Aos 56 anos, Liane Padilha é uma artista de rua que percorre cidades do Brasil tocando sanfona e cantando. A história dela se mistura em meio a de tantos músicos que se jogam na estrada com o objetivo de viver um sonho. Mas tem uma coisa que diferencia Liane dos demais: ela não enxerga.
A curitibana chegou em Guarapuava na semana passada e durante a madrugada desta quarta (12) embarcou destino à Assis Chateaubriand, no Oeste do Paraná. Mas antes ela deu uma entrevista para o Portal RSN e à Rede+. Em uma conversa inspiradora ela contou as motivações que a levaram seguir este caminho.
Há 12 anos a mãe de quatro filhos entrete quem passa na rua com canções, na maioria, de partir o coração. Mas o contato com a música ela teve quando era criança. “Quando eu conheci uma gaita eu tinha 10 anos. Eu peguei ela na mão e alguém me ensinou que eu tinha que bater aqui e aqui [teclas]. Ninguém me ensinou mais nada. Depois aos 16 anos eu comecei arranhar e alguém me deu mais algumas dicas”.
Aos 23 anos a artista conseguiu comprar um instrumento próprio e a partir disso aprendeu a tocar praticamente sozinha. A limitação visual não foi um fator que a impediu de conseguir o que queria ao longo da vida.
Eu tenho uma limitação que eu preciso de uma guia [bengala]. Mas eu consigo fazer meus negócios todos certinhos. Sei onde estou aplicando o meu dinheiro. Eu tenho também as minhas frustrações de negócios que dão errado, assim como todo mundo.
Ela conta que perdeu completamente a visão aos 18 anos após uma cirurgia mal sucedida. Antes Liane conseguia enxergar ‘vultos’ e cores. Mas como sonhava em ler a bíblia, casar e ter filhos, mesmo sabendo da possibilidade de rejeição no transplante de córnea, resolveu enfrentar o procedimento. Contudo o que ela mais temia aconteceu: ela perdeu o pouco de visão que tinha. “Mas eu acabei casando e acabei lendo a bíblia do mesmo jeito [riso]”.
METÁFORA DA MELANCIA
“Quando eu perdi a visão aos 18 anos me deram um pedaço de melancia enorme. Eu peguei aquele pedaço e comecei a chorar. Eu mordia a melancia e ela estava madurinha. Mas eu pensava, ‘nossa, agora eu não vejo mais a cor da melancia’ e chorava. Mas parece que um anjo guardião falou na minha cabeça ‘mas você vai comer a melancia ou vai comer a cor?”
Você vai recuar agora porque tem uma deficiência? Você vai comer a melancia ou a cor dela?
Daquele momento em diante, Liane conta que decidiu seguir a vida e continuar lutando. Depois casou-se, teve os tão sonhados filhos e nunca mais recuou por não poder enxergar. Ela diz que a ‘revolta a empurra a crescer”. Tanto que anos mais tarde, solteira novamente, Liane apaixonou-se novamente por um homem que era artista. Porém, mesmo com os constantes pedidos dela para que a levasse para se apresentar, ele não a levava para tocar e cantar nos lugares.
“Eu me frustrei tanto com o homem que eu amava e ele só me esnobava que um dia eu enlouqueci e disse: eu vou! eu sou competente e vou pra rua cantar. E eu não preciso mais de você”. Foi a partir disso que a artista itinerante pegou e estrada e não parou mais.
A limitação é a gente que cria. As pessoas dizem “deixa eu arrumar essa coisa pra você, deixa eu arrumar isso ou aquilo” e eu digo: não amado, me mostra onde eu tô errando e me ensina arrumar. Não arruma não. Deixa eu fazer porque quando eu tô fazendo, eu tô evoluindo.
Leia outras notícias no Portal RSN.