Da Redação
Foz do Iguaçu – O Ministério Público Federal no Paraná (MPF/PR) propôs Ação Civil Pública (ACP) com pedido de concessão de tutela de urgência em caráter liminar para que o município de Foz do Iguaçu seja obrigado a implantar Unidades de Acolhimento Adulto e Infanto-juvenil, na forma pactuada pelo município com o Ministério da Saúde, para prestação dos serviços de saúde previstos no programa "Crack, é possível vencer", com a destinação de local, profissionais, insumos e equipamentos necessários a seu funcionamento.
No ano de 2013, o município aderiu ao programa federal objetivando executar ações intersetoriais de enfrentamento ao crack e outras drogas, compreendendo políticas públicas de prevenção, além de cuidado às pessoas com necessidades de saúde decorrentes do uso de entorpecentes. Entretanto, passados quase cinco anos do compromisso assumido pelo município com o Ministério da Saúde, o serviço jamais foi implementado, consolidando-se no tempo a ausência de um serviço público essencial e urgente.
Diante deste quadro, faz-se necessário o pedido de concessão de tutela de urgência diante da omissão do município, provocando ausência de serviço para a população afetada pela dependência química ou exposta a seus riscos, efeitos e doenças dela decorrentes.
"É público e notório que Foz do Iguaçu sempre esteve no topo da lista de cidades recordistas em apreensão de drogas no cenário nacional, por estar no epicentro de uma rota do tráfico internacional. Considerando essa realidade, é inaceitável que o município não conte com uma rede estruturada de modo a prestar atendimento efetivo e condigno às pessoas com necessidades decorrentes do uso e da dependência de drogas, o que torna necessária a tutela do Poder Judiciário para sanar essa omissão", destaca a procuradora da República, Daniela Caselani Sitta, em trecho da ação civil pública.
No bojo do inquérito instaurado para apurar a situação, foi informado pela Secretaria Municipal de Saúde que, para os casos de internação, o atendimento é feito pelo Hospital Municipal Padre Germano Lauck. Dessa forma, constata-se que, para os casos que necessitam de internação, o gestor municipal está bastante atrasado com relação à Reforma Psiquiátrica, que superou o modelo de hospital psiquiátrico, embora tenha pactuado com o Ministério da Saúde a instalação de Unidades de Acolhimento no ano de 2013.
A omissão do município fica mais evidente quando se sabe que a União disponibiliza altos incentivos financeiros para implantação de cada Unidade de Acolhimento, bem como para a manutenção de cada Unidade de Acolhimento Adultos e Infanto-juvenil. Desta forma, a prefeitura já sabia que haveria contrapartidas e que deveria ter elaborado os competentes estudos e plano de gerenciamento (plano de ação local) antes de aderir efetivamente ao programa.
Existe, por exemplo, a previsão de um incentivo financeiro da União de R$ 500 mil para apoiar a implantação das Unidades de Acolhimento Adulto e Infanto-juvenil, mais doze parcelas do custeio de manutenção, sendo R$ 25 mil mensais para a manutenção da Unidade de Acolhimento Adulto e R$ 30 mil mensais para a manutenção da Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil.
A previsão, no momento em que ocorreu a adesão do programa federal, era de que uma Unidade de Acolhimento Infanto-juvenil seria instalada na região central da cidade, com previsão de início de funcionamento ainda em outubro de 2013; e uma Unidade de Acolhimento Adulto, a ser instalada no bairro São Francisco, com previsão de início de funcionamento em abril de 2014.
GRAVIDADE
Durante a apuração do caso, constatou-se, conforme mapeamento da situação local realizado pelo próprio município que, apesar da existência (formal) de estruturas abrangidas pela Rede de Ação Psicossocial, não existe, em Foz do Iguaçu, uma rede para prevenção e tratamento de adultos, crianças e adolescentes com necessidades decorrentes de uso de crack, álcool e outras drogas, uma vez que não há leitos para desintoxicação nem comunidade terapêutica habilitada.
Dados que constam neste mesmo mapeamento apontam a gravidade da situação local na problemática das drogas e o tamanho da omissão do poder público municipal na prestação dos serviços compreendidos na Rede de Atenção Psicossocial. A Secretaria Nacional de Direitos Humanos (SNDH) em pesquisa sobre homicídios na adolescência atribuiu a Foz os índices de 9,7 em 2006 e 11,8 em 2007, grande parte ligados ao envolvimento com drogadição. Também é frequentemente noticiado que a estrutura criminosa que atua na região próxima a ponte Brasil-Paraguai recruta jovens em situação vulnerável, residentes nos bolsões de pobreza para trabalhar na tríade muamba/tráfico de drogas/armas.
"O objetivo da antecipação de tutela é fazer o município sair da inércia, pois, apesar de estar sendo provocado extrajudicialmente pelo MPF desde o ano de 2014, o município não adotou nenhuma medida administrativa para a implantação das Unidades de Acolhimento pactuadas com a União, cuja necessidade é urgente diante da gravidade da realidade local da drogadição", reforça a procuradora da República.
A ACP destaca ainda que, em pleno "vigor" de sua omissão na instalação das Unidades de Acolhimento a que se obrigou perante o Ministério da Saúde ainda em 2013, o município fez “anúncios” na mídia local da adesão a outros programas voltados ao mesmo público que está sendo negligenciado, e da instalação de duas novas unidades de saúdes (na pendência da instalação de outras duas “prometidas” anteriormente), conforme reportagens encartadas nos autos do inquérito civil, o que permite concluir que o governo municipal se comprometeu com a União apenas para fazer demagogia.