22/08/2023
Política

Norma antimanicômios é descumprida no país, diz autor de lei no Paraná

Da redação (com assessoria) –  Responsável legal pela disponibilização de serviços alternativos ao internamento psiquiátrico, o poder público não vem cumprindo nos últimos anos a legislação relativa à saúde mental. A constatação é do deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), autor da lei antimanicomial do Paraná, em vigor desde 1995.
"As prefeituras, instâncias do poder público responsáveis por providenciar serviços como os centros de atendimento psicossocial e as casas-abrigo, além de não cumprirem a lei, às vezes tentam até culpar os militantes antimanicomiais pela falta de atendimento psiquiátrico, o que é um absurdo", observa Dr. Rosinha.
Médico pediatra, Dr. Rosinha lembra que a luta antimanicomial é uma luta contra a segregação desses pacientes em hospitais exclusivos, similares a asilos. "Ao invés do isolamento, as pessoas com transtorno mental precisam de atenção familiar, de carinho, de compreensão”, afirma o deputado federal. “O internamento só é recomendado em casos agudos."
"O novo modelo de atenção em saúde mental consistirá na gradativa substituição do sistema hospitalocêntrico de cuidados às pessoas que padecem de sofrimento psíquico por uma rede integrada de variados serviços assistenciais de atenção sanitária e social", diz o artigo 2º da lei estadual de número 11.189, em vigor há 15 anos e resultado de uma iniciativa do então deputado estadual Dr. Rosinha.
Entre os serviços citados pelo artigo estão hospitais-dia, centros de convivência, centros comunitários, centros de atenção psicossocial, lares abrigados e leitos psiquiátricos localizados dentro de hospitais gerais.
A mesma lei previa uma reavaliação, no prazo de três anos, de todos os hospitais psiquiátricos e do próprio ritmo de implantação da nova norma, o que, segundo Dr. Rosinha, jamais foi feito. Há atualmente cerca de 35 mil pessoas internadas em hospitais psiquiátricos no Brasil.

Lei federal
Até a década de 1970, o Brasil adotava o método asilar de tratamento dos chamados “loucos” – uma prática herdada do período imperial. Parte do movimento da reforma sanitária, a luta antimanicomial ganharia força nas décadas seguintes ao questionar esse tratamento e defender os direitos fundamentais dos pacientes.
Aprovada após doze anos de tramitação no Congresso Nacional, a lei federal 10.216, de 2001, estabelece que a pessoa portadora de transtorno mental tem o direito de ser tratada com humanidade e respeito, pelos meios menos invasivos possíveis e, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. O objetivo da legislação é alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade.
De autoria do deputado petista Paulo Delgado (PT-MG), a lei restringe os casos de internamento apenas aos casos em que os recursos extra-hospitalares se mostrem insuficientes.

Ação multiprofissional
Segundo dados do Ministério da Saúde, existem hoje cerca de 1,5 mil Centros de Atenção Psicossocial (Caps) espalhados pelo país. "Esse número é três vezes maior do que o total de unidades existentes em dezembro de 2003, quando havia apenas 500 centros, mais ainda é insuficiente", aponta Dr. Rosinha.
Os Caps são serviços de saúde municipais, abertos, comunitários que oferecem atendimento diário. Entre suas funções estão evitar as internações em hospitais psiquiátricos, preservar os laços sociais dos pacientes e promover sua inserção social.
Esses centros precisam de equipes multiprofissionais de saúde formadas, entre outros especialistas, por médicos psiquiatras e clínicos, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e neurologistas, além de pessoal auxiliar.
"A não regulamentação da Emenda 29, que trata do financiamento da saúde pública, e a extinção abrupta da CPMF, patrocinada de forma leviana pela oposição a Lula em 2007, e que acabou por retirar R$ 40 bilhões anuais do SUS, são fatores que hoje dificultam a ampliação desse atendimento”, aponta Dr. Rosinha.

Alta demanda
Estima-se que cerca de 3% da população brasileira, em todas as faixas etárias, necessite de cuidados contínuos em saúde mental, em função de transtornos mentais severos e persistentes.
Outros 9% têm transtornos mentais considerados leves. Já transtornos graves associados ao consumo de álcool e outras drogas atingiriam pelo menos 10% da população acima de 12 anos. "A demanda por atendimento é muito alta", atesta Dr. Rosinha. "Vale lembrar que o tratamento dos dependentes de drogas como o crack faz parte dessa política nacional de saúde mental."
Entre os dias 27 e 30 do próximo mês de junho, o governo federal realizará a 4ª Conferência Nacional de Saúde Mental. A última ocorreu em 2001. O tema geral da conferência é o seguinte: "Saúde Mental – Direito e Compromisso de Todos: Consolidar Avanços e Enfrentar Desafios".

Cristina Esteche

Jornalista

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