22/08/2023
Cotidiano

Sem apoio, morador constrói parque infantil para a comunidade

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Da redação – “Seo” Aníbal Moreira, 69 anos, é um cidadão comum, dono de uma micro-empresa na Avenida Moacyr Julio Silvestri. É um trabalhador como a maioria dos guarapuavanos. Levanta bem cedo todos os dias para poder chegar cedo no trabalho. Mora longe do centro da cidade, lá no Residencial 2000, um bairro que a exemplo dos demais, necessita de muitas melhorias.
O projeto inicial prometia creches, ruas pavimentadas, áreas para esporte e lazer, farmácias, supermercados, entre outras benfeitorias, mas muito nada disso saiu do papel.
Morador no conjunto há 10 anos, Moreira resolveu fazer a sua parte quando viu que não havia nenhuma atividade recreativa que ocupasse o tempo vago de seus filhos.
No lugar onde havia mato em frente a sua casa construiu um parquinho infantil e um campo de futebol. Os brinquedos foram feitos artesanalmente, a maioria de madeira. A limpeza e a manutenção do parque chamam a atenção. “Não tenho o apoio de ninguém e cuido de tudo isso nos finais de semanas”, diz.
A rotina que se repete há cinco anos possibilita que crianças da comunidade e da própria escola municipal tenham espaço para aulas de educação física, para projetos oficiais existentes no Residencial 2000.
“Há quatro meses fiquei doente e o mato tomou conta do local. Paguei uma pessoa para fazer a limpeza e a nossa maior reivindicação é o apoio da Prefeitura”, relata.
Enquanto fala do seu trabalho como voluntário, Moreira se divide entre expressões de prazer pelo que faz e de revolta. “Só somos procurados em tempo de eleição. No resto do tempo fazemos as coisas sozinhos”, diz.
Além da manutenção dos brinquedos que são danificados por vândalos e da limpeza do parque e do campinho de futebol, Moreira ainda encontra tempo para organizar torneios e só não realiza mais coisas por falta de iluminação no local. “O que a gente quer é que o núcleo se desenvolva porque hoje este local está perdido, abandonado pelo Poder Público, não recebemos nenhuma atenção. Esperamos que o próximo prefeito lembre que o nosso núcleo existe”, diz.
“Moro aqui há três anos e gosto do lugar. É tranqüilo, tem escola e posto de saúde, mas a melhor coisa que temos aqui é o parquinho feito pelo ‘seo’ Moreira. Ele planta árvores, constrói e arruma os brinquedos e não é presidente da associação e nem político”, diz Sheila Ramos de Siqueira.
A exemplo de outros bairros da cidade, de acordo com moradores, a Associação Comunitária está sem comando. “A diretoria brigou e ficou dividida. Acho que existem duas associações, mas ninguém faz nada”, reclama João Ferreira da Silva. Nenhum dos entrevistados soube dizer quem é o líder comunitário.

“Propaganda enganosa”
“Somos vítimas de uma propaganda enganosa”, diz Dona Rosália do Amaral referindo-se ao projeto inicial da Caixa Econômica Federal em parceria com a Prefeitura. O núcleo foi criado na primeira gestão do ex-prefeito Vitor Hugo Burko para ser um modelo de conjunto residencial. Ruas pavimentadas, creche, supermercado, áreas para lazer, farmácia, escola, eram algumas benfeitorias que prometiam ser executadas junto com a construção das …… casas.
Cerca de 3 quilômetros distante do centro da cidade, o Residencial 2000 é um “recorte” da área urbana do município e não é apenas a falta de apoio ao projeto voluntário desenvolvido por Aníbal Moreira que ronda o Residencial 2000.
Mesmo sofrendo com o pó e com o barro os moradores garantem que há anos pagam por um serviço que não usufruem. “Todos os meses pagamos a prestação da casa e a taxa da pavimentação asfáltica e as ruas nunca foram asfaltadas”, diz uma funcionária da Escola Municipal Luiza Pawelina (pediu para não ser identificada com receio de possíveis represálias). O gerente geral da Agência da Caixa Econômica Federal em Guarapuava, Delcio José Bevilaqua disse à TRUBUNA que a Caixa cobra apenas o valor da prestação e que desconhece qualquer cobrança de taxa por pavimentação asfáltica, mas informa que o índice de inadimplência dos mutuários é alto.
Outra funcionária da escola reclamou da falta de creches. “Quando compramos as casas havia a garantia de que haveria creche. Eu moro e trabalho aqui e tenho que levar minha filha lá na creche do Morro Alto e só tem ônibus de uma em uma hora. Não podemos continuar vivendo deste jeito. Pagamos impostos, pagamos por asfalto que não temos”, reclama.
A falta de segurança pública também é realidade no Residencial 2000 e facilita o consumo de drogas, a prostituição infantil, furtos e roubos. “Somente numa semana tivermos 5 casas arrombadas e se você entrar nesses matos que tem pó aí vai pegar menininha da escola com marmanjos de mais de 20 anos”, diz a funcionária municipal.
Se as ruas as ruas do núcleo tem denominações das várias atividades profissionais, num contraponto a essa homenagem, o “fantasma” do desemprego atormenta os moradores. “Não temos nada aqui que gere emprego. Dependemos do centro da cidade e de outros bairros, mas como na cidade não há vagas o jeito mesmo é deixar a família aqui e ir trabalhar em Santa Catarina ou em São Paulo”, lamenta o pedreiro Paulo dos Santos Almeida.
“Não temos nada aqui. Continuamos sendo vítimas da mentira, das promessas que nunca foram cumpridas. Vivemos isolados do resto da cidade como se a gente fosse marginal”, afirma dona Iracema Ferreira da Silva.

Ruas esburacadas mesmo pagando o asfalto que não existe
Com muitas áreas ociosas, algumas das quais destinadas para reservas florestais, espaço para revitalização de lagos, o Residencial 2000 fica vulnerável a ocupações irregulares.
Na Rua dos Pintores é possível ver a construção de casinhas simples com patentes nos fundos e esgoto a céu aberto. “Se a gente não pagar a prestação perde a casa. Fiquei desempregado por um tempo e minha casa estava indo a leilão. Como essas pessoas invadem os terrenos, não pagam nada e ninguém toma providências”, questiona Reinaldo Correa que mora no local há 11 anos.
“As pessoas são boas, a gente não tem nada contra, mas não dá pra agüentar o cheiro das patentes que invade a nossa casa”, comenta uma senhora pedindo que seu nome não seja identificado para não se indispor com os vizinhos.
Moradora num terreno “ocupado” há três anos, dona Roseli de Lima Padilha disse que foi colocada lá pela Secretaria Municipal de Assistência Social. “Eu morava na favela da Volta Redonda num barraco de lona e a Assistência Social me trouxe para cá”, conta. Na casa pequena mora ela, o esposo que é pedreiro desempregado e um filho. Dona Roseli não paga nada pelo terreno.

Cristina Esteche

Jornalista

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