio. O depoimento, entretanto, foi durante na noite dessa segunda (22), no Teatro Municipal de Guarapuava. Trata-se de uma referência ao ambiente do Legislativo Municipal, espaço onde atua.

Conforme a vereadora a Câmara deveria ser um espaço de construção de políticas públicas em defesa da vida das mulheres. “Mas está muito longe disso. É um espaço inclusive de muita violência”. Além disso, de acordo com Terezinha, a violência na Câmara de Guarapuava se dá pela “agressão moral, pelo uso das palavras, pelo grito, pela tentativa de impedir a fala”.

Composta por 21 vereadores a Câmara possui uma bancada feminina de apenas duas vereadoras. Além de Terezinha, a veterana Maria José Mandu Ribas, já no seu quarto mandato. O Portal RSN tentou contato com a vereadora. Porém, sem retorno.

Em nota o presidente da Câmara de Vereadores de Guarapuava, João do Napoleão, lamentou a afirmação da vereadora.

DENÚNCIA CALADA

Instalação em frente ao teatro (Foto: Secom)

A fala da vereadora Terezinha Daiprai foi apenas uma das denúncias feitas no dia de primeiro aniversário da morte da advogada Tatiane Spitzner. Pois, logo na entrada do Teatro Municipal as 82 cruzes e sapatos femininos expostos eram uma denúncia calada dos feminicídios ocorridos no Paraná, entre maio de 2018 e maio de 2019.

No hall a reprodução de uma casa, entretanto, expunha destroços de cenas de violência doméstica. Na pia, uma faca e uma chave de fenda. Além disso, uma mesa posta esperando quem não ficou de chegar. No chão, pratos quebrados, comida derramada, cadeira virada. No quarto a cama intacta. Porém, na mesa de cabeceira, a bandeja com café da manhã, uma rosa, um persuasivo pedido de perdão e a promessa de que essa seria a última vez.

No palco, estatísticas e depoimentos que chocaram o público que lotou o espaço. Eram adultos, adolescentes e jovens. Homens e mulheres.

Todos tiveram acesso a números que são alarmantes: 16 milhões de mulheres acima de 16 anos já sofreram algum tipo de violência. Quinhentas mulheres são agredidas por hora no Brasil; 177 são espancadas. A cada duas horas, entretanto, uma mulher é vítima de feminicídio.

NOTA DA CÂMARA

“Vejo isso com muita estranheza a vereadora ir para um evento público representando este poder e denegrir a imagem da Casa de Leis dessa maneira. Realmente nos deixa entristecido. Pois, dentre os vereadores é uma das pessoas mais acionadas para nos representar. Além disso, eu sempre tratei ela com toda a igualdade ou até um pouco mais como mulher, feminista, professora. Inclusive, a indiquei para ser membro do Conselho Municipal da Mulher representando a Câmara Municipal de Guarapuava. Além disso, às vezes, realmente, acontece algum debates acalorados, mas é normal do parlamento. Assim, talvez, como gritaram com ela, ela também gritou com vários vereadores. Na sessão extraordinária, do dia 22, chamou por várias vezes em tom agressivo, o vereador Melhem, o decano desta Casa de leis, de velho. Além disso, no mesmo dia, a respeito da uma última decisão judicial da doutora juíza de direito Heloísa Mesquita Fávaro Freitas, a vereadora Professora Terezinha foi infeliz em comentar que vivemos em tempo de um Judiciário parcial. Porém, no mesmo momento, o presidente, João Carlos Gonçalves, pediu respeito. Afinal, a magistrada passou por um banco de faculdade e prestou concurso público e, também, é uma mulher”.

‘A VERDADE VAI PREVALECER’

Bruna Spitzner (Foto: Caio Budel)

A advogada Tatiane Siptzner foi morta na madrugada de 22 de julho de 2018. Apesar da condição financeira estável e  do nível cultural pautado pelo ensino superior, ela foi mais uma vítima fatal da violência doméstica.

De acordo com uma das suas primas, Bruna, a advogada era uma mulher forte. “Ela achava que ela mesma podia resolver todos os problemas, que podia abraçar o mundo e os sinais de que sofria agressões passaram despercebidos”.

