domingo, 30 de mar. de 2025
Blog da Cris Paraná

Assembleia do Paraná acerta ao barrar negativação em 5 dias

Assembleia derrubou proposta do deputado Fabio Oliveira por 44 votos contra um. Afinal, o consumidor não é culpado pela crise do crédito

Alep (Foto: Orlando Kissner/Alep)

Em uma decisão acertada, a Assembleia Legislativa do Paraná rejeitou, por ampla maioria, a tentativa de reduzir para cinco dias o prazo de negativação de consumidores inadimplentes no estado. A subemenda, apresentada pelo deputado Fabio Oliveira (PODE), foi derrotada por 44 votos a 1. Trata-se de um recado claro: não se combate inadimplência punindo o elo mais fraco da cadeia econômica.

A proposta surgia no bojo do Projeto de Lei 659/2024, que trata de ajustes no Código de Defesa do Consumidor do Paraná (Lei 22.130/2024). O guarapuavano Fabio Oliveira pretendia acelerar o processo de negativação mesmo diante de um cenário econômico ainda frágil. O argumento era de que a medida corrigiria um “desequilíbrio” no sistema de crédito, penalizando maus pagadores e, supostamente, beneficiando os bons. No meu entendimento, uma lógica rasa e perigosa.

O RISCO DO RETROCESSO

Deputado Fabio Oliveira (Foto: Alep)

O Código de Defesa do Consumidor nacional (Lei 8.078/1990), que inspira o código estadual, não prevê prazo mínimo para negativação. Assim sendo, abriu brechas para legislações estaduais estabelecerem regras mais protetivas. O prazo de 30 dias adotado no Paraná se baseia em princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a proteção do consumidor (art. 5º, XXXII). Além de estar alinhado ao direito à informação adequada e à ampla defesa.

Conforme defendeu o deputado, “a subemenda visa inibir a inadimplência no mercado paranaense”. O Paraná, segundo ele, tem o menor número de inadimplentes do Brasil, com média de 12%, contra 29% no âmbito nacional. Essa subemenda não visa dificultar a vida de ninguém, apenas a do mau pagador. Além disso, o artigo 183, que trata do prazo de 30 dias, é inconstitucional, conforme Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) sobre um caso semelhante em São Paulo”.

A tentativa de reduzir esse prazo para cinco dias, no entanto, ainda que precedida de notificação “efetiva”, comprometeria o equilíbrio contratual e a função social do crédito. Vejo que o crédito não pode ser tratado como arma de coerção. Isso porque, o inadimplemento, em muitos casos, decorre de fatores socioeconômicos complexos. E temos então o desemprego, endividamento estrutural, desinformação, e não simplesmente a má-fé.

JURISPRUDÊNCIA E SEGURANÇA JURÍDICA

É verdade que há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) tramitando contra uma lei semelhante de São Paulo, conforme pontua Fabio Oliveira. Mas não há decisão definitiva do STF que inviabilize a regra paranaense.  Mas enquanto isso, vigora o entendimento de que os estados podem, sim, legislar de forma suplementar em matéria de consumo, conforme a própria Constituição (art. 24, VIII).

A proposta derrotada geraria insegurança jurídica, aumentando a judicialização por negativação abusiva e acelerada. Uma situação que colocaria em risco conquistas recentes da política estadual de proteção ao consumidor. Mais do que isso: exporia os mais vulneráveis a práticas de cobrança predatórias, com impactos que vão além do CPF. Pois comprometem o acesso à moradia, emprego e dignidade.

O QUE ESTÁ EM JOGO

O projeto original (659/2024), que trata de temas importantes como empréstimos consignados e transparência na rotulagem de produtos, foi aprovado com ajustes pontuais. Mas a subemenda derrubada mostrou um ponto de alerta: há quem veja o consumidor não como sujeito de direitos, mas como entrave ao mercado.

Felizmente, desta vez, o bom senso venceu. Mas a tentativa deixa claro que a vigilância deve continuar. Proteger o consumidor não é um capricho. Trata-se, sim, de uma exigência constitucional e civilizatória.

Leia outras notícias no Portal RSN.

Cristina Esteche

Jornalista

Relacionadas

A missão da RSN é produzir informações e análises jornalísticas com credibilidade, transparência, qualidade e rapidez, seguindo princípios editoriais de independência, senso crítico, pluralismo e apartidarismo. Além disso, busca contribuir para fortalecer a democracia e conscientizar a cidadania.