22/08/2023
Blog da Cris Guarapuava

De Alcatraz à realidade de Guarapuava

Não existe lugar mais bizarro do que uma prisão desativada. O ar é pesado, as paredes ecoam histórias que não foram contadas

Alcatraz (Foto: Cristina Esteche/RSN)

Não existe lugar mais bizarro para se visitar do que uma prisão desativada. O ar é pesado, as paredes ecoam histórias não contadas e a umidade gruda na pele. Visitar a ilha de Alcatraz, na baía de San Francisco, na Califórnia, é uma experiência única. Caminhar pelos corredores da prisão mais famosa do mundo é sentir o frio que os presos sentiam, um frio que não é apenas do vento que entra pelas pequenas janelas, mas da alma.

O que mais me impressionou em Alcatraz foi a solidão. A ilha era o fim da linha para os criminosos mais perigosos dos Estados Unidos. Uma prisão perpétua. Ali, a proximidade com a cidade de San Francisco, tão vívida e cheia de luzes, era a maior tortura. Eles podiam ver, ouvir, mas jamais tocar. Era o tipo de contraste que te faz pensar em como a liberdade é valiosa. Ouvi o depoimento gravado de um dos presos. E ele diz que a maior tortura eram as festas de Ano Novo, com luzes, festas, brindes e, principalmente, famílias.

Al Capone (Foto: Cristina Esteche/RSN)

Alcatraz era o lar de lendas do crime, como Al Capone, o mafioso de Chicago, e George “Machine Gun” Kelly, um dos sequestradores mais famosos da década de 1930. A história deles foi contada, romantizada em filmes e livros. Eles eram criminosos, mas também eram ‘famosos’. A prisão era um palco para figuras que se tornaram símbolos daquele tempo sombrio.

Leon ‘Whitey’ (Foto: Cristina Esteche/RSN)

UMA REFLEXÃO

Essa visita me fez refletir sobre a história de outras cadeias, inclusive as que conhecemos de perto. Em Guarapuava, a Cadeia Pública não é um fantasma de concreto, mas uma realidade que continua a operar. O prédio no centro da cidade, diferentemente da extinta Alcatraz, está em plena atividade. E o que mais impressiona não é o silêncio, mas o murmúrio constante de um local onde as pessoas são ‘empilhadas’ umas sobre as outras.

Uma cela para cada preso (Foto: Cristina Esteche/RSN)

Uma cela para cada preso (Foto: Cristina Esteche/RSN)

A diferença entre as duas prisões é gritante. Enquanto a lendária Alcatraz abrigava criminosos que se tornaram notórios, a realidade da cadeia de Guarapuava, e de tantas outras no Brasil, é o oposto. Ali, as celas estão cheias de pessoas anônimas, os invisíveis de nossa sociedade. As histórias de cada um são raramente contadas, e as vozes, abafadas pela superlotação e pela falta de dignidade. A cadeia de Guarapuava não tem figuras cinematográficas, mas tem a realidade crua da degradação humana, uma tortura diária que contrasta com o passado glamouroso da prisão americana.

Pátio em Alcatraz (Foto: Cristina Esteche/RSN)

A analogia, então, se torna inevitável. Ambas guardam em suas paredes a memória de pessoas que perderam a liberdade. Em Alcatraz, a umidade e o bolor são a prova do tempo e do isolamento. Em Guarapuava, a degradação humana e a superlotação são uma realidade dolorosa, uma história que ainda está sendo escrita.

São lugares que nos lembram de um passado sombrio, mas também nos fazem valorizar o presente. O contraste entre uma prisão histórica desativada e outra que opera em condições precárias serve como um lembrete do valor da liberdade e da necessidade de dignidade para todos.

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Cristina Esteche

Jornalista

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