Passado um ano da morte, a advogada dá nome ao Dia Estadual de Combate ao Feminicídio, por proposição da deputada Cristina Silvestri. Porém, a família acredita que a verdade de Tatiane é a que vai prevalecer. Bruna se refere ao processo contra o ex-marido da vítima, Luis Felipe Manvailer. Pois, a defesa tenta derrubar a tese de homicídio e dizem que Tatiane se suicidou ao se jogar do quarto andar do edifício onde morava.

“Isso é um absurdo. Mas a verdade vai prevalecer e vamos poder respirar aliviados. Pois a nossa dor ainda é muito latente. Mas, estamos lutando para salvar outras mulheres, pois cada uma que morre é um pedaço de nós que vai junto”.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Zelar pela vida, amparar e empoderar mulheres, entretanto, são os principais objetivos das ações desenvolvidas pela Secretaria Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres, criada em 2013, em Guarapuava. No ano de sua fundação, a cidade registrou 8 casos de feminicídios. Três anos depois, entretanto, o número reduziu pela metade. Já em 2017, nenhum feminicídio foi constatado

CASA ABRIGO

Desde março de 2015, Guarapuava conta com um lar de apoio para abrigar mulheres em risco de morte por violência doméstica. Além disso, elas recebem atendimento psicológico, jurídico e social. A casa tem capacidade para acolher até 15 pessoas, entre mulheres e filhos menores, com estrutura de quartos, salas, copa, cozinha, lavanderia, banheiros, brinquedoteca, oratório e playground, além de vigilância 24 horas.

Representação de uma cena de violência (Foto: RSN)

PROJETO MARIA DA PENHA NAS ESCOLAS

O projeto Maria da Penha nas Escolas, entretanto, utiliza a educação como ferramenta na prevenção da violência contra a mulher. As três etapas que compõe esta ação envolvem pais, professores e especialmente alunos, onde em rodas de conversa, debates e atividades diferenciadas a equipe trabalha sobre atitudes preventivas para inserir na rotina das crianças a consciência do combate a violência contra a mulher, obtendo resultados em longo prazo.

REDE DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

A Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher é uma ferramenta de articulação entre as lideranças do município e diz respeito à atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não-governamentais e a comunidade, buscando o desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção e de políticas que garantam o empoderamento das mulheres e seus direitos humanos, a responsabilização dos agressores e a assistência qualificada às mulheres em situação de violência. A Rede atende todas as mulheres que sofram qualquer tipo de violência, tanto as previstas na Lei Maria da Penha, quanto assédio, importunação sexual e outras.

(Foto: RSN)

CENTRO DE REFERÊNCIA DE ATENDIMENTO À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA

O Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência atende todas as mulheres que sofram qualquer tipo de violência. Tanto as previstas na Lei Maria da Penha, quanto assédio, importunação sexual e outras.

Oferece acompanhamento até a Delegacia da Mulher, requerimento de medida protetiva e encaminhamento a Casa Abrigo, caso seja necessário. Além disso, também  oferece atendimento psicológico, social e jurídico, e articula os demais serviços da Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher.

PATRULHA MARIA DA PENHA

A Patrulha Maria da Penha é mais uma aliada para atender as mulheres em situação de violência. Ela funciona com um veículo e uma equipe exclusiva que, de segunda a sexta, monitora mulheres que possuem medidas protetivas, verificando se a lei está sendo cumprida e qual a situação dela e dos filhos. A atuação ocorre em bairros, distritos e na área rural.

PROMOÇÃO DA AUTONOMIA ECONÔMICA

Também os cursos profissionalizantes possibilitam a independência das mulheres e a inclusão no mercado de trabalho. O que contribui com a autonomia econômica, emancipação e, consequentemente, superação da violência doméstica e familiar. Além disso, mais de 590 mulheres já foram empregadas em dois anos. Os cursos são abertos a toda mulher que tenha interesse, sendo que as vítimas de violência têm prioridade.

 

Cristina Esteche

Jornalista

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