De decepção em decepção o STF vai levando para a cova sua questionada reputação.
Oito ministros da Corte Suprema já tinham decidido pela restrição ao odioso foro privilegiado dos deputados, senadores e ministros, quando houve pedido de vista (adiamento) pelo Ministro Dias Toffoli, que no domingo anterior esteve no Palácio do Jaburu (encontro fora da agenda) e na seguinte quinta-feira (23/11/17) se curvou aos interesses das oligarquias políticas dirigentes, que não querem ver restringido o privilégio do foro no STF, posto que fonte segura de impunidade e abrigo da clepto-bandidagem.
Em quase 4 anos de Lava Jato, Moro na primeira instância já aplicou mais de 1.700 anos de cadeia para empresários inescrupulosos e políticos corruptos. O STF, no mesmo período, recebeu seis denúncias e nenhuma delas está pronta para julgamento. Ainda se diz, na Corte, na maior cara de pau, que a lentidão do STF é “lenda urbana”.
O problema maior nessa fase de desmoralização decepcionante do STF não reside no pedido de vista, e sim, no deslavado descumprimento do prazo do Regimento Interno para devolução do processo. Depois de duas sessões a mesma matéria deveria voltar para a pauta. Alguns ministros, no entanto, na cara dura, quando querem protelar subservientemente um assunto de interesse das elites cleptocratas, chegam a segurar o caso por anos.
Vamos a um exemplo. Na questão do fim do financiamento empresarial de campanhas eleitorais, Gilmar Mendes protagonizou mais um dos seus “saltos triplos carpados” e ficou com o processo mais de um ano em sua gaveta. Aquilo não foi “pedido de vista”, foi, na verdade, um “perdido de vista”.
É certo que a Câmara dos Deputados já aprovou na Comissão de Constituição e Justiça proposta de extensão maior, que prevê o fim do foro privilegiado (ressalvando-se apenas o presidente, o vice e os presidentes da Câmara, do Senado e do STF). Mas quem garante que haverá decisão rápida no Plenário da Câmara?
No novo posicionamento da Corte (o foro só valeria para crimes cometidos no exercício do mandato ou a ele relacionados) há pontos que ainda precisam ser esclarecidos (se ele vale ou não, por exemplo, para fatos anteriores ou só para fatos ocorridos depois da publicação do acórdão). De qualquer modo, restringir o foro privilegiado, até que se aprove o seu fim, é uma forma de tirar do STF centenas de investigações e processos criminais (fala-se em 90% dos casos) que por lá tramitam morosamente.
O deplorável foro privilegiado é resquício da nossa má formação histórica (a chamada civilização “atlântica”, eminentemente medieval, é uma das mais perversas de toda a humanidade). Nesse modelo de sociedade as pessoas são divididas em gentes, subgentes e supergentes, conferindo às últimas regalias flagrantemente incompatíveis com o Estado republicano.
Por força dessa grave anomalia mais de 45 mil pessoas contam com foro privilegiado no Brasil. Quase oito centenas desfrutam da escandalosa imunidade proporcionada pelo STF. Só numa cleptocracia de quinto mundo é visto esse tipo de exagero e de anomalia.
Ponto alto do novo pensamento do STF, desencadeado a partir do voto condutor do ministro Luís Roberto Barroso, é a impossibilidade de mudança da sua competência quando o processo chega na fase das alegações finais.
A partir daí o foro não mais de altera e isso evita a pouca vergonha de o parlamentar renunciar ao seu mandato nas vésperas do julgamento, provocando a alteração da competência.
Foi isso que ocorreu, por exemplo, no caso do tucano Eduardo Azeredo (ex-governador de MG), até hoje não condenado definitivamente pelo mensalão tucano (que ocorreu no final dos anos 90). Os tucanos acusados de corrupção (também esse grupo de degenerados não é pequeno, como se sabe) desfrutam na Justiça brasileira de superregalias.
O tucanato delinquente (nem todos eles o são, evidentemente) forma uma espécie de “crème de la crème” da podridão e devassidão das elites dominantes e dirigentes. Esses delinquentes no Brasil são os que mais se aproximam das imunidades absolutas dos capitães hereditários para cá mandados como vassalos (dos seus senhores feudais) em 1532-1534.
Temos que reescrever a história do Brasil. Já não toleramos a conivência da Justiça com os perversos bandidos que nos roubam diariamente mais de R$ 600 milhões. A faxina geral desses “senhores da corrupção” é imperativo e inadiável pelo brasileiro em 2018.
(*) Luiz Flávio Gomes, jurista. Criador do movimento Quero Um Brasil Ético. Estou no F/luizflaviogomesoficial