22/08/2023
Cotidiano Guarapuava

“É muito triste ver a pessoa morrer e não poder fazer nada”

Médicos e enfermeiros falam sobre a impotência perante o terror espalhado pela covid-19. E há críticas sobre "crueldade" em redes sociais

upa do batel covid

Pessoa intubada luta pela vida (Foto: Upa do Batel)

Só quem acompanha a luta de uma pessoa nos bastidores da pandemia nas unidades de saúde pode dimensionar a gravidade da situação. Assim sendo, o Portal RSN mostra um pouco do cotidiano de profissionais de saúde, pacientes e familiares.

Entrar na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Primavera, entre a manhã e o começo da tarde de domingo (24), foi rever o que já tinha presenciado na UPA Batel, há dias. Enquanto a sala de espera em poucos minutos estava lotada, dois médicos atendiam a demanda.

Estamos vivendo uma catástrofe. Não sabemos mais o que fazer. As equipes estão além dos próprios limites. Eu comecei o plantão no sábado [23] à noite e não tive tive tempo de jantar. Dessa maneira, virei a noite e ainda não consegui comer [era por volta das 13h]. Não há tempo a perder.

O desabafo do médico é feito sem que ele tire os olhos do computador. Sendo assim, é preciso monitorar tudo, preencher formulários, conversar com o paciente.

O sentimento de inutilidade é muito grande. É horrível você ver a pessoa morrer nas tuas mãos e não poder fazer nada. Na semana passada perdi dois pacientes conhecidos. A vontade que tive era bater com a minha cabeça na parede.

Familiares oram e aguardam notícias (Foto: Secom/Prefeitura de Guarapuava)

A ESPERA

Na sala de espera, familiares chegam amparando a pessoa doente. Há angústia no olhar de cada um. No painel eletrônico na parede de 15 em 15 minutos uma pessoa é chamada para o acolhimento. Em seguida, novo momento de espera até a consulta com o médico. Depois, o exame. Três horas se passam, o diagnóstico. É a luta insana da vida contra a sentença de morte decretada pela covid-19. O antídoto? Não custa nada: distanciamento social, máscara e higiene.

Entretanto, o cenário mostra ao contrário. No corredor, profissionais de enfermagem vão e voltam.  Há pacientes intubados; outros, em estado não menos crítico, esperam por um sopro, um pouco de ar, mesmo que seja mecânico. Do lado de fora, em tendas, familiares oram, esperando por notícias.

A nossa vida está sendo assim há mais de um ano. Estamos saturados, mas essa é a profissão que escolhemos. No entanto, nem na faculdade me contaram que havia pandemia.

Conforme a profissional, a situação piora a cada dia. “E mesmo assim as pessoas fazem de conta que não acontece nada. Vão pras baladas, se aglomeram e espalham esse terror que está aí”.

“HÁ PESSOAS CRUÉIS”

Há desinformação pelas redes sociais (Foto: Arquivo/RSN)

Entretanto, segundo uma das profissionais de saúde, o mal maior está na “crueldade” de pessoas.

Há pessoas que ficam dentro de casas confortáveis disseminando o ódio, inverdades, num momento de caos. Então, estamos num momento em que devemos nos unir. Portanto, um cuidar do outro, ajudar.

Conforme a enfermeira, por que ao invés de ficarem tentando alimentar o ego e interesse pessoal, não procuram ajudar? “Há pessoas sofrendo, precisando de amparo. Nós estamos cansados, fragilizados e ainda temos que ler os absurdos que são postados”.

UPAS

Monitoramento (Foto: Secom/Prefeitura de Guarapuava)

Nas duas de três UPAs a semana começou com novos casos. De acordo com a Secretaria de Comunicação Social (Secom), da Prefeitura, na tarde dessa segunda (24), 18 pessoas testaram positivo e estavam em observação. Além disso, outras três eram considerados casos suspeitos.

Já os pacientes com casos clínicos considerados mais graves e que necessitam de uma vaga em UTI hospitalar eram seis. Destes, três estavam intubados. Outras sete pessoas aguardam vagas para atendimento nas enfermarias dos hospitais. Cinco médicos estavam no plantão.

Entretanto, na UPA do Primavera, um paciente estava intubado à espera de vaga em UTI. Outras oito pessoas aguardavam vagas em leitos de enfermarias destinadas ao tratamento da covid-19. Todavia, nos três hospitais da cidade não existem vagas abertas. Assim, um médico fazia o atendimento.

URGÊNCIA E EMERGÊNCIA

Conforme os dados do ‘Fala Saúde’, na UPA Trianon, destinada somente a casos de urgência e emergência, até o começo da noite dessa segunda, 39 pacientes aguardavam consulta. Porém, mais três esperavam o acolhimento. Apenas um médico estava atendendo.

Vale lembrar que essa unidade destina-se somente a atendimentos de acidentados, ataques cardíacos, infartos, entre outras urgência e emergências. Para outras doenças é preciso buscar a atenção básica nas UBS.

ESTRUTURA

Há estoque de cobertores (Foto: Secom/Prefeitura de Guarapuava)

Apesar de serem destinadas apenas ao atendimento emergencial de casos graves, devido à pandemia, as UPAs do Batel e do Primavera foram reestruturadas para acolher pacientes com covid-19, enquanto aguardam vagas em UTIs e leitos de enfermaria hospitalares.

Com a demanda crescente nas últimas semanas, os hospitais com alas exclusivas para tratamento da doença não conseguem atender a todos os casos graves. Esse acolhimento temporário se fez necessário até que surjam vagas no sistema público de saúde.

Além disso, contam com equipamentos utilizados em UTIs para monitoramento, ventilação mecânica e medicação, há oxigênio para uso de pessoas com síndromes respiratórias graves. Também são oferecidas cinco refeições diárias aos pacientes, incluindo almoço e jantar.

Por fim, a quantidade de roupas de cama e cobertores recebeu um reforço no estoque para suprir a alta demanda, principalmente nesta época, a mais fria do ano.

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Cristina Esteche

Jornalista

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