22/08/2023
Paraná

A miséria política desnudada

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A sessão da Câmara que aprovou a continuidade do processo de impeachment da presidenta Dilma foi uma demonstração cabal da miséria política brasileira.

Num processo contaminado pela ofertas de cargos, por denúncias de que não faltaram jatinhos de empresas voando os céus do Brasil para transportar deputados para votarem a favor do impeachment, as declarações de voto de grande parte dos deputados em nome de Deus, da família, dos filhos, cães e outros animais, corrobora a miserabilidade política.

O triste espetáculo protagonizado pela maioria dos deputados é fruto da falência do sistema de partidos , caracterizados pela insustentável ausência de caráter político, de caráter ideológico e ético. É nesta lógica que se destaca de forma natural e autêntica a liderança de Eduardo Cunha. Somente assim é que se pode compreender o papel do PMDB, o partido do vice-presidente da República e do próprio Cunha, como o mais eficiente instrumento da oposição parlamentar e responsável pelas mais significativas derrotas do governo de Dilma Rousseff.

O resultado da votação deste domingo também pode ser interpretada nas palavras do ex-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral como “o cadinho da mais grave e perdurante de nossas crises, a crise da representação, que, a um só tempo, tem origem e consequência na crise dos partidos políticos. Esta é a raiz da crise maior e mais profunda, e mais preocupante, a crise do fazer político, insinuando, lá adiante, no final do túnel, uma crise institucional de configuração indefinida aos nossos olhos de hoje”.

E a quem caberá restaurar o poder democrático baseado numa reforma política patrocinada por uma Constituinte Exclusiva e Soberana que, entre outras medidas, estabeleça uma nova configuração partidária? Aos atuais deputados e senadores, sem  condições políticas e morais de convocá-la? É como observa Amaral: “Não se pode esperar que legislem abolindo os vícios e as mazelas do sistema eleitoral que asseguraram suas eleições! Daí o reino da miséria da política, a política das verbas e das ‘verbinhas’ arrancadas do erário – mediante todos os meios, inclusive a chantagem –, e negociadas com empreiteiras e a administração pública em seus diversos níveis, daí as ‘comissões’, as gorjetas, os subornos, as extorsões, as propinas. Esse sistema rejeita qualquer aprofundamento do processo democrático, como sinaliza a iniciativa popular na propositura de projetos de lei, o exercício do plebiscito e do referendo, e a revogação do mandato, o primeiro caminho para estabelecer a identidade entre o eleitor e o eleito”.

Mas, enfim, o Brasil tem agora o seu Berlusconi, o ex-chefe de governo italiano que mesmo com todos os crimes cometidos manipulou enquanto pode o Parlamento daquele país. Eduardo Cunha, o grande articulador do golpe, venceu uma importante batalha. E com todo seu determinismo golpista, baseado na vingança e na possibilidade de escapar de sua própria cassação através do conluio firmado com o vice Michel Temer, sua expressão de frieza mesmo quando é chamado de gângster, canalha e outros adjetivos, demonstra o perigo do país cair nas mãos de verdadeiros psicopatas.

A guerra ainda não terminou. O vice Michel Temer, que entende de traição como ninguém, embora difícil, ainda pode sofrer um revés no Senado , onde o debate tem condições de fluir de forma mais racional tendo por base os dois pontos que o Supremo Tribunal Federal entendeu como objeto da acusação que deu origem à instalação do processo de impeachment: as chamadas pedaladas fiscais e os decretos de suplementação orçamentária assinados pela presidenta. Finalmente, restaria ainda recurso ao STF sobre a improcedência da denúncia. E se nada disso der certo, o Brasil estará mergulhado em tantas incertezas, das quais não escampam nem Temer, nem Cunha, nem Renan Calheiros, afinal um vai querer o lugar do outro. Neste sentido a advertência do escritor Luis Fernando Veríssimo de que com esta linha sucessória Temer corre o risco de pegar uma forte gripe, escorregar em alguma escada, comer uma refeição estragada, deve  ser considerada:

Em todo o caso, repito, o que assistimos no último domingo foi a revelação da miséria da política nacional comandada por um gângster sem escrúpulos que atua em concubinato com um traidor ardiloso, ambos  sem o menor compromisso com a democracia e com os interesses maiores da cidadania.

Não podemos arriar nossas bandeiras. Continuamos na luta!

(*) Luiz Fernando Esteche é jornalista e publicitário, graduado em Martketing e assessor parlamentar.

Cristina Esteche

Jornalista

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