22/08/2023
Cotidiano Geral Guarapuava

Ela já sentiu as dores e amores de ser mãe. Um relato pessoal de Miriam

Miriam Baitel é doula e mãe de três filhos. Após ter a experiência de uma cesariana e um parto normal, a ativista relata o parto domiciliar

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Ela já sentiu todas as dores de ser mãe. Um relato de parto domiciliar (Foto:Dani Leela)

A doula Miriam Baitel, mãe de três, sente no coração a dor de ter devolvido a primogênita Mariana à Terra-Mãe. Porém, a natureza divina lhe deu João e agora Luan.

Ativista a favor do parto domiciliar, a pedido do Portal RSN, neste Dia das Mães, Miriam Baitel faz relato de como foram os últimos momentos para o nascimento de Luan.

RELATO DE UM PARTO DOMICILIAR

“Quando descobri que estava grávida, foi um grande susto. Não estava nos meus planos ter mais um bebê, mas com certeza estava nos planos de Deus. Inicialmente foi difícil aceitar. Aliás, assumo que nos primeiros meses existiu muita rejeição e espero que ele, Luan,  consiga me perdoar.

A aceitação veio com 28 semanas, quando o médico me contou o sexo do bebê. Deus me deu a oportunidade de ressignificar meus partos anteriores. Com isso, eu poderia parir de forma natural, na intimidade do meu lar, do jeito que eu acredito ser o melhor para a mulher, para o bebê e toda a família.

Assim, tive uma gestação saudável. Consegui trabalhar até as 36 semanas, quando os incômodos e inchaços começaram aumentar. Porém, no finalzinho precisei de cuidados especiais, devido a alguns picos de pressão e uma anemia severa. Sempre estive muito bem assistida pela minha parteira e meus amigos terapeutas, uma equipe incrível.

TUDO PELO SUS

Renan, Miriam e Jo (Foto: Dani Leela)

Vale contar, que meu pré-natal foi feito 100% no SUS, e fui muito bem atendida. As consultas eram mensais, uma com a enfermeira, outra com clínico geral. Não tive acompanhamento de ginecologista obstetra.
Minha decisão pelo parto domiciliar era acolhida e abraçada tranquilamente pelo meu companheiro e toda minha família. Em momento algum senti medo de parir em casa. Muito pelo contrário, era meu maior desejo e tive muita segurança com relação a essa escolha.

Afinal, em 2010, nasceu minha primeira filha, a Mariana, de parto normal com todo arsenal de intervenções, incluindo uma episiotomia. Em 2012, nasceu o João, através de uma cesárea, após início de TP (7cm de dilatação) devido a posição pélvica (sentado).

Ou seja, estava buscando um parto vaginal após uma cesárea, que muitos profissionais dizem não ser possível. É a famosa frase: Uma vez cesárea, sempre cesárea.

Estudei muito, tive comunicação com vários profissionais que são referência em humanização e com relação a isso sempre tive muita tranquilidade. Me preocupava um pouco com a episiotomia anterior, por uma possível laceração elevada, esse era meu maior receio. Pois, alguns estudos relatam uma possibilidade maior de laceração grande após esse procedimento desnecessário e considerado violência obstétrica.

Meus partos anteriores aconteceram com 38 e 37 semanas respectivamente, o que pensei que me deixaria ansiosa se passasse das 38 semanas. Mas não aconteceu, estava paciente esperando o tempo do meu bebê.
Minha irmã veio acompanhar a espera conosco. João, meu filho mais velho estava muito feliz por isso também.

Jo e Renan, diariamente faziam massagem nas minhas pernas antes de dormir, pois eu sentia bastante dor devido aos edemas.

CHÁ DE BENÇÃOS

O corte do cordão umbilical (Foto: Dani Leela)

Com 36 semanas eu fui abençoada com um chá de bênção, recebi a energia de mulheres maravilhosas que eu amo demais, foi um momento inesquecível que eu realmente não imaginei que viveria nesta existência.

A partir da 37 semanas, eu já sentia muitos incômodos, a pressão na pelve era intensa e as noites eram de muitas idas ao banheiro. Passamos das 38 semanas, também quebrando o mito de que depois do primeiro os outros filhos adiantam. Cada bebê tem um tempo.

Na sexta-feira, dia 31 de janeiro, fizemos uma fogueira, rezamos e cantamos, entreguei ali todas as expectativas. Depois disso, tomei um banho, já era mais de 22 horas quando me arrumei para deitar, senti algo escorrer pela minha perna até o pé. Fui ao banheiro e observei mais uma parte do tampão, que já estava saindo a mais de 15 dias.

Na manhã do dia 1⁰ de fevereiro estava previsto um exame, para verificar minha hemoglobina, o resultado seria a chave do meu parto em casa ou não. Sabia que não podia parir antes disso.

AS CONTRAÇÕES

(Foto: Dani Leela)

Foi uma noite intensa, de muitas contrações, na última ida ao banheiro às 5h, já não voltei para cama. Às 7h fomos ao laboratório colher meu sangue, voltamos para casa, organizei umas roupas para lavar e expliquei as funções da máquina para minha irmã. Nesse momento, as dores já estavam bem mais intensas, mas ainda quis ir ao mercado comprar umas coisas.

Voltei e me deitei com as pernas elevadas, recebi a visita de uma amiga/doula que pariu dois bebês em em casa com o meu acompanhamento.

Assim, as dores já estavam fortes. Lembro de parar para respirar durante para suportar a dor enquanto conversávamos, ela fez massagem nos meus pés, o que me trouxe relaxamento e tranquilidade.
Quando foi embora, decidi levantar para me alimentar.

Observei que as contrações estavam vindo num ritmo contínuo, mas ainda não quis cronometrar. Pensei que tinha que me alimentar caso o trabalho de parto estivesse começando, decidi fazer um suco de laranja. Então, tive duas contrações fortíssimas, e resolvi marcar o tempo entre elas. Estavam vindo de cinco em cinco minutos.

Entrei no site do laboratório e meu exame estava muito bom. Às 11h45 enviei o resultado para minha enfermeira obstétrica e avisei que as contrações estavam animadas.

Resolvi também avisar a Tati (enfermeira que auxiliaria a Cris). Além disso, a Leela minha fotógrafa maravilhosa e meu primo que faria a filmagem, para que eles soubessem que talvez seria naquele final de semana.

TRABALHO DE PARTO

(Foto: Dani Leela)

Estávamos nos preparando para almoçar na casa dos meus pais, e só então eu percebi que realmente já estava em trabalho de parto. Tivemos que dar uma desculpa e cancelar o almoço. Eu não queria que eles soubessem, para não rolar ansiedade ou medo, já que poderia demorar bastante. Renan também precisou cancelar a agenda de trabalho.

(Foto: Dani Leela)

Durante as contrações eu já vocalizava, mexia o quadril de um lado pro outro e não conseguia conversar. Numa dessas, a bolsa estourou de uma só vez, o que fez o João se assustar e pedir para ir com o pai (era um sábado ensolarado, dia de futebol).

Confesso que minha primeira reação foi péssima, tentei até convencer ele a ficar, mas liberei e trabalhei essa frustração. Tínhamos combinado muitas coisas juntos para esse momento, mas não poderia forçar ele ficar e nem deixar que essa frustração prejudicasse o bom andamento do TP. E, ele foi.

Avisei a Cris sobre a bolsa que estourou 12h7, e todos que estariam junto com a gente. Minha irmã e o Renan começaram organizar as coisas e eu fui tomar um banho.

Lembro claramente que no momento que entrei embaixo do chuveiro eu me entreguei ao trabalho de parto.
A Cris chegou, e eu preciso relatar a segurança que essa mulher transmite, uma parteira sensacional, o olhar dela trás paz e acolhimento.

Não queria que ela ficasse a toa esperando, eu ainda achava que ia demorar, decidi fazer um auto-toque, ainda alto, mas já pude sentir a cabeça do meu bebê. Assim, relatei sobre o auto-exame para a Cris, ela sorriu e positivou com a cabeça, sem nenhuma palavra, mas oferecendo um apoio infinito.

Ela ouviu o coração do bebê, tudo estava bem. Depois disso, eu não conseguia mais me comunicar.

O NASCIMENTO

Pedi para chamarem o Renan, queria ele comigo e agora já sabia que nosso bebê estava chegando.
Consegui ouvir músicas tocando. Renan conseguiu entrar no box do banheiro comigo e logo senti o bebê coroar, senti muito forte o círculo de fogo e nesse momento, tensionei todo meu corpo e me desesperei.

Nesse momento, o Renan respirou comigo e me incentivou a relaxar. Quando consegui relaxar o bebê nasceu, escorregando por mim de uma vez só, vindo direto pro meu colo.

Nesse momento consegui olhar para as pessoas que estavam comigo, todas estavam felizes e emocionadas, lembro nitidamente que através do olhar da minha irmã enxerguei muita alegria, merecimento e gratidão. Aiai!

Fomos para um quartinho improvisado ao lado do banheiro e ali passamos as primeiras horas do pós-parto. Nossa conexão, amamentação na primeira hora de vida, um descanso e depois o bebê seria examinado.

Luan nasceu no chuveiro às 13h07 do dia (1) de fevereiro, pesando 2900g com 50cm. Renan, o pai, cortou o cordão depois de uma hora de nascimento, não sei quanto tempo demorou para placenta nascer, sei que foi bastante, mas nasceu naturalmente.

Tivemos contato pele a pele por muitas horas sem nenhuma intervenção. Brindamos com suco de clorofila, tirei selfie para contar para todo mundo sobre o nascimento e liguei para meus pais.

Meus pais chegaram para conhecer o novo netinho e já trouxeram uma sopinha deliciosa. Ao final do dia, com um lindo pôr-do-sol, chegou o João, para conhecer o irmão e imediatamente se tornar o piázinho que mais recebe sorrisos desse bebê que trouxe luz para nossas vida.

Parir em casa é paz e amor!

Gratidão”.

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Cristina Esteche

Jornalista

